Precisamos falar sobre JOHN WICK

Aproveitei o lançamento do quarto filme da franquia JOHN WICK, estrelada pelo Keanu Reeves, para rever a trilogia inicial. E como nunca escrevi nada sobre esses filmes por aqui, trago uns comentários que fiz durante os últimos dias no Letterboxd e Instagram, onde tenho sido mais atuante, por isso recomendo que sigam, se tiverem interesse, porque esse recinto aqui anda bem abandonado, e a correria dos tempos atuais quase me obriga a fazer comentários mais curtos nas outras redes, do que posts maiores por aqui.

DE VOLTA AO JOGO (John Wick, 2014), de Chad Stahelski e David Leitch

Acho massa lembrar que na época do lançamento muito pouco sobre JOHN WICK sugeria que a gente estaria prestes a assistir a um dos melhores filmes de ação daquele período. Mesmo com suas imperfeições, foi exatamente o que assistimos e o impacto foi grande, notável pela presença de Keanu Reeves numa performance física impressionante, em sequências espetaculares de tiroteios, lutas coreografadas com capricho, filmadas e editadas com maestria e com uma construção de universo envolvendo um peculiar submundo de assassinos, cheio de regras, que tornava tudo ainda mais fascinante.

E é de certa forma admirável constatar que o filme continua um dos grandes exemplares do gênero (em se tratando de Hollywood), passados praticamente dez anos, mesmo que as suas próprias continuações tenham lhe superado. O que só engrandece essa franquia que eu tanto adoro.

Vou me estender um pouco mais nesse primeiro filme, só pra introduzir algumas premissas caso alguém tenha essa falha de não ter visto o filme ainda e porque acredito que preciso declarar meu amor a esse personagem incrível, que atende pelo nome/título de John Wick (Reeves), capaz de matar cem homens sob o pretexto de que tiraram a vida de seu adorável cachorrinho. Um beagle irresistível. Aquele que sua esposa havia deixado pra ele após sua morte como um presente póstumo. A única coisa que restava dela. A única coisa que o manteve em uma vida normal, longe de um passado carregado de morte e violência. Uma existência de paz que ele escolheu depois de muitos anos trabalhando como assassino contratado para organizações mafiosas. John Wick foi apelidado de “Baba Yaga“, algo que traduziram como o bicho-papão – embora possam dizer também que ele é a pessoa que chamariam para matar o bicho-papão. Temido por todos, ele era o assassino mais eficaz. Quando um chefão russo (Michael Nyqvist) descobre que seu filho roubou o Mustang e matou o cachorro de John, ele sabe o que está por vir. Ele sabe que seu filho despertou uma fera capaz de tudo.

É isso, simples, direto, não perde muito tempo com bobagens. E quando menos se espera, estamos diante de sequências de ação de cair o queixo. Até porque é sobre isso o filme. A trama é só um pretexto para uma sucessão de cenas de tiro, porrada e bomba. A ação – e a estética da ação – é que fala mais alto. Uma essência que vai ganhando uma proporção cada vez maior a cada continuação…

Melhor sequência de ação: A da casa noturna, Red Circle, ainda impera. É um bom exemplo da maestria dos diretores, David Leitch e Chad Stahelski, um balé de corpos, balas, golpes e violência combinado à batida da trilha sonora, à uma noção de espaço precisa, num cenário belissimamente iluminado, com trabalho de câmera refinado ao mesmo tempo nervoso, brutal, uma sequência que já nasceu clássica e dá o tom do nível da ação que estamos diante (e era difícil na época imaginar que os realizadores conseguiriam fazer coisas ainda melhores em possíveis continuações). E é onde podemos ver Keanu Reeves encarando o grande Daniel Bernhardt, um ator de ação B dos anos 90 que sempre que aparece nessas produções atuais eu abro um sorriso. Também ajuda muito, nesta sequência da casa noturna, que esta seja a primeira demonstração real do por que John Wick é um assassino tão lendário e temido, aumentando seu impacto. A sequência anterior, o ataque à casa de John, é bem boa, mas dá só um gostinho das habilidades do homem. Aqui não. Aqui John Wick convence que realmente poderia matar cem homens sozinho se precisasse.

Um adendo sobre os diretores: acho legal notar os rumos que tomaram depois deste primeiro filme. Stahelski ainda se manteve fiel ao universo JOHN WICK. Dirigiu sozinho os três capítulos seguintes e provavelmente vai continuar nos próximos (se tiver). Há alguns anos anunciaram uma refilmagem do clássico oitentista HIGHLANDER comandada por ele. Vamos ver se sai… Já Leitch seguiu um caminho diferente como diretor (ele ainda tá na produção de todos os JOHN WICK), se meteu em outras franquias, como VELOZES E FURIOSOS: HOBBS AND SHAW (19) e DEADPOOL 2 (18), e tentou desenvolver seu próprio universo em filmes com um certo autorismo, como ATOMIC BLONDE (17) e BULLET TRAIN (22), sem os mesmos resultados deste seu primeiro trabalho aqui, embora eu tenha simpatia em algum nível por todos esse filmes dele.

JOHN WICK: UM NOVO DIA PARA MATAR (John Wick: Chapter 2, 2017), de Chad Stahelski

A rapaziada realmente levou à sério a lógica das continuações: maior, melhor e MAIS, tudo MAIS, MAIS… Sobretudo quando se trata de ação e da expansão desse universo, nota-se algo bem mais complexo do que um simples submundo de assassinos, envolvendo grandes corporações criminosas, o que inclui mais regras, mais acessos exclusivos a quem está abaixo dessa sociedade. Literalmente um mundo que se expande ainda mais.

E acredito que diz muito sobre o seu nível de consciência cinematográfica quando você começa o seu filme de ação projetando imagens de Buster Keaton na tela fazendo algum de seus stunts malucos no mesmo plano em que tá rolando uma puta perseguição de carro/moto… Não é a toa que o que se segue a partir daí não é apenas um dos melhores filmes de ação dos últimos anos, mas também um filme que pensa a ação, a estética da ação, de uma forma muito peculiar. Não é a toa que o diretor disso aqui seja Chad Stahelski. Enfim, este segundo filme já é uma obra-prima do gênero.

Melhor sequência de ação: Tem pelo menos umas quatro sequências aqui dignas de antologia, mas se eu tivesse que escolher apenas uma, acho que a última, no museu e sobretudo na sala dos espelhos, seria a escolhida, acho uma das experiências mais imersivas e cinéticas que tive numa sala de cinema (e que continua bem forte na TV, na revisão), além de ser outra prova da consciência de cinema do Stahelski… Clímax com espelhos já se tornou clássico, desde Orson Welles à Bruce Lee. E aqui é tão mágico quanto.

JOHN WICK: PARABELLUM (2019), de Chad Stahelski

É um filme que além de conseguir ser mais épico em sequências de ação, consegue também tirar umas abordagens mais filosóficas e psicológicas desse universo todo e da essência do seu protagonista, embora a narrativa se mantenha cristalina na sua simplicidade. Frequentemente fala-se sobre “consequência” neste terceiro filme, sobre a epifania que surge em John Wick de que sua aptidão em matar, seus instintos assassinos, tem um impacto crucial em sua alma, sem falar nas almas de muitos outros envolvidos, embora possamos admitir que para algumas pessoas seus destinos são irrevogáveis, obviamente. Se John Wick é o Baba Yaga, então seu destino está definido. Agora, se é um homem, então ele sempre tem uma escolha. Pra nossa sorte, suas escolhas até agora têm levado a um derramamento de sangue impressionante, um imersivo festival de sequências de ação realizadas pelos caras que mais entendem e respeitam o gênero na atualidade em Hollywood. E por aqui temos John Wick cavalgando enquanto luta contra motoqueiros em alta velocidade, combates de facas violentíssimos, tiroteios deflagradores, ataques de cães, Mark Dacascos e seus capangas dando um puta trabalho pro nosso herói… E Raramente uma carnificina é filmada com tanta elegância, com um visual tão cuidadosamente elaborado, cheio de luzes bonitas. É o perfeito o encontro da high-art com a vulgaridade da ação. Uma combinação que pra mim resulta no que existe de mais sublime no cinema, e que me faz amar tanto o gênero.

E convenhamos que não é tarefa muito fácil fazer continuações que se igualam ao nível de um filme antecessor, mas Keanu Reeves, Chad Stahelski e toda a turma responsável por isso aqui conseguiram duas vezes com sucesso.

Melhor sequência de ação: Eu fico na dúvida entre a sequência da Halle Berry com os cachorros, que é um primor de coreografia, além de ser muito divertida, mas definitivamente o tiroteio final com aquele exército invadindo o Hotel Continental praticamente de armadura é a que gosto mais, um troço tenso e enervante. E tem a participação do falecido Lance Reddick, usando uma shotgun que faz um belo estrago.

JOHN WICK 4: BABA YAGA (John Wick: Chapter 4, 2023), de Chad Stahelski

E aí depois de tudo isso, fui assistir ao novo no cinema. Só tenho a dizer o seguinte: se a coisa terminar por aqui e este for o último filme da série, já teremos uma das franquias de ação mais extraordinárias deste século… Em termos de ação, de GRAMÁTICA DA AÇÃO, pouca coisa se compara com esses quatro singelos exemplares impecáveis de tiro na cara, perseguições alucinantes e lutas, lutas de todo tipo, com punhos livres, facas e outros objetos cortantes, até um lápis… E BABA YAGA veio pra coroar a grandeza de tudo que envolve John Wick como cinema, como personagem, como universo, como narrativa e estética de filme de ação. É uma belezura. Ou posso apenas estar empolgado momentaneamente, mas acho difícil…

Aqui, os dois primeiros atos são, em grande parte, mais do mesmo. O que não é de forma alguma algo negativo, pois o mais do mesmo em JOHN WICK é muito bom, com alguns momentos geniais: tudo que envolve a participação de Scott Adkins, por exemplo, que tá brilhante aqui. Monstro! Donnie Yen, Sanada, Mark Zaror, Bill Skarsgård, Clancy Brown, Ian McShane, Lance Reddick (RIP), Laurence Fishburne… Baita elenco e estão todos ótimos. Keanu Reeves nem preciso mencionar, o sujeito é uma força da natureza.

Mas aí vem aquele terceiro ato… E aqui entra “Melhor sequência de ação:” deste novo filme.  O arco do triunfo; a homenagem à THE WARRIORS; Paint It Black; o plano sequência com a câmera no alto, digna de um Brian De Palma, acompanhando John Wick por cômodos numa casa abandonada, tocando o terror com uma arma que cospe fogo, literalmente; a escadaria da Basílica de Sacré Cœur… O que temos aqui é simplesmente algumas das sequências de ação das mais absurdas colocadas num filme de estúdio hollywoodiano. Neste momento, não tenho dúvidas em apontar que Chad Stahelski é o principal nome do gênero na atualidade.

Só posso dizer que é um grande dia para ser fã de filmes de ação.

2 pensamentos sobre “Precisamos falar sobre JOHN WICK

  1. Os diálogos são muito malucos na série do assassino! E cada vez que assisto novamente, descubro algo novo. Sim, John Wick se tornou até agora uma das grandes franquias de ação do cinema atual.

  2. Parece que esse ultimo John Wick é bom, todas criticas que li ate agora ninguem fala mal do filme em si,tambem torço para ser o ultimo .. se continuar pode enjoar com o filmes imbecis da Marvel e DC que já cansaram ha muito tempo,eu só vou assisti-lo em DVD ou Blu-ray se ainda existir alguma distribuidora viva aqui no Brasil que ainda façam esse tipo de midia fisica , no cinema não vou assistir pois o ingresso esta muito caro,um abraço de Anselmo Luiz e excelente postagem .

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