PULP (1972)

Recentemente fiz este post explicando algumas questões que envolvem o antigo blog coletivo O DIA DA FÚRIA e os dois textos inéditos que acabaram surgindo na última tentativa de ressuscitar o projeto… Postei um texto do Marcelo Valletta sobre CARTER – O VINGADOR e disse que depois postava o segundo. Bom, o “depois” é hoje. Publico aqui o outro texto, que é de minha autoria mesmo…

bscap0343

Mike Hodges comparou PULP ao seu trabalho anterior, CARTER – O VINGADOR, como filmes similares: a mesma trama contada de maneira diferente. De alguma forma, é até justa essa comparação no sentido de ter mais uma vez um protagonista vivido por Michael Caine se metendo num intrincado entrecho envolvendo o assassinato e abuso de uma jovem e o receio com pessoas em posição de poder por trás do crime.

Mas é uma comparação que não se sustenta por muito tempo e basta uma conferida em ambas produções para notar o contraste de suas dramaturgias, dos cenários, dos personagens, com alternâncias na dosagem de ingredientes e no tom, principalmente no humor. Como todos os primeiros projetos de Hodges eram explicitamente relacionados a crimes densos e pesados – CARTER – O VINGADOR, por exemplo, era sombrio e niilista – não é difícil entender porque o diretor optou pelo contraste através do humor. Hodges, no entanto, permaneceu fiel ao seu amor pela ficção policial, e PULP se revela uma comédia de crime e sátira política que ironiza não apenas os antigos filmes noir e seu material original – o título já evidencia, a literatura pulp – como também a natureza de decadência dos escritores desse tipo de romance.

Não que o protagonista de PULP seja um derrotado na vida, mas é um sujeito que vive no fim do mundo e precisa “prostituir” seu talento nunca reconhecido, escondido sob pseudônimos variados, escrevendo livros policiais de gosto duvidoso, curtos e baratos. Mickey King (Caine) é esse cara, cuja obra inclui títulos como The Organ Grinder e My Gun is Long, só para terem a noção do nível do material… Se bem que eu gostaria de ler um romance pulp chamado My Gun is Long.

Logo no início de PULP, percebe-se o tom da coisa: o mais recente trabalho de Mickey está entregue numa editora, numa sala de digitação ocupada por filas de jovens moças que ouvem sua prosa semi-pornográfica através de fones de ouvido enquanto digitam a obra. As reações das mocinhas já são suficientes para arrancar algumas risadas do público. Entra em cena Michael Caine, enquanto os créditos surgem na tela. Cigarro no canto da boca, terno branco, óculos de aros grossos e a cabeleira loura. E é sob a ótica dessa figura, acompanhado por uma narração em off, digna dos mais esdrúxulos casos policiais, que vamos seguir a trama.

bscap0429

bscap0430

O próximo trabalho de Mickey é escrever, como ghost writer, as memórias de um ex-astro de Hollywood de filmes de gangster, Preston Gilbert (Mickey Rooney), que vive em Malta, sob o calor do sol do Mediterrâneo. Mas durante a longa jornada para chegar ao local onde vive o tal ator, várias situações estranhas, personagens excêntricos e um assassinato misterioso entram no caminho de Mickey. Quando chega ao seu destino, o sujeito já está metido até o pescoço numa trama espinhosa. Finalmente levado à presença de Gilbert, fica intrigado pelo falar excessivo do ex-ator. E nós, o público, ficamos de queixo caído com uma das atuações mais soberbas de Mickey Rooney.

Rooney já estava fora de moda no período e Hodges teve que insistir bastante para tê-lo no elenco, “a única pessoa que poderia desempenhar o personagem“, segundo o próprio diretor. Seu personagem é um grande falastrão, nada discreto, um gigante de baixa estatura que vive no limiar entre a realidade e a ficção que protagonizava nas telas em variados papéis criminosos. Liberado ao overacting, o resultado é uma atuação monstruosa, muita coisa vindo do próprio Rooney, em momentos de ensaio ou improviso na qual Hodges mantinha sempre a câmera ligada.

bscap0262

bscap0268

Quando Gilbert é assassinado durante uma festa, Mickey percebe que agora também se tornou um alvo por saber demais. A partir daí, a trama vai ganhando contornos mais sérios, Gilbert estava envolvido em um escândalo sexual que havia sido encoberto porque outras pessoas poderosas foram implicadas… Como em CARTER – O VINGADOR.

Ghost Writer do defunto, acredita-se que Gilbert tenha passado os detalhes do escândalo para Mickey, que começa a investigar por conta própria o mistério numa tentativa de se salvar. O protagonista encontra a verdade, mas no percurso, se depara com a podridão burguesa e se esquiva de outra tentativa de assassinato, que deixa o seu pretenso assassino morto (Mickey ainda brinca com o cadáver: “Lembre-se de que você é pulp, e para o pulp voltarás“), mas Mickey fica ferido na perna e acaba numa forçada reclusão na mansão de luxo de algum fulano da alta classe, que quer mantê-lo assim, quietinho, longe de tudo e de todos. E agora passa seu tempo escrevendo um romance pulp que ninguém vai ler… Os poderosos mais uma vez se saem melhor.

bscap0370

Na obra de Hodges, seu ponto de vista político inevitavelmente acaba se expondo de alguma forma e em PULP não é diferente. Há uma cena que um carro de som, cheio de fotos de um candidato fascista em campanha, entoa um discurso vindo das suas caixas sonoras – era a voz do próprio Mussolini… Como o filme não chegou a passar na Itália na época, ninguém entendeu a “piada”. Preocupado com a autenticidade daquilo que filmava, Hodges fez muita pesquisa sobre o estado do fascismo italiano do período, visitou o túmulo de Mussolini, comprou no mercado negro LPs com discursos do ditador italiano, e toda uma atmosfera opressora acaba transparecendo em PULP de forma incômoda, ainda que não influencie diretamente, pelo menos na maior parte do tempo, no mistério que o personagem de Caine se envolve. Mas é uma forma de Hodges deixar transparecer sua aversão ao fascismo, poder, exploração e corrupção.

A ideia era filmar PULP na Itália, porque o contexto político que tanto interessa ao diretor estava acontecendo lá. Em plenos anos 70, houve um aumento significativo de votos fascistas nas eleições italianas, algo totalmente incompreensível, um retorno à imbecilidade e que reflete uma estupidez coletiva que vem perdurando. Impossível não encontrar paralelo na realidade atual do Brasil… O filme acabou não sendo rodado na península, pois todos os locais que Hodges e a produção queriam usar tinha sempre que lidar com a máfia local, uma situação que o diretor não queria levar muito adiante. Gangsters, só na ficção.

bscap0258

Mas  Hodges sempre foi simpático com o fato de ter que filmar em Malta, sob o sol do Mediterrâneo, o que enfatiza ainda mais o contraste frio e sombrio dos locais que havia filmado no Reino Unido em seus filmes anteriores. O que contribui até para uma certa leveza. PULP talvez seja o filme mais leve de Hodges (mesmo tendo realizado comédias puras mais tarde). Dá para dar boas risadas, principalmente no primeiro terço de filme antes que o personagem de Caine entre de vez no mistério.

Com PULP, Hodges demonstra repertório sem deixar sua assinatura autoral em segundo plano, apesar de nunca ter alcançado uma merecida popularidade. Nem mesmo quando foi para Hollywood, onde filmou obras com mais recurso, como FLASH GORDON, por exemplo, acabou tendo resultados sem grandes expressões e os que se  lembram de seu nome ainda é pelo seu longa de estréia, CARTER – O VINGADOR. PULP é um de seus trabalhos que acabou entrando relativamente no esquecimento, nunca teve o impacto desejado, sua concepção política crítica não é tão evidente, o que remove uma certa relevância que poderia ter na época. Embora seja um filme engraçado, com bons momentos e mais uma vez Michael Caine oferecendo uma performance de alto nível.

No Brasil, recebeu o título de DIÁRIO DE UM GANGSTER.

bscap0378

O NÃO-RETORNO DO DIA DA FÚRIA

Os últimos textos publicados no projeto DIA DA FÚRIA (um site coletivo criado em 2009 que eu editava) foi em 2018, com o especial Walter Hill. Ficou incompleto e, enfim, pouca gente se importou de fato em manter as publicações. Um tempo depois, conversando com um ou dois membros, resolvemos fazer uma última tentativa e escolhemos o diretor Mike Hodges para ser o homenageado. Só iríamos publicar alguma coisa depois que todos os textos estivessem prontos. Daí não teria a chance de mais um projeto ficar incompleto no site… A coisa não foi pra frente mais uma vez e acabou sendo o último suspiro do DIA DA FÚRIA, que realmente não tem a mínima possibilidade de retorno.

No entanto, essa última tentativa gerou dois textos inéditos, um do Marcelo Valletta e outro meu. Como o DIA DA FÚRIA não vai ver mais a luz do dia, publico aqui no blog mesmo. Primeiro, o texto do Marcelo e em breve coloco o meu por aqui também.

CARTER, O VINGADOR (Get Carter, 1971)

por Marcelo Valletta

img192_7830_vlcsnap1234383

Após alguns anos trabalhando na TV, Mike Hodges estreou no cinema com CARTER, O VINGADOR, graças a um convite do produtor Michael Klinger. Dispostos a revitalizar o filme de criminosos ingleses, gênero que nas décadas anteriores teve exemplares excelentes, como THEY MADE ME A FUGITIVE (dirigido pelo influente brasileiro Alberto Cavalcanti) e BRIGHTON ROCK, Klinger, Hodges e o coprodutor e estrela Michael Caine aproveitaram o relaxamento da censura, uma das consequências dos Swinging Sixties, para entregar uma obra especialmente brutal.

Essa brutalidade vem de sua maior qualidade: o naturalismo, em especial pelas escolhas de não glamourizar o crime nem espetacularizar a violência. Para interpretar o protagonista do romance “Jack’s Return Home“, recém-lançado por Ted Lewis, Caine, filho de faxineiros que abandonou a escola aos 15 anos, diz ter se baseado em bandidos que conheceu na juventude. Além disso, Hodges e sua equipe pesquisaram a atividade criminal em Newcastle upon Tyne, onde a história se passa.

9-8

Isso resultou em um personagem principal obstinado, taciturno e amoral, sem características redentoras nem apelação para momentâneos alívios cômicos. Em busca dos assassinos de seu irmão, Jack Carter não demonstra nenhum tipo de remorso, mesmo quando seus eventuais aliados se machucam. Diante dos diretamente envolvidos com o crime, deixa escapar uma raiva contida, nos momentos mais intensos. É uma das interpretações mais marcantes de Caine.

O ritmo da obra, cujo enredo se passa em apenas um fim de semana, também causa bastante impacto. São poucas sequências, nas quais os muitos personagens são apresentados a conta-gotas. Os acertos de contas que formam o clímax começam a menos de meia hora do final, quando se inicia uma cadeia de assassinatos, sem grande sofisticação. Não à toa, o primeiro deles é o mais chocante: Carter esfaqueia duas vezes um informante, aos gritos de “Eu sei que você não matou meu irmão!“.

1-9

CARTER, O VINGADOR também acerta ao deixar de lado alguns clichês do cinema noir, como a voz over que desnuda os pensamentos do protagonista e o uso de flaskbacks (estes existem no livro e mostram as relações de Carter com o irmão e outros personagens).

Outro ponto de destaque é o modo como o filme retrata o sexo. Além de exibir nudez ou seminudez de algumas das atrizes principais, a primeira cena mostra uma curiosa reunião em uma residência luxuosa, na qual Carter, seus chefes e outros convidados assistem a uma sessão de slides pornográficos. Prostituição e aliciamento de menores de idade para atuar em filmes caseiros também são abordados, o que ajuda a explicar a inicial classificação X (apenas para adultos), depois rebaixada para R. Mas, apesar de duas das personagens que Carter encontra em Newcastle passarem pela sua cama (a segunda sequência desse tipo faz uso de montagem paralela, alternando entre o casal no carro e na cama), a cena mais erótica, cortada pela censura em vários países, é um telefonema sensual que o protagonista faz à sua amante (interpretada pela linda Britt Ekland, o principal nome feminino nos créditos, apesar de aparecer muito pouco), diante de sua inquilina.

OLKBlz

Entre outros destaques do elenco estão Geraldine Moffat, ótima como a interessante Glenda, que tem um destino irônico, e Dorothy White como a prostituta Margaret. Dos homens, chama especial atenção o celebrado dramaturgo John Osborne, autor de “Look Back in Anger“, que interpreta o chefe dos bandidos de Newcastle como um homem de fala suave, mas implacável nas suas decisões – no livro, o personagem é bem mais grosseiro.

A marcante sequência final, numa praia com céu encoberto onde carvão é naturalmente depositado, carrega bastante na ironia ao mostrar o destino dos principais antagonistas. Um projeto mais comercial concluiria de forma distinta.

CARTER, O VINGADOR foi recebido pela crítica com ambivalência: em geral a qualidade da produção, da direção e das atuações foi elogiada, mas o conteúdo revirou os estômagos mais sensíveis. O sucesso de público também foi moderado, numa época em que o campeão de audiência era o drama LOVE STORY. Ainda assim, foi suficiente para que as edições futuras do romance de Lewis fossem rebatizadas como o filme e que os dois livros seguintes, com histórias ocorridas em períodos anteriores, trouxessem o nome do protagonista nos títulos.

vlcsnap-2019-03-04-14h15m40s717

A MGM, que estava em crise, fechando suas subsidiárias na Europa, resolveu refazer o filme para as plateias ianques, em vez de divulgar o original britânico. Curiosamente, o remake de George Armitage se tornou um blaxpoitation, estrelado pelo jogador de futebol americano Bernie Casey e a futura musa Pam Grier (cuja personagem tem o curioso nome de Gozelda).

No fim das contas, o original de Hodges não alcançou a qualidade de POINT BLANK, com o qual costuma ser comparado, mas ainda assim é o que meu tio que me levava para alugar VHS na infância chamava de “filmão“. Esta porrada cinematográfica ficou esquecida por quase três décadas, até ganhar status de clássico ao ser citada como influência por diretores como Quentin Tarantino e Guy Ritchie – o que acabou desaguando no segundo remake, estrelado por Sylvester Stallone. Mas isso é uma outra história.

RAPTADO (Kidnapped, 1971)

bscap0373

O célebre romance de Robert Louis Stevenson, Kidnapped – inicialmente publicado como uma série de histórias em jornais antes de ser lançado num único volume em 1886 – foi adaptado várias vezes para cinema e televisão, as principais sendo em 1948, estrelado por Dan O’Herlihy e Roddy McDowell, e em 1959 com Peter Finch e James McArthur. Nunca assisti a estas versões e por melhores que possam ser, RAPTADO, do diretor Delbert Mann, de 1971, me parece a mais agradável entre as adaptações, já que tem a presença de um desses atores que basta uma pequena participação para me deixar com sorriso no rosto, e no caso deste aqui o ator é Michael Caine encabeçando o elenco…

Durante a eterna guerra entre escoceses e ingleses no século XVIII, no qual as forças escocesas estão sendo aniquiladas por tropas do governo inglês, um rapaz que perdeu o pai, David Balfour (Lawrence Douglas), chega à casa de seu tio Ebenezer (Donald Pleasence) para reivindicar sua herança. No entanto, com a intenção de ter os bens para si mesmo, o velho resolve raptar David e vendê-lo como escravo.

bscap0335

Prisioneiro em alto mar, o rapaz se vê numa situação complicada. Quando a embarcação se depara com o notório rebelde escocês Alan Breck (Caine), David aproveita a oportunidade para se aliar a Breck e fugir. Eles chegam de volta à costa e buscam refúgio com os parentes do famigerado rebelde, o tio James Stewart (Jack Watson) e a prima, Catriona (Vivien Heilbron). Mas a aventura deles está apenas começando…

Embora entre todas as histórias de Robert Louis Stevenson A Ilha do Tesouro continue sendo sua principal aventura, Kidnapped parece ter sua graça. O roteiro de Jack Pulman para esta adaptação de 1971, no entanto, não se baseia apenas nessa história, mas também em trechos da sua sequência, lançado em 1893, Catriona. E, independente do fato do filme terminar de uma maneira brusca e um bocado pessimista, ainda é uma peça divertida e cuja recriação contextualiza bem o momento histórico que a aventura transcorre.

bscap0378

bscap0356

Delbert Mann, que recebeu o Oscar de melhor diretor com seu filmes de estreia, MARTY, talvez não fosse o sujeito mais preparado para narrar as peripécias da dupla protagonista, as cenas de ação não empolgam muito e nas mãos de um Richard Fleischer ou John Huston renderiam uma emoção a mais. No entanto, Mann dirige bem os atores, e com o elenco que temos aqui, a diversão é garantida.

Michael Caine está em excelente forma com seu carisma e inesgotável brio de “tough guy“. Há uma sequência em que Caine resolve executar sozinho dois soldados ingleses após se deparar com uma família inteira massacrada. É um dos momentos altos do filme, e se a encenação da luta não é lá grandes coisas, pelo menos o ator demonstra muita presença em cena, matando seus inimigos à sangue frio. Caine certamente ofusca o jovem Lawrence Douglas, cujo papel que faz, David, é um pouco insosso; Donald Pleasence é outro gigante que sempre merece destaque e está genial como o viscoso e dúbio Ebenezer. O elenco ainda conta com o grande Trevor Howard.

bscap0367

bscap0337

Um dos elementos que mais impressiona em RAPTADO é a bela fotografia de Paul Beeson, que aproveita muito bem as paisagens da Escócia (deixo umas imagens aí em baixo para apreciação). E também as partituras de Roy Budd – junto com a balada romântica de encerramento interpretada por Mary Hopkin. Simplesmente memorável e contribui imensamente para tornar o filme, que está longe de ser uma maravilha, numa adaptação respeitável da obra de Stevenson.

bscap0376bscap0365bscap0358bscap0382

ESPECIAL DON SIEGEL #26: O MOINHO NEGRO (The Black Windmill, 1974)

The-Black-Windmill-Michael-Caine-1974

Assisti outro dia a O MOINHO NEGRO pela primeira vez para adiantar este especial eterno aqui no blog. Trata-se de um thriller de espionagem que o Siegel fez lá pelos lados da Europa e meio que sumiu dos radares entre os filmaços que o homem fez nos anos 70, pós DIRTY HARRY e CHARLEY VARRICK. Andei lendo algumas críticas da época e outras que saíram já na era da internet e é curioso como a grande maioria desdenha da obra, que realmente não está a altura dos melhores filmes do sujeito, mas é legal, não deixa de ser interessante, tem vários momentos ótimos. E tem um Michael Caine encabeçando o elenco (que é fantástico e conta com a presença do grande Donald Pleasence), além do climão de policial europeu que de alguma forma dá um charme a mais ao filme e faz uma boa combinação com o estilo secão do Siegel.

John Tarrant (Caine), um agente MI6, serviço secreto britânico, descobre que seu filho, David, foi sequestrado por uma quadrilha chefiada por um sujeito carrancudo, McKee (John Vernon), e seu resgate deverá ser pago com uma certa quantia de diamantes que seu departamento secretamente obteve para uma operação qualquer, ou então o moleque vai sofrer as consequências… Para piorar a situação, os bandidos ainda forjam várias situações que incriminam Tarrant, fazendo parecer que ele faz parte do esquema, algo que seus superiores acabam acreditando, incluindo o desajeitado Cedric (Pleasence). E é nessa situação “Hitchcockiana” e com uma face dura como uma pedra, sem demonstrar qualquer sentimento – “Fomos treinados para isso” – que Tarrant resolve agir por conta própria para ter seu filho de volta.

b89n

Uma dessas ações é justamente roubar os diamantes de seus chefes, que recusaram a negociar com os sequestradores, e levar sozinho à Paris para rastrear os facínoras. Ao final, toda a investigação o leva ao moinho negro do título, onde descobre-se os motivos do sequestro e quem realmente está por trás de todo o esquema, com direito a uma troca de tiros de metralhadora filmada do jeitinho classudo e cru do Siegel, bem diferente da ação dos filmes na época do espião britânico mais famoso, James Bond. Aliás, Caine é um espião do tipo intuitivo que usa mais cérebro que músculos, o que pode ser uma das razões do fracasso de crítica e bilheteria… Apesar da cena típica de um 007, com o herói sendo apresentado a uma arma secreta, uma maleta que dispara tiros.

moinhonegro

O fato é que O MOINHO NEGRO é bem paradão na sua primeira metade, meio enrolado e demora mais que o necessário para engrenar, além de uns furos de roteiro muito mal explicados… Mas Siegel consegue manter as coisas no lugar com uma boa atmosfera britânica e química entre os personagens. Nas mãos de algum diretor mais convencional, por exemplo, a relação de Tarrant e sua esposa, que o culpa a princípio, pelo sequestro do filho, poderia soar piegas e dramático demais, algo que não acontece… Enfim, mesmo com alguns probleminhas, O MOINHO NEGRO não deixa de interessar e até mesmo empolgar os amantes de um bom thriller setentista e também aos fãs do bom e velho Don Siegel.

A MÃO (The Hand, 1981)

mnVfSQrNas palavras do próprio Oliver Stone, “Eles tentaram me derrubar como diretor, mas eu retornei como roteirista”. Seja lá quem são “eles”, Stone estava se referindo ao período após a sua traumática estreia na direção (e que eu tentei explicar aqui) quando havia desistido de fazer filmes e passou apenas a escrevê-los. Finalizou quatorze roteiros em poucos anos, entre eles O EXPRESSO DA MEIA NOITE (78), que lhe rendeu um Oscar de roteiro adaptado.

Com um prêmio da Academia na prateleira, Stone voltou a pensar na possibilidade de dirigir. Nesse período, os roteiros de PLATOON (86) e NASCIDO EM 4 DE JULHO (89) já estavam prontos, mas os seus financiadores não queriam produzir algo que competisse com o sucesso de APOCALYPSE NOW (79), de Francis F. Coppola, e O FRANCO ATIRADOR (78), de Michael Cimino. Sem poder dedicar-se aos seus projetos pessoais, Stone conseguiu 6,5 milhões para fazer algo menos ambicioso.

Ambição, no caso, é algo relativo. Um Spielberg ou George Lucas, naquele período, com “míseros” 6 milhões, com certeza deveriam conter a ambição. Já o pobre Oliver Stone, coitado, levando em conta que iria ainda dar início ao seu segundo filme, estava com grana pra cacete! Teria um mundo de possibilidades para trabalhar. E aí? O que o sujeito faz? Um outro filme de horror… Continuar lendo