FORÇA CRUEL (1982)

Por trás de um título nacional meio genérico como FORÇA CRUEL (Raw Force) esconde-se uma pequena preciosidade do cinema exploitation americano-filipino oitentista que precisa urgentemente ser redescoberto. Na verdade, tenho certeza que todos vocês já, no mínimo, ouviram falar ou leram sobre esse petardo. Se não, agora é a hora. E não se preocupem, podem acusar o filme de qualquer coisa, mas genérico é algo que ele não é.

Na trama, um grupo de praticantes de artes marciais embarca numa aventura num pequeno cruzeiro pelo Pacífico, pros lados das Filipinas, que promete ser, digamos, muito agradável. A começar pelo capitão da embarcação ser interpretado por ninguém menos que Cameron Mitchell.

Exibições de artes marciais, uma paradinha na cidade pra compras, bar de striptease, bordéis e uma festinha em alto mar cheia de moças de topless são alguns atrativos. O básico de um bom cinema de exploração. Mas um dos principais destaques desse passeio é visitar uma tal Ilha do Guerreiro, que dizem ser local sagrado, onde grandes mestres das artes marciais estão enterrados. Só alegria.

Outra atividade local é ser um ponto de operação de tráfico de mulheres em troca de pedras de jade entre um sujeito com bigodinho de Hitler – e seus capangas motoqueiros nazistas – com uma ordem de monges canibais que acredita ter o poder de ressuscitar os mortos ao comerem carne das jovens.

Eventualmente, toda essa rapaziada acaba na Ilha do Guerreiro, onde acontece uma batalha envolvendo os turistas das artes marciais, os traficantes nazistas de mulheres, os monges canibais e até os zumbis guerreiros que estavam enterrados ali e que ganharam vida novamente…

Sim, FORÇA CRUEL é tão bom que parece uma produção do Roger Corman ou dirigido pelo mestre do cinema grindhouse filipino Cirio H. Santiago.

Mas essa impressão tem força sobretudo pela presença de atores como Vic Diaz, que tá em quase tudo que o Cirio H. Santiago fez, e Jillian Kesner, que estrelou o clássico FIRECRACKER, que comentei por aqui há um tempinho. No entanto, FORÇA CRUEL não tem nada de Cirio nem do Corman (exceto por algumas imagens de arquivos das paisagens filipinas que a New World Pictures, do Corman, forneceu para esta produção), mas pra quem espera encontrar uma série de elementos típicos do cinema de exploração filipino que esses caras faziam nesse período, numa trama que só serve a este pretexto, o diretor estreante Edward Murphy nos entrega tudo particularmente bem.

Um monte de coisa bizarra tá incluída no cardápio como podem ter notado na sinopse. É até difícil listar a quantidade de absurdos; e mesmo sendo um filme que não necessariamente brilha por sua coerência narrativa, sabe trabalhar os elementos que agradam o seu público específico. E o essencial: com um ritmo que nunca diminui. Uma verdadeira metralhadora dos ingredientes do cinema grindhouse, com a total negligência assumida por um realizador que sabe muito bem que o seu filme não é uma obra-prima.

Mas é quase lá, dependendo do seu bom gosto pra cinema.

Tudo é realmente pensado para deixar as coisas boas que o cinema de exploração tem a nos oferecer. E, o melhor, com humor, sem se levar muito à sério – basta a longa sequência da festinha no barco, que tem o tom das melhores comédias oitentistas, cheia de personagens e situações cômicas pra gerar boas risadas – mas sem nunca tentar parecer um filme bobo. É tudo bem consciente, bem escrito… Er… “Bem escrito” é uma expressão forte, mas tudo funciona tão bem…

Até teria sido fácil tentar fazer uma espécie de autoparódia de, sei lá, filmes de artes marciais em ilhas exóticas. Mas paródias são geralmente muito menos divertidas da coisa real, consciente, que é o que temos em FORÇA CRUEL. Existe uma linha tênue entre maluquice e estupidez, e Edward Murphy é um maluco de primeira linha. O filme inteiro é uma coleção de momentos genuínos de humor, com diálogos que são autênticas pérolas, várias situações com um toque de comédia involuntária, tudo misturado a instantes absurdos de violência e gente pelada. E é o que torna isso aqui simplesmente mágico.

No quesito ação, temos MUITAS sequências de pancadaria, que são decentes até certo ponto. As pessoas lutam em todo lugar – clubes de striptease, cemitérios, barcos – você escolhe. A parte do ataque à embarcação, logo depois da festinha, é bem divertida, tem até alguma coreografia e certa criatividade, é uma das melhores do filme, com destaque para a sequência que uma moça completamente nua está amarrada numa cama, num quarto apertado, enquanto rola uma pancadaria à sua volta.

A ação que acontece no cemitério, já na tal ilha, é outro petardo dentro do filme, cheia de momentos notáveis. E, claro, a ação final, quando os zumbis samurais, ninjas e guerreiros de todas as espécies pintados de cinza aparecem pra dar trabalho para os nossos heróis fecha o filme lá em cima, com chave de ouro. É tudo muito doido, mas que faz valer a experiência de assistir algo único como FORÇA CRUEL.

Temos um elenco divertido para apreciar. Um monte de gente que não conheço, mas que parecem estar se divertindo; temos a já citada Jillian Kesner, que é boa de porrada… Mas nada se compara com o grande Cameron Mitchell marcando presença bem mais que o habitual nesse período, mostrando todo seu entusiasmo, claramente embriagado em todas as cenas que aparece. O grande Vic Diaz também se destaca como monge malvado. E por ser um monge malvado ele ri muito. Por quê? Não faço a menor ideia, mas toda vez que ele faz isso é fantástico. E Ralph Lombardi tá bem engraçado como o Hitler fake, com seu terno branco, sotaque ruim e o olho trêmulo sequestrando mulheres filipinas nuas…

Sem grandes arcos dramáticos, redenções, estudos sociais, filosóficos, psicológicos, contextos políticos… FORÇA CRUEL é apenas uma bagunça majestosa em forma de filme. Quero dizer, é uma obra que apenas joga tudo o que é possível no liquidificador e o resultado é fascinante, um épico do mau gosto cinematográfico que funciona lindamente para paladares finos que apreciam cinema exploitation. Só faltou uns robôs, alienígenas e vampiros saltitantes.

Obviamente FORÇA CRUEL não é recomendável ao cinéfilo brioche que só assiste Truffaut e Bergman… Mas os apreciadores de uma tralha vão aproveitar este festival de nudez, violência e várias bobagens que ele proporciona. O único problema grave é que o filme termina com um letreiro dizendo que teria uma continuação. nunca aconteceu, o que é uma pena…

AS AVENTURAS DE GWENDOLINE NO PARAÍSO (1984)

Just Jaeckin é um diretor francês que pode não ter o nome reconhecido imediatamente pela grande maioria, mas é preciso considerá-lo, em alguns nichos, com uma certa importância por conta de alguns trabalhos que realizou na década de 70. E tenho certeza que vocês vão concordar comigo mesmo nunca tendo ouvido falar o nome dele antes. Pois bem, o sujeito é ninguém menos que o diretor do clássico do Cine Privé EMMANUELE (1974), com a Sylvia Kristel. Precisa dizer mais alguma coisa?

Enfim, essa semana assisti ao seu último filme, AS AVENTURAS DE GWENDOLINE NO PARAÍSO (The Perils of Gwendoline in the Land of the Yik Yak ou The Perils of Gwendoline ou apenas Gwendoline,1984), uma aventura que eu já desconfiava que seria excêntrica e sexy por tudo que já li, pelas imagens que vi, pelo diretor e até pela fonte de inspiração da obra… E, olha, todas as expectativas foram atendidas.

A tal inspiração de GWENDOLINE é nas histórias em quadrinhos de John Willie, um artista e fotógrafo pioneiro do erotismo fetichista, editor de uma revista chamada Bizarre, também sobre o tema… Isso lá pela década de 40 e 50. Foi nessa publicação que ele apresentou essa personagem Sweet Gwendoline, a protagonista desse filme aqui. Uma personagem ingênua e virginal, do tipo ‘donzela em perigo’ cujas roupas estão sempre rasgadas, sempre sendo salva por um machão, mas que passa por uma jornada de descobertas de todo o tipo, até encontrar sua força interior para resolver as coisas.

GWENDOLINE é, de certa maneira, mais uma variação das aventuras ao estilo INDIANA JONES E OS CAÇADORES DA ARCA PERDIDA, como tantos outros que surgiram no período – coisas do mesmo tipo de TUDO POR UMA ESMERALDA (1984) e ALLAN QUARTERMAIN E AS MINAS DO REI SALOMÃO (1985). Bom, pelo menos é assim que começa o filme… Somos apresentados a Gwendoline, que ganhou vida na beldade Tawny Kitaen, e sua fiel amiga Beth (atriz e diretora Zabou Breitman). Elas chegam num porto em algum lugar do mar da China, dentro de uma caixa de madeira, sem passaportes ou dinheiro, e não demora muito Gwendoline é sequestrada por gângsters.

Eles querem algo dela, provavelmente vendê-la como escrava branca, mas não falam inglês, então ela não tem ideia do que eles querem. Mas ela fica lá amarrada, amordaçada, algo que vai acontecer algumas vezes durante o filme pra nos lembrarmos das origens fetichistas de John Willie. Então, Willard (Brent Huff, um sujeito que é a cara do Charlton Heston) quebra a janela, mata todos os bandidos – com direito à uma luta com um clone de Bruce Lee – e salva a nossa protagonista. Mas foi apenas sorte dela. Na verdade, Willard tinha algum dinheiro pra cobrar dos gangsters. Resgatar mulheres não é bem a sua linha.

Willard, à princípio, aparenta o típico herói americano de queixo quadrado que você encontraria em histórias em quadrinhos e seriados clássicos de matinê. A diferença é que ele é um filho da puta completo, mercenário e egoísta sem nenhum tipo de pureza heroica. É apenas um aventureiro implacável que não pensa em ninguém além de si mesmo.

No entanto, ele acabou se deparando com essas duas jovens indefesas. Willard não quer nada com elas, já está comprometido com o submundo local. Gwendoline quer procurar o pai caçador de borboletas que está desaparecido, e com muito esforço encontra um jeito de subornar Willard para ajudá-las a se aventurar em Yik Yak, uma terra praticamente desconhecida, que poucos se aventuraram, mas é onde o pai de Gwendoline desapareceu.

Já no início dessa jornada, eles descobrem, através de um colega do velho, que ele havia sido sacrificado por uma tribo selvagem para apaziguar antigos espíritos. Willard parece pronto para desistir, mas Gwendoline quer continuar a jornada e pegar a borboleta mais rara que existe em homenagem ao seu pai.

O que acontece a partir daí, na verdade, além de uma aventura tradicional cheia de perigos, com piratas, tribos canibais, animais famintos, etc, é que também se torna uma jornada de descobertas interiores da jovem Gwendoline mais do que qualquer outra coisa. O contato dela com Willard desperta sentimentos inexplorados e o filme sublinha suas transformações, sobretudo nas questões sexuais, no relacionamento com Willard, mesmo com a dose constante de um humor bem abobalhado que o material propõe.

Uma cena em especial é a que Willard, conduzindo as duas moças pela selva, convence-as a tirarem as camisas e usar o pano para pegar água durante uma tempestade. É uma sequência tola, completamente desnecessária e gratuita, mas é engraçada e destaca o tipo de homem que Willard é e quão frágil é nossa heroína, cegamente atraída pelo sujeito, mas que, em última análise, faz parte do processo de transformação que ela passa no decorrer da aventura até se tornar praticamente uma “guerreira amazona”. E cito as guerreiras amazonas por um motivo especial que já falo a seguir.

Uma coisa que ajuda muito no andamento do filme até aqui são as locações. Jaeckin não é bem um diretor com muita energia na câmera e, obviamente, não consegue obter o melhor de seus atores, que atuam quase de modo cartunesco – o que também contribui para o tom de história em quadrinhos que GWENDOLINE possui. Agora, os cenários são ótimos. Exóticos, com paisagens lindamente filmadas, permitem que as três figuras se movam sem nunca deixar o filme chato. Isso tanto nas locações naturais quanto em estúdio. O plano inicial do filme demonstra bem isso e de cara percebe-se também que é uma produção com um orçamento acima da média.

Orçamento que se confirma logo depois, quando o trio escapa da mesma tribo que selou o destino do pai de Gwendoline e desce para uma enorme fissura num deserto. Aqui o filme transcende para outra coisa. E já não é nem mais um rip

Os três personagens principais são tragados para dentro de um novo universo, até então totalmente desconhecido tanto para eles quanto para quem estava assistindo. O filme não dá qualquer pista para a chegada desse mundo paralelo, um império subterrâneo de guerreiras amazonas (aqui estão elas) governado por uma rainha má (Bernadette LaFont).

A partir daqui GWENDOLINE é quase uma obra-prima. O filme vira um espetáculo sensorial de cenários futuristas repleto de dispositivos de tortura, povoado por mulheres seminuas, com adereços fetichistas, bem condizente com o material que o filme adapta. Uma loucura. A cena da corrida de bigas, por exemplo, puxadas por moças é um toque fascinante (e tenho certeza que é uma espécie de homenagem a BEN HUR e o fato do Willard ser a cara do Charlton Heston, como já disse antes). O grande lance desse local é que fica dentro de uma caverna acima de um antigo vulcão que, segundo a lenda, um dia entrará em erupção e um tesouro em diamantes embutido em seu núcleo se perderá.

E dessa vez é Gwendoline que precisa lutar para salvar o dia. Sua transformação está completa e também percebe-se que sua paixão por Willard já está bem resolvida. Agora é entrar numa arena com outras guerreiras e lutar até morte. Enfim, o tipo de coisa que eu recomendo uma conferida, não adianta eu ficar descrevendo. E por mais louco que pareça esse híbrido de aventura excêntrica com cinema erótico, GWENDOLINE acaba rendendo algo muito divertido pelo seu caráter singular. Não existe nada parecido com isso aqui.

No elenco, destaque para a nossa Gwendoline, Tawny Kitaen (mais conhecida por ser a musa dos clipes do Whitesnake, ela foi casada com o David Coverdale), que está definitivamente em seu auge físico. E a câmera a ama tanto quanto ela ama a câmera. Tá certo que o roteiro não seja muito desafiador, mas ela lida bem com as coisas, tem presença na tela. Infelizmente faleceu no ano passado. Brent Huff é um herói galã o suficiente para que você possa entender por que Gwendoline se apaixona por ele e é interessante ver as reviravoltas que o relacionamento deles leva à medida que o filme se desenrola e a jornada de descobertas da jovem Gwendoline vai evoluindo. Zabou Breitman tá mais como alívio cômico, num filme que já tem um humor carregado por natureza, mas ela se sai bem, é encantadora.

Só posso dizer que realmente valeu a pena parar e finalmente conferir GWENDOLINE. É pura diversão do início ao fim. Na verdade, mais ao fim, quando a coisa realmente se torna uma experiência especial, surtada e única. O filme nunca é tão explícito quanto os trabalhos anteriores de Jaeckin, mas se mantém fiel à natureza sádica e fetichista do seu cinema e da obra de John Willie. E não deixa de funcionar nesse lado mais picante, em provocar com um grau de erotismo.

Mas o que é ainda mais prazeroso em GWENDOLINE é o fato do filme ser descaradamente bobo. Talvez nem fosse bem isso que Jaeckin havia pretendido com a ideia de ser um INDIANA JONES erótico. Ele poderia ter feito algo mais sério, mais artístico, mas acabou saindo essa bobagem, que é algo bem mais duradouro, uma comédia de aventura camp, praticamente uma história em quadrinhos filmada, que é muito mais agradável do que qualquer outra coisa.

EXPOSED (1971)

EXPOSED (Exponerad no idioma de origem) foi um dos filmes que lançou a atriz sueca Christina Lindberg como uma grande estrela do cinema de exploração, especialmente filmes eróticos, embora seu papel mais famoso viria a ser a moça caolha e vingativa no clássico THRILLER – A CRUEL PICTURE (1973).

Estamos aqui em 1971, quando a linha entre o cinema erótico e o filme de arte ainda era muito tênue, e EXPOSED tenta ser ambos. E consegue se sair bem tanto em um quanto em outro. O diretor é Gustav Wiklund, um ator finlandês que há algum tempo tentava sem sucesso sua primeira chance comandando atrás das câmeras. Até que chegou à conclusão de que a única maneira de conseguir era fazendo filme erótico, o tipo de filme que era altamente lucrativo na indústria sueca na época. A grande vantagem desses filmes era que, contanto que você incluísse a quantidade necessária de sexo e nudez, você poderia fazer praticamente o que quisesse. De experimentações visuais à subversões de gênero…

E o que Wiklund queria fazer era um thriller psicológico, com uma pegada mais artística, e é basicamente o que EXPOSED é. Na trama, Lena (Lindberg) é uma jovem que se envolve com um sujeito mais velho chamado Helge, que tira fotos dela nua, algo que ela nem tem objeções, mas que em algum momento ele ameaça chantageá-la com essas imagens. Lena também tem outro namoradinho, o jovem Jen, que não tá muito satisfeito com essa história.

Cansada dos dois homens, Lena resolve pegar a estrada e apanha carona com um casal bem desinibido. Ela os leva para a casa de campo de Jen, o que lhe causa mais problemas quando o rapaz aparece e os encontra todos bem à vontade, do jeito que vieram ao mundo. E a confusão continua, a partir daí, num triangulo de relações entre Lena, Jen e Helge…

O legal dessa história é que EXPOSED é um desses filmes que gosta de brincar com a narrativa e nem tudo o que estamos vendo pode estar realmente acontecendo no momento – e alguns dos eventos podem sequer ter acontecido. Assistimos ao filme pelos olhos de Lena, e ela é uma narradora não muito confiável. Então não podemos aceitar tudo o que vemos, às vezes são apenas memórias da moça ou produtos de sua imaginação… São coisas que permanecem enigmáticas.

Inclusive a própria índole desses personagens não fica lá bem definida. Especialmente Helge, que não é um mero vilão, e a natureza exata de seus sentimentos por Lena permanece incerta. Talvez ele a ame. Talvez ela o ame. Existem muitos tipos diferentes de amor, e nem todos são necessariamente saudáveis.

Os jogos sexuais que Lena faz com ele também são ambíguos – certamente ela é uma parceira disposta, mas isso não significa que esses jogos sejam bons. Não significa que são necessariamente ruins também. A sexualidade de Lena é algo que está em processo de exploração e ela pretende seguir esse caminho mesmo que a leve a alguns lugares sombrios. Quanto dessa exploração ocorre em sua própria mente e quanto ocorre na realidade são questões ficam em aberto.

O filme se beneficia muito pelas atuações. Christina Lindberg pode não ser a maior atriz do mundo, mas seu status de musa do exploitation europeu se justificou ao longo da carreira. É competente, e tem presença, o que às vezes é até mais importante no exploitation. É boa em projetar uma mistura de inocência e depravação, de vulnerabilidade e força. Outro ator que eu destacaria é o Heinz Hopf, que tá excelente como Helge, um pouco assustador, mas nunca exagerado.

Combinar arte e erotismo pode ser um ato de equilíbrio difícil. Um diretor menos talentoso acaba pesando a mão para um lado ou pro outro, mas EXPOSED é interessante nesse ponto, acho que tem o suficiente para satisfazer os fãs de grindhouse e art house. O primeiro provavelmente vai ficar satisfeito com a quantidade de tempo que Lindberg passa nua, enquanto o último deverá se deslumbrar com a câmera de Wiklund, os enquadramentos, a estética naturalista, além de encontrar um quebra-cabeça psicológico e existencial curioso para mantê-los satisfeitos também.

No meu caso, o interesse é sempre em ambos. E fiquei satisfeito. Como admirador do trabalho de Lindberg, acho que vale a pena conhecer outras coisas dela que vão além de THRILLER. Obviamente vai-se cair no terreno do cinema erótico europeu, que não costuma agradar todos os públicos, mas de vez em quando dá pra encontrar algumas preciosidades, como é o caso do diretor Wiklund, que eu não conhecia, e de EXPOSED, que não é nenhuma obra-prima, mas pra quem se interessa pelo gênero não vai perder seu tempo.

THE ARENA (1974)

A New World Pictures, produtora de Roger Corman, financiou THE ARENA, uma variação do tema WIP (Women in Prison), filmes de exploração com mulheres passando sufoco em prisões, só que aqui ambientado durante os dias do antigo Império Romano. Mark Damon, que foi ator de alguns filmes de Corman nos anos 60, havia se aposentado das atuações e se tornou um produtor de cinema na Europa e pegou THE ARENA pra começar. Filmado na Itália com um elenco majoritariamente europeu, apresentando muitos rostos familiares de uma série de filmes de Eurohorror, como Paul Muller e Rosalba Neri, o filme é marcado também pela presença da então crescente musa do exploitation Pam Grier o que o torna um híbrido incomum de peplum italiano dos anos 1960 e um grindhouse americano dos anos 1970.

Grier e Margaret Markov (que já haviam se unido anteriormente em BLACK MAMA, WHITE MAMA, de 1972) co-estrelam como Mamawe, da Núbia, e Bodicia, uma sacerdotisa da Bretanha. Ambas são sequestradas de suas terras natais por soldados romanos e rapidamente, junto com outras mulheres, encontram-se no leilão no mercado de escravos. Acabam compradas pelo organizador politico conectado aos jogos locais, Timarchus, tanto como escravas sexuais para o entretenimento dos amigos poderosos de Timarchus quanto como garçonetes das arenas durante os jogos. Apenas Bodicia e Mamawe mantêm uma aparência de dignidade sob o jugo da servidão, desafiador até mesmo para a altiva supervisora ​​de Timarchus, Cornélia (interpretada por Rosalba Neri).

Quando as garotas se envolvem em uma briga de comida que destrói a cozinha, um dos amigos de Timarchus sugere transformá-las em gladiadoras para a arena. Ansioso para manter os cidadãos que compram ingressos interessados nesse tipo de entretenimento, Timarchus logo tem as mulheres treinando para o combate sob a tutela do mestre gladiador Septimus (Peter Cester), um lutador careca enorme que comete o erro de se apaixonar por uma de suas novas alunas, Lucinia (Mary Count).

A primeira competição pública entre as gladiadoras é um evento cômico, sem que ninguém seja ferida ou morta. Mas a multidão sedenta de sangue fica facilmente entediada. O próximo confronto deverá ser até a morte. Mamawe e Bodicia percebem que cada uma delas vão acabar morrendo em algum momento na areia encharcada de sangue da arena, a menos que tomem uma atitude, façam uma revolução, numa tentativa de liberdade.

Essencialmente, esses filmes nos convidam a desfrutar vicariamente os prazeres do poder, testemunhando uma sucessão de espetáculos sádicos e, quando a roda gira pro outro lado, vemos o ciclo se repetir com as posições de vítima e vitimizador invertidas. Portanto, ao final, ver os poderosos se ajoelhando diante do poder feminino dessas gladiadoras já faz valer o filme. O significado pode ser tomado como sadiano: pegue o que puder, antes que a próxima contra-revolução chegue. Ou até budista: que atitude tomar para escapar do ciclo cármico. Seja como for, reforça a validade da máxima de John Dalberg-Acton: “o poder tende a corromper e o poder absoluto corrompe absolutamente“. Sim, é muita besteira intelectual/filosófica para justificar um filme como THE ARENA. Na verdade, o que o justifica é bem mais simples: Grier, Markov e outras moças no modo “vamos vestir se o papel exigir” e uma abundância de sequências de batalhas e duelos em arenas.

Não é nem um filme muito notável ou particularmente bom, mas também não é uma perda de tempo, especialmente se você tem interesse nessas questões, nas aventuras de “Espada e Sandália” e, obviamente, em senhoritas com pouquíssimas roupas. O ritmo do filme é bom, há muita ação, sobretudo os quinze minutos finais, que é uma longa batalha frenética de libertação, e é um daqueles filmes que tem muita coisa para se olhar. Certamente se beneficiou do acesso aos Estúdios Cinecittà de Roma, que possui muitos cenários e figurinos prontos, então o visual de THE ARENA é incrível, se pensarmos que foi feito com pouquíssimo orçamento.

O diretor de THE ARENA é o pupilo de Corman, Steve Carver, que mais tarde faria CAPONE, com Ben Gazzara, e um dos melhores veículos de Chuck Norris, McQUADE – O LOBO SOLITÁRIO. Aqui era sua estreia na direção e já colocado numa prova de fogo por Corman: enviado à Itália, pra filmar uma produção de época, com pouco dinheiro e prazo apertado, com uma equipe italiana e maioria dos atores europeus. E sem falar o idioma. O tipo de experiência que o cara entra como um aspirante à cineasta e sai como um mestre do filme B.

Alguns talentos locais lhe auxiliaram na empreitada, como o seu diretor de fotografia, as lentes de ninguém menos que Aristide Massaccesi, também conhecido como JOE D’AMATO, um dos maiores gênios do exploitation italiano. Na pontuação musical, temos Francesco De Masi, então você percebe que a coisa é decente no fim das contas, mesmo que a mise-en-scene seja em grande parte sem inspiração. Claro, considerando a situação até que Steve Carver se sai bem, mas, por favor, não dava pra exigir tanto do rapaz, que estava mais preocupado em filmar dentro do prazo do que fazer composições estéticas…

Mas para aquilo pelo qual o filme se propõe, de ser um típico exploitation com o selo de Roger Corman, um passatempo curto com bastante batalhas e uns peitos de fora, até que THE ARENA funciona perfeitamente.

ROEDORES DA NOITE (1995)

Com o DRÁCULA (92) do Coppola trazendo Bram Stoker e o horror gótico novamente às atenções no início dos anos 90, uma série de filmes de baixo orçamento, dos mais variados níveis de qualidade, procurou surfar na onda e tirar proveito do hype. E obviamente o rei dos B Movies, Roger Corman, não ia ficar de fora dessa. ROEDORES DA NOITE (Burial of the Rats), produzido pelo sujeito e dirigido por um cara legal chamado Dan Golden, é o resultado da empreitada.

Produção para TV, filmado na Rússia, nos estúdios Mosfilm – quando estavam praticamente falidos após a queda da União Soviética – ROEDORES DA NOITE não é lá um filme que eu classificaria como “bom” no sentido tradicional, mas é aquele tipo de produto que acabo gostando, e até me surpreendendo de alguma maneira, pelos motivos errados. O tipo de porcaria que pode ser muito divertido quando realizado por pessoas que realmente sabem o que estão fazendo. E que têm muita força de vontade pra fazer algo legal…

A “força de vontade”:

A trama de ROEDORES DA NOITE é inspirada num conto de Bram Stoker e protagonizada pelo próprio escritor. Em algum lugar na França do século IXX, o jovem Stoker (vivido por Kevin Alber) é sequestrado por um culto de mulheres guerreiras, que usam pouquíssimas roupas, odeiam homens e se auto intitulam “Rat Women“. Uma das integrantes é a bela Madeleine, interpretada por uma das habituais aqui do blog, Maria Ford. As “Rat Women” são lideradas por uma Rainha, que é encarnada por ninguém menos que a ex-Senhora John Carpenter, Adrienne Barbeau. Com ela à frente, essas mulheres guerreiras comandam hordas de ratos famintos e carnívoros para se vingar de todos os homens misóginos da região. E é nessa situação que o pobre Stoker foi parar…

Enquanto isso, o pai do futuro escritor enfrenta a indiferença da polícia local na busca por seu filho. Mas Stoker consegue dar seus pulos, sobrevive à tortura num pêndulo balançando sobre um poço de ratos, e ainda consegue atrair a atenção da bondosa Madeleine, apesar da desconfiança e ciúmes de uma colega, Anna (Olga Kabo). Além disso, seu talento para a escrita convence a rainha a deixá-lo viver e participar de algumas missões para documentar seus grandes feitos, registrar ao restante do mundo esse universo de mulheres peculiares. Aos poucos também, o mancebo Stoker conquista o coração (e outras coisas mais) de Madeleine… A situação do sujeito melhorou, não é mesmo?

ROEDORES DA NOITE lembra um pouco os filmes do ciclo Edgar Allan Poe, produções baseadas nesse escritor que o Corman dirigiu nos anos 60 e que resultou em alguns dos melhores filmes de horror do período. O tipo de produto que, realizado nos anos 90 com orçamento reduzido, feito nos moldes clássicos, já não fazia o menor sentido, exceto se os realizadores explorassem aquilo que não podiam trinta anos antes. E aqui exploram. Podem ter certeza disso… Aquela “força de vontade” a qual me referi ali em cima…

No entanto, nem só de molecagem e safadeza vive ROEDORES DA NOITE. Não que seja um daqueles filmes que se transformam em obras místicas transcendentais, nada disso. Mas me peguei prestando atenção em como o filme se torna em algum momento numa aventura realmente divertida, que me prendeu, com uma agradável veia romântica… Claro, não dá pra exigir muito do tal do Kevin Alber, que não é lá muito talentoso, além de ser feio pra burro, mas Maria Ford consegue fazer o seu lado com graciosidade e honestidade. Uma heroína exemplar: espirituosa, boa de esgrima e escassamente vestida.

Enquanto isso, temos Adrienne Barbeau, que praticamente passa o filme inteiro sentada no seu trono de rainha, maravilhosa, sob sua enorme peruca. E com um bando de ratos em seus pés. E o animal que não lhe agradar pode sofrer um terrível fim, como na cena em que Barbeau ordena que um dos ratos seja decapitado numa mini-guilhotina, seja lá por qual motivo… Só sei que é dos momentos mais bizarros – e engraçados – de ROEDORES DA NOITE.

Aliás, falando sobre os ratos, eles acabam tendo uma participação bem menor do que o esperado, já que os títulos, tanto no original quanto na nossa tradução nacional, remetem a eles. No entanto, sempre que aparecem, vale a pena. Em quinze segundos, esses dóceis animais são capazes de devorar um corpo deixando só o esqueleto de suas vítimas. A sequência final, quando Barbeau escolhe deixar seu destino cruel nas mãos desses ratinhos, é algo a se destacar…

Ainda no elenco, temos as participações especiais de Linnea Quigley e Nikki Fritz. As duas deviam estar perdidas nos sets na Rússia, fazendo sabe-se lá o que, e o Dan Golden deve ter chamado pra filmar alguma coisa. Juntas, as duas participações não dura nem dez segundos.

Aliás, que final! Uma batalha de proporções épicas – calma, estou considerando para o tipo de produção que temos aqui – com o exército francês invadindo o castelo das “Rat Women” e sendo recebidos pelas guerreiras em lutas de espadas frenéticas. Por mais risível que seja a encenação e o óbvio baixo orçamento da produção, Corman e Dan Golden conseguiram criar um espetáculo minimamente divertido que remete aos clássicos filmes de espadachim dos anos 40 e 50…

E enterrado sob a fartura de bobagens, mulheres com pouca roupa e muita luta de espada, existem lá no fundo algumas ideias bastante interessantes sobre a escrita/literatura como uma força de libertação ideológica e um discurso feminista de mulheres que procuram vingar os erros de uma sociedade dominada por homens. Mas os roteiristas de ROEDORES DA NOITE – e acredito que o público também – não estavam muito interessados em explorar com grande profundidade esse tipo de coisa num filme como esse.

Aqui é mais Corman garantindo que tudo funcione como um bom exploitation, com o elenco tirando a roupa com a maior frequência possível, uma boa dose de sangue, descolando cenários inusitados e bem legais lá na puta que pariu pra dar aquele ar de produção bem mais cara do que a realidade. A direção de Dan Golden (NAKED OBSESSION e HAUNTED SEA) também ajuda. Não é nada magistral, mas ele sabe onde colocar sua câmera.

Vejamos um exemplo e analisemos o talento do homem na direção:

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O CHEFÃO DE NOVA YORK (1973)

Revi O CHEFÃO DE NOVA YORK (Black Caesar), blaxploitation fundamental dirigido pelo grande Larry Cohen, para gravar mais um episódio supimpa do podcast Cine Poeira. Mas resolvi escrever algumas coisinhas também porque tava com saudade de postar algo sobre blaxploitation aqui no blog. E retomo ao tema em grande estilo porque é um dos meus filmes favoritos do subgênero. Tem uma boa história e direção cheia de energia de Cohen, uma trilha sonora fodida de James Brown (uma das raras que fez pra cinema) e atuação magistral de Fred Williamson, que interpreta um filho da puta cruel, uma espécie de atualização black motherfucker do anti-herói do cinema de gangster dos anos 30.

Obviamente que muitos relacionam O CHEFÃO DE NOVA YORK como o PODEROSO CHEFÃO do blaxploitation e até entendo a comparação. O filme do Coppola tinha ganhado a notoriedade que todos sabemos no ano anterior e qualquer filme de máfia que viesse em seguida ficaria à sua sombra. Mesmo um produto de baixo orçamento e mais apelativo como este aqui. O protagonista chega até a passar por um cinema onde o título do filme de Coppola pode ser lido na marquise. Mas tirando um detalhe ou outro, a influência maior de Cohen era realmente o cinema de gangster da Warner Bros. da década de 30. O próprio título original, BLACK CAESAR faz analogia a LITTLE CAESAR, de Mervyn LeRoy, estrelado pelo Edward G. Robinson, e baseado num dos grandes cássicos da literatura policial, escrito por William R. Burnett.

Então o que temos aqui é clássica trama de ascensão e queda. Seguimos Tommy Gibbs (Williamson), desde o tempo em que ele era engraxate no Harlem, executando tarefas para criminosos brancos em 1953 (que mais parece 1973, mas isso pouco importa), até atingir os degraus mais altos do mundo do crime em 1972. Cohen não se atenta aos detalhamentos dessa escalada de Tommy ao poder. Ele decide matar um sujeito que tava com a cabeça à prêmio, arranca a orelha da vítima e joga no prato de spaghetti do chefão local, pra ganhar respeito. E logo em seguida já estamos ouvindo a voz de James Brown entoando Paid The Cost To Be A Boss enquanto Fred Williamson imponente caminha pelas ruas do Harlen como o fodão dos fodões.

Cohen estrutura todo O CHEFÃO DE NOVA YORK com cenas chaves e elipses temporais sem qualquer concessão. Dias, meses e anos se passam num simples corte. E não demora muito já estamos ouvindo novamente James Brown com Ain’t It Cool to Be a Boss, enquanto Tommy assume o controle de todo o sindicato do crime, à base de balas e muito sangue derramado. Há uma sequência espetacular dos homens de Tommy invadindo um almoço italiano à beira da piscina com a nata da máfia, em LA, sendo sumariamente executada, com corpos ensanguentados boiando, e um plano detalhe genial de um frango assado sendo estourado à tiros. Desses momentos mágicos do cinema de exploração.

Como toda tragédia narrada sobre a conquista do poder, algo tem que dar merda. A arrogância de Tommy, sua ganância e sede de controle acaba por decretar sua queda. Perde a mulher, é corneado pelo amigo de infância – e parceiro de negócios – ele logo é percebido como um “negro branco”, seguindo os mesmos passos dos mafiosos italianos que estavam ali antes dele, sem ajudar os pobres e necessitados. Seus homens começam a ser abatidos, seu território fica ameaçado. A única coisa que o mantém são determinados cadernos de registros, uma folha de pagamento contendo nomes de altas figuras corruptas da política e polícia. O CHEFÃO DE NOVA YORK chama a atenção em manter as emoções em estado de ebulição. A dor do homem negro de não poder pertencer ao establishment sem se sentir um estranho. Mas as ideias peculiares de Cohen sobre justiça e moralidade são a de que criminosos são caras violentos, que destroem tudo ao seu redor, sejam lá de onde vieram, sejam negros ou brancos. Ainda assim, o filme atende aos medos e fantasias do público alvo e dá uma voz sobre a indignação dos negros e sua rixa contra a sociedade americana de uma forma bem convincente.

Rodado em apenas algumas semanas e com a câmera grosseira e marginal no estilo de guerrilha de Larry Cohen, o John Cassavates do cinema grindhouse, O CHEFÃO DE NOVA YORK tem vários momentos impressionantes. Dos encontros singelos do protagonista com seu pai, às cenas estilizadas com espaços com fundos negros para mascarar com maestria o baixo orçamento. Ou filmando nas ruas lotadas de Nova York sem autorização, com os transeuntes olhando pra câmera ou assistindo a performance genial de Fred Williamson. Sobretudo no terceiro ato, quando Tommy é gravemente ferido pelos pistoleiros de seu maior inimigo, o policial corrupto e racista McKinney (Art Lund), e anda vários quarteirões cambaleando com o bucho cheio de sangue.

O encontro final com McKinney é outro desses momentos impagáveis que prova a maestria dramatúrgica de Cohen. McKinney aponta uma arma para Tommy e não consegue resistir de provocá-lo exigindo um engraxate para rebaixá-lo ao máximo, para mostrar ao protagonista quem ele é, de onde veio, antes de matá-lo. Mas Tommy consegue se desvencilhar e esmurra McKinney repetidamente com a caixa de engraxate. O anti-herói negro esmagando a cabeça do vilão branco com uma caixa de engraxate não poderia ser simbolismo mais antológico para um clássico do blaxploitation.

Atordoado, Tommy retorna ao Harlem de sua infância, nos escombros dos prédios onde viveu, e acaba atacado num beco vazio por uma gangue de adolescentes que o espanca até a morte. Claro, com o sucesso do filme Cohen tratou de decidir que Tommy não morreu, e no mesmo ano lançaram a continuação, INFERNO NO HARLEN (Hell Up in Harlem).

No elenco, algumas figuras a se destacar. Gloria Hendry é um espetáculo, embora sua personagem, esposa de Tommy, careça de um desenvolvimento mais interessante. Ela só vai ganhar mais força lá pro final do filme. Art Lund é realmente ameaçador como McKinney. E a pequena participação de James Dixon, um habitual de Larry Cohen, é bacana como pistoleiro do policial corrupto.

Com bom ritmo, boa dose de ação, muito tiro e sangue, e um personagem principal realmente cool, O CHEFÃO DE NOVA YORK é um dos grandes da safra blaxploitation, ocupando um lugar próximo a clássicos como COFFY, SUPERFLY, SHAFT e outros exemplares que tornam o subgênero essencial aos interessados em exploitation. Quem se depara com esse petardo, nunca vai esquecer o poder, a força da natureza, o monumento que é Fred Williamson (curioso que o personagem foi pensado originalmente para Sammy Davis Jr…). Nem da genialidade de Larry Cohen como diretor, roteirista e produtor. E esse aqui tá longe de ser um de seus melhores trabalhos. De qualquer forma, altamente recomendado. Para quem está iniciando pelas plagas do blaxploitation, O CHEFÃO DE NOVA YORK é definitivamente um dos mais importantes a conferir.

E assim que o episódio do Cine Poeira estiver disponível, compartilho por aqui.

RUAS SELVAGENS (1984)

O diretor Danny Steinmann é provavelmente mais conhecido por SEXTA-FEIRA 13 – PARTE V: UM NOVO COMEÇO, que acabou sendo seu último trabalho, não fez mais nada desde então. O que é uma pena, porque eu gosto desse capítulo da série SEXTA-FEIRA 13, acho que ele manda bem, é um cara que veio do cinema underground do fim dos anos 60, dirigiu um filme pornô nos anos 70, então é um cara que tem uma certa bagagem pra trabalhar elementos de cinema de exploração, que não é bem o cenário de SF13 – PARTE V, mas é o caso deste seu filme anterior, RUAS SELVAGENS (SAVAGE STREET). Um petardo oitentista, rip-off das continuações de DESEJO DE MATAR marcado pela presença de Linda Blair, a menininha possuída de O EXORCISTA, fazendo uma espécie de Charles Bronson de saia, em busca de vingança pra cima de uma gangue.

Blair vive uma garota durona chamada Brenda. Estudante honesta, que come pão na chapa com café com leite pela manhã e não se deixa intimidar por qualquer otário que mexa com ela, suas amigas, e sua irmã mais nova, Heather, a musa scream queen Linnea Quigley, mas que aqui faz um papel de muda, e Brenda tem o maior cuidado por ela. Numa noite de diversão em uma boate, Brenda e sua turma acabam se metendo em problemas com uma gangue chamada The Scars, composta por quatro sujeitos bizarros que só existem nesse universo para praticar crimes, roubo, estupro e assassinatos, tudo de boa, na molecagem. Apesar de atacarem e violarem mulheres indefesas, eles não parecem ligar muito para definições de sexualidade, e estão constantemente se tocando, beijam na boca entre si, o que torna a gangue, digamos, singular…

Mas ao mesmo tempo, esses caras não estão muito a fim de levar desaforo pra casa. Sobretudo de garotas empoderadas como Brenda. O clima vai esquentando entre eles ao passar dos dias, até que a pobre Heather é pega desavisada no colégio e carregada à força pra dentro do vestiário, onde é brutalmente espancada e estuprada pelos quatro meliantes, numa sequência bem desagradável. Assim que Brenda fica sabendo do ocorrido, decide mostrar aos punks que a vingança é plena sim, mesmo que “mate a alma e a envenene”. Armada com uma besta, vestida com um macacão de couro, Brenda dá uma de Paul Kersey e começa a caçar um a um noite adentro.

Linda Blair está realmente ótima em RUAS SELVAGENS, num papel que foi originalmente planejado para Cherie Currie (a vocalista do The Runaways). De fato ela parece deslocada em alguns momentos, mas isso não a impede de se jogar na personagem mesmo que seja num filme que provavelmente não merecesse tanto esforço assim em primeiro lugar. Estamos naquele terreno cinematográfico que importa mais a quantidade de sangue e peitos na tela do que uma boa demonstração de dramaturgia… Mas ela e Quigley resolveram atuar, o que deixa a coisa mais interessante.

Quigley, em especial, apresenta uma performance corajosa que surpreende bastante. Não apenas na tal cena do estupro, que é realmente forte pelo seu desempenho corporal expressivo, mas ela e Blair compartilham alguns momentos críveis e ternos. Seu relacionamento e sentimento entre irmãs são bem convincentes e ajuda bastante em fazer com que a gente se importe de forma legítima com elas e seus destinos.

Já o elenco masculino, especialmente os The Scars, parece estar se divertindo com suas performances, já que são mais estereótipos exagerados e ameaçadores de gangues dos anos 80, com seus trajes ridículos e diálogos cafonas. E eles têm que funcionar o suficiente para alimentar a fúria de Brenda em sua jornada de vingança e conseguem isso com muita eficiência. Destaque para o grande John Vernon, fazendo o diretor do colégio (e que havia trabalhado com Linda Blair um ano antes em CORRENTES DO INFERNO).

Gealmente, quando eu vejo um filme desse tipo, eu consigo relevar furos de roteiro, atuações péssimas, efeitos especiais toscos, problemas técnicos de várias espécias… Mas uma coisa que não suporto em um exploitation é que ele seja enfadonho. RUAS SELVAGENS está longe de ser um filme chato, mas é preciso dizer que tem seus momentos que convidam o espectador ao sono, deixam a impressão que as coisas demoram demais pra acontecer. Mas quando acontecem, já esquecemos que o ritmo tava fraco e tudo volta a funcionar muito bem. E Steinmann faz um trabalho sólido por trás das câmeras quando chega a hora de lidar com os “bens” do bom e velho cinema de exploração: o estupro, garotas em chuveiros coletivos, brigas de moças rasgando blusas, Linda Blair de topless numa banheira, de forma totalmente gratuita, refletindo sobre a vida, e o final, a caçada noite adentro com Brenda eliminando seus desafetos.

Tá certo que no caminho ela deve ter parado para gravar algumas fitas dela rindo loucamente, porque no armazém de tecidos onde os bandidos se escondem ela coloca gravadores cuidadosamente em vários pontos do local para enganar os meliantes com o som da risada. Não é curioso pensar em Brenda sentada com seu gravador rindo como uma louca por uns bons minutos para gravar tudo isso? Claro, o filme não mostra essa parte – assim como nunca mostram o Batman aplicando seu delineador antes de botar a máscara. Também não mostra Brenda fazendo seu “penteado de vingança”, que é um permanete que deve ter dado um puta trabalho pra fazer antes de sair à caça…

E aí é só alegria, ver Brenda matando sem dó nem piedade, com flechadas e usando armadilhas de urso (!!!) os estupradores de sua irmã funciona lindamente. Porque, vocês sabem, todos nós sentimos a necessidade ou desejo, bem lá no fundo, de dar um murro na cara de alguém quando somos injustiçados. Mesmo que isso nunca vá acontecer na vida real… Pelo menos no meu caso, afinal, sou pacifista. Mas a vontade de socar a cara de alguém é grande de vez em quando, sobretudo bolson… Ops, melhor deixar pra lá. Enfim, filmes como RUAS SELVAGENS exploram nosso anseio e quando a coisa funciona, é preciso elogiar.

Então temos aqui um sucesso. Quero dizer, eu não diria que RUAS SELVAGENS é realmente um bom filme no sentido tradicional, mas certamente para o tipo de cinema que faz é diversão pura, cumpre o que promete. Há um bocado de nudez gratuita, brigas de garotas, gangues de rua fazendo maldades, imagens de uma Los Angeles oitentista cheia de neons, pessoas com roupas e penteados malucos aparecendo na tela, trilha sonora típica do período e Linda Blair numa jornada de vingança praticada com flechadas e armadilhas para ursos. Elementos que compensam o ritmo desequilibrado e fazem disso aqui um pequeno clássico do cinema B exploitation americano.

PUNHOS DE FERRO (1981)

PUNHOS DE FERRO (FIRECRACKER no original, mas também conhecido como NAKED FIST) é uma produção da New World Pictures, de Roger Corman, filmado nas Filipinas, com direção do grande Cirio H. Santiago.

Na trama, uma americana chamada Susanne Carter (Jillian Kesner) chega às Filipinas para procurar sua irmã, uma repórter desaparecida na região. A busca rapidamente a leva ao The Arena, uma espécie de clube noturno com apresentações de artes marciais e, em ocasiões especiais, noites de lutas clandestinas com apostas cheio de figuras amigáveis. E a coisa é violenta mesmo, geralmente terminando com o perdedor pronto para ser levado para o hospital ou direto pro caixão. O local é dirigido por um sujeito chamado Erik (Ken Metcalfe), o tipo de personagem que logo de cara não temos dúvidas de que é o malvado da trama, e foi o último lugar onde a repórter foi vista.

Outro cara mau do filme é a atração principal da Arena, um jovem lutador americano, um bigodudo chamado Chuck (Darby Hinton). Durante suas investigações, Susanne é avisada de que o rapaz é barra-pesada, do crime, do tráfico, das coisas seriamente perigosas e que deve ficar longe dele. Acontece que, por um acaso, Susanne também é especialista em artes marciais e não se intimida. Obviamente, o couro vai comer entre os dois… Em vários sentidos.

Nas buscas por pistas do desaparecimento de sua irmã, Susanne é constantemente atacada por bandidos, pelos mais diversos motivos, e Jillian Kesner aparenta ter sido realmente treinada em algum tipo de arte marcial. Isso fica evidente nas inúmeras cenas de pancadaria que ela aborda com gosto. Seus movimentos parecem convincentes não importa o cenário, roupas que usa – ou não usa – ou a quantidade de adversários, a moça manda muito bem na porrada. E é preciso dizer que PUNHOS DE FERRO não perde muito tempo para nos alegrar no quesito pancadaria. Nos primeiros minutos, há uma luta na Arena em que Chuck empala seu adversário, e Susanne, ainda em sua roupas íntimas, é atacada por dois bandidos em seu quarto de Hotel assim que chega no local.

E a coisa não para. A cada 5 minutos há alguma situação envolvendo pessoas lutando, trocando tiros ou em perseguição. Mas as investigações de Susanne continuam. E aos poucos, quanto mais adentra no universo da Arena, ela acaba cada vez mais atraída por Chuck, mesmo sabendo do envolvimento dele com os possíveis responsáveis pelo desaparecimento da irmã. E, claro, a certa altura já dá pra imaginar que algum coração vai sair machucado, a coisa não vai acabar muito bem…

Apesar da intensidade da ação, para um filme produzido por Roger Corman nos anos 80, não há tanto material de exploração quanto poderia almejar e é preciso esperar um tempinho para ter uma dose maior de violência ou um bocado de pele a mais. Quando chega, no entanto, é sublime e faz valer o tempo esperado. A melhor sequência é a fuga noturna de Susanne de dois tarados que acaba fazendo com que seu vestido seja rasgado, de forma totalmente gratuita, obrigando que ela encare os meliantes e aplique seus golpes só com a “roupa de baixo”. E isso já é legal o suficiente. Mas a coisa melhora ainda mais quando um dos sujeitos pega uma foice bem afiada e se lança pra cima da moça…

Não se preocupem, ela consegue sair ilesa do ataque, mas a lâmina corta exatamente o necessário…

Aparentemente, a ideia inicial não era para que isso acontecesse. Mas Roger Corman sentiu que os atributos da protagonista não estavam o suficiente “explorados” quando ele viu o primeiro corte do filme. Então, contratou o diretor Allan Holzman (que viria a fazer filmes futuros para Corman) para adicionar um par de novas cenas que obrigou Kesner a se despir. A primeira, foi esta aqui.

A princípio era apenas para que ela lutasse de calcinha e sutiã, mas um acidente legítimo na hora das filmagens realmente fez a atriz perder o bojo e a convenceram de continuar filmando assim mesmo… É desses momentos mágicos do cinema de exploração. O que se segue a partir disso é uma mulher de topless descendo o cacete num macho escroto. Isso que é empoderamento! E se vai mostrar seios num filme, dá muito bem pra fazê-lo com um certo estilo. É só tomar essa sequência de PUNHOS DE FERRO como exemplo. Aqui temos estilo de sobra.

A outra sequência que foi filmada por Holzman é o sexo bizarro cujas preliminares Susanne tem suas roupas removidas por Chuck, muito lentamente, com um par de facas bem afiadas. Sabe-se que Kesner não ficou lá muito satisfeita com a ideia de adicionar novas cenas apenas para tê-la nua na tela, mas aceitou fazer de boa… A única coisa que a irritava mesmo era a impressão de que sempre parecia haver mais homens no set durante essas filmagens do que o habitual.

Mas é exatamente nesta cena de sexo que Kesner finalmente atua, atua de verdade, com expressão. Ela transmite bem o estado emocional de Susanne de forma bastante eficaz. A cena possui uma carga de tensão a mais, dada uma certa informação que é conhecida pelo espectador, mas não por Susanne ainda, a de que Chuck é, na verdade, o assassino de sua irmã, o que torna o sexo entre eles um ato bem perverso.

E para quem não sabe, Kesner era esposa do grande Gary Graver, diretor de inúmeros filmes que passavam na famigerada sessão de filmes da Band, o Cine Privé, e que foi parceiro e diretor de fotografia de Orson Welles em seus últimos anos. Tanto Graver quanto Kesner dedicaram boa parte da vida preservando materiais e o legado de Welles – o que inclui THE OTHER SIDE OF THE WIND, filme póstumo do diretor de CIDADÃO KANE que só viu a luz do dia mais de trinta anos depois de sua morte. Mas a própria Kesner não pôde ver isso acontecer, já que faleceu em 2007.

Sobre outros membros do elenco, não há muito o que destacar. Darbin Hinton até funciona bem como vilão apaixonado, mas é aquele tipo canastrão que a gente elogia mais pelo ridículo do que pelo talento. No geral as atuações são simplesmente horríveis. Só que estamos diante de um exploitation, então quem diabos se importa com a performances? O importante pra filmes dessa espécie é não ser chato. E o ritmo por aqui é ótimo, há uma abundância de ação, Cirio H. Santiago filma bem, aproveita as locações urbanas e campestres das regiões filipinas, e o filme ainda tem um pouco de nudez, sexo e perversidade para apimentar a coisa.

Inclusive, a relaçao que é estabelecida entre Susanne e Chuck torna o clímax, a luta final entre os dois, ainda mais intenso e cheio de nuances. Chuck claramente poderia matar Susanne com as próprias mãos, mas entra em conflito por estar enamorado, enquanto a moça só tem desejo de vingança no coração. O desfecho é dos mais violentos possíveis. E há ainda o envolvimento da polícia e de alguns personagens secundários, amigos que Susanne faz pelo caminho, todos juntos tentando descobrir o paradeiro da irmã desaparecida e desbaratar o esquema das drogas que rola com a turma do vilão, Erik. O que acrescenta ainda mais um dose de pancadaria e ação. Sobretudo por conta da participação de um sujeito que é um clone do Bruce Lee e que possui alguns dos melhores movimentos nas sequências de luta.

PUNHO DE FERRO não é o tipo de filme que vai ganhar um prêmio de valor artístico ou vai entregar alguma reflexão sobre a condição humana, mas no quesito entretenimento e pancadaria de qualidade (bom, pelo menos para o nível da produção) pode apostar que não há do que reclamar. Altamente recomendado.

VIGILANTE FORCE (1976)

VIGILANTE FORCE é um desses petardos que só poderia ter saído nos anos 70 ou primeira metade dos anos 80, com a ressaca de tudo que rolou nos EUA durante esse período. Produzido por Gene Corman (irmão do grande Roger Corman), foi, no entanto, o pau pra toda obra da Corman Factory, George Armitage, que esteve na origem do projeto, tendo escrito o roteiro e dirigido. Ok, um “pau pra toda obra” não muito prolífico como diretor se olhamos para a carreira de Armitage de mais de quarenta anos e só sete filmes dirigidos, mas que merece o “apelido”. Sujeito trabalhou como ator, escreveu diversos roteiros, dirigiu e frequentemente era produtor de seus próprios filmes, dando uma bela contribuição ao B Movie americano.

E um bom exemplo de sua filmografia é VIGILANTE FORCE. O cenário é Elk Hills, uma pequena cidade na Califórnia que passa por um período problemático, com um alto índice de criminalidade pelas ruas somado aos fins de semana celebrados com badernas e cadeiras voando nos bares locais. Povoado de trabalhadores de uma petroleira, sabe? Moçada com sede tanto de cerveja quanto de sangue e violência. A cidade tem se tornado um local pouco atrativo para quem almeja um bocado de paz. E Ben Arnold (Jan-Michael Vincent) só gostaria de desfrutar da vida com seus negócios, sua namorada, cuidar da filha… Mas constantemente se depara com tiroteios à céu aberto. Homens que não hesitam em sacar suas armas para assaltar e atirar nos policiais locais que intervêm. Em suma, a lei e a ordem foi banalizada e a força policial não tem a mínima capacidade para encarar a bandidagem.

A única solução parece ser encontrar reforço. E Ben joga ao grupo de conselheiros da cidade (formada pelo prefeito, o xerife, o dono do banco, etc) uma ideia que pode ser a solução ideal: pedir ajuda ao seu irmão, Aaron Arnold (Kris Kristofferson), que voltou recentemente do Vietnã e tem trabalhado como segurança numa cidadezinha a alguns quilômetros de distância. Aparentemente, a coisa tende a funcionar. Aaron é um cara durão, badass, que saberia lidar com a situação que a cidade se encontra. Além disso, ele contrata seus velhos companheiros veteranos do Vietnã e não demora muito esse bando está usando uniforme e agindo pelas ruas da cidade. E em um local como este, onde andar por aí com um rifle parece tão comum quanto levar seus filhos para passear, esses “mercenários” se passando por homens da lei acabam dando conta do recado.

Até que a vaca vai pro brejo…

Aaron e seus comparsas cruzam certos limites e começam a usar seus uniformes para assassinar desafetos, ganhar dinheiro de forma ilícita e se tornar os reis do crime local. O que provoca um conflito entre irmãos difícil de resolver… E um embate de Kris Kristofferson vs Jan-Michael Vincent é só o que precisamos pra ser feliz num filme B de ação setentista.

George Armitage não parece muito determinado em acertar o tom do filme, mas há algo tão sincero nessa tentativa de ir além de um simples filme de ação que, mesmo mantendo uma cara de B Movie, cinema grindhouse, com momentos dignos de um exploitation americano – como a sequência da briga de galo, por exemplo, e tudo que se desenrola ali – VIGILANTE FORCE consegue também trabalhar alguns temas bem interessantes. É um drama policial de ação com tudo o que temos direito, desde tiroteios, brigas, perseguições e explosões – o final lembra as sandices exageradas de um DESEJO DE MATAR III, que é algo maravilhoso, com excepcional trabalho de dublês – mas ao mesmo tempo trata-se de um conto amargo sobre poder, que lança um olhar sobre uma era pós-Watergate e Guerra do Vietnã, da reabilitação de veteranos que adquirem, no meio de uma guerra, outros valores sob o jugo da bandeira americana. Uma América cujos valores são tão deturpados que chega a ser difícil confiar em alguém. Até mesmo num irmão.

E nesse desencontro de tons, VIGILANTE FORCE chega num equilibrio esquisito, mas bem bacana, entre ser esse crime movie exploitation e uma obra de teor social. O resultado é estranhíssimo, com um ritmo bizarro, mas cheio de boas sacadas e reflexões em meio à situações de exploração. Além de contar com as belas atuações de Kristofferson – que tá assustador – e Jan-Michael Vincent, que deixa o filme ainda mais divertido. Destaque também para as personagens femininas de Victoria Principal e Bernadette Peters. E não deixem de notar a pequena participação do grande Dick Miller como pianista de um bar.

X312 – FLIGHT TO HELL (1971)

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O início da década de 70 foi um ponto de virada na carreira do diretor Jesus Franco. No espaço de pouco tempo ele interrompeu sua colaboração de alguns anos com o produtor Harry Alan Towers e, acima de tudo, houve a trágica morte da atriz Soledad Miranda, musa do diretor. É nesse período também que Franco parte para a Alemanha e conhece o grande produtor Artur Brauner, que topa realizar os seus projetos, dentre os quais alguns dos mais famosos filmes de Franco, como VAMPYROS LESBOS e SHE KILLED IN ECSTAZY (ambos ainda filmados com Soledad). Um dos últimos filmes que resultou dessa colaboração foi este X312 – FLIGHT TO HELL, que assisti recentemente.

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A trama é sobre um grupo de passageiros que sobrevive à queda de um avião, vindo do Chile para o Rio de Janeiro, em plena floresta amazônica. Entre os sobreviventes estão o jornalista (Thomas Hunter) que narra a história, um comissário de bordo sem escrúpulos, um banqueiro e outros indivíduos aleatórios. Acontece que o banqueiro saiu às pressas do Chile com uma maleta cheia de milhões de dólares em diamantes, o que desperta muitas suspeitas, especialmente de Paco (vivido pelo ator espanhol Fernando Sancho), o comissário de bordo, que rapidamente percebe que o banqueiro esconde um verdadeiro tesouro.

Ao mesmo tempo que a sobrevivência na selva para essas pessoas consiste em se unir para poder sair dessa, cada um pensa em seus interesses pessoais, especialmente quando descobrem o que contém na famigerada maleta. Além disso, um grupo de guerrilheiros que se esconde nas proximidades, cujo lider é interpretado pelo Howard Vernon, eterno colaborador do diretor, também resolve colocar as mãos nas pedras. E como se isso tudo não bastasse, Franco ainda joga no meio da selva uma tribo de índios caçadores de cabeças no caminho dos sobreviventes… Portanto, a jornada promete… Ou talvez não.

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Apesar desse saladão todo, X312 – FLIGHT TO HELL nem é tão excessivo quanto aparenta. É até bastante classicista para um diretor como o Franco. Para quem conhece seu trabalho, sabe que o homem se destaca sobretudo em excesso e excesso… E não é bem o que acontece por aqui. A jornada desse desse punhado de personagens pela selva acaba parecendo mais como um circuito em um parque ornitológico do que uma aventura cheia de ideias absurdas brotando na tela… Na maior parte do tempo, Franco não consegue tirar o espectador de um certo estado de letargia. Até os atores favoritos do diretor são pouco aproveitados e reduzidos a papéis mínimos: Vernon como lider de guerrilheiros nas selvas brasileiras merecia um filme só pra ele, e Paul Muller acaba tendo apenas tem duas ceninhas.

Quem está muito bem e aproveita o momento é o protagonista, o galã Thomas Hunter (americano, que acabou fazendo filme de gênero na Europa), e o renomado Fernando Sancho, mais conhecido pela contribuição para o ciclo de Spaghetti Western. Para não se afastar da regra, Franco maliciosamente consegue colocar algumas ceninhas eróticas para fazer a alegria dos cuecas. E quem se destaca é a atriz Esperanza Roy (de EL ATAQUE DE LOS MUERTOS SIN OJOS, de Amando de Ossorio) que revela seus encantos em algumas ocasiões.

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Mesmo assim, suponho que Jess Franco ainda não tivesse se recuperado totalmente da morte de sua musa, Soledad, e se contentou em seguir as instruções de seu produtor, que provavelmente queria um produto mais “formatado”. Mas não chega a ser nenhum desastre, tem várias cenas curiosas, principalmente as que envolvem o personagem de Vernon (a sequência que sua amante e Esperanza Roy “colocam as aranhas para brigar” e ele assiste tudo com um sorriso na cara é uma das melhores do filme e um aperetivo do que poderia ter sido todo o restante caso Franco estivesse mais inspirado). Um bocado de nudez gratuita e alguns tiroteios também ajudam, são sempre divertidos de se ver e não vai faltar por aqui. Mas de uma forma geral, X312 – FLIGHT TO HELL não é dos melhores trabalhos do diretor…

HARDGORE (1974)

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Uma jovem ninfomaníaca que sofre de alucinações é colocada em um centro de reabilitação. O que ela não sabe é que o proprietário do local é o líder de um culto satânico que usa seus pacientes neuróticos para povoar orgias bizarras com direito a sacrifícios humanos… Bom, não dá pra negar, ao menos, que HARDGORE é um filme único!

Com apenas uma horinha de duração, trata-se de um híbrido de terror/pornô, típico do cinema de exploração americano dos anos 70, do tipo ‘porn chic‘ daquela época, mas jogando satanismo e gore na mistura. E resulta num filme pornô que, pelo menos, tenta algo diferente, o que é sempre bem-vindo, é claro. Mas acho bem difícil alguém ficar excitado hoje em dia com esse tipo de material… Nenhuma atriz (ou ator) é muito atraente, as cenas de sexo explícito não tem lá muita graça, e a trilha sonora tem a mania irritante de reciclar a mesma música repetidas vezes durante o filme. As sequências de horror são pouquíssimas e esporádicas, e, quando acontece, a falta de orçamento não ajuda muito. As tais “orgias satânicas” são quase completamente estáticas e com pouca coisa interessante acontecendo, apesar de algumas torturas. A cena em que uma mulher é guilhotinada no momento em que seu parceiro atinge o orgasmo definitivamente é um dos destaque de HARDGORE (aliás, que título mais cretino, pqp). Outra ceninha boa é a do cara que tem o pênis cortado, o que resulta na protagonista recebendo um tipo diferente de fluido no rosto, diferente do que ela originalmente esperava… Sim, um filme para toda a Família! As sequências de alucinações da protagonista também são bem bobinhas. Na maioria das vezes, bastante ridículas (vibradores voando com cordinhas, jorrando porra?). Eu sei, não deixa de ser bizarro ao mesmo tempo. 

Depois de passar maus bocados, a protagonista se vinga no final sob a forma de um tumulto generalizado, mas mesmo isso é bastante tedioso e o filme acaba de repente. Recomendo.

MANDINGO (1975)

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Último sábado teve mais uma sessão do Cineclube Vertigo, capitaneado pelo grande Guilherme Ferraro. O filme que passou foi MANDINGO, do Richard Fleischer, que é um diretor que ando atualmente fascinado, descobrindo várias coisas, mas este aqui ainda não tinha assistido. Valeu a pena, é um filmaço, um épico subversivo e polêmico sobre escravidão com uma pegada sensacionalista, abusando de violência e nudez, mas também uma interessante reflexão histórica e precisa do racismo. Produzido pelo lendário Dino De Laurentiis, o filme também foi uma das principais inspirações de Quentin Tarantino em DJANGO LIVRE.

Lixo racista, obsceno… este é um filme pelo qual me senti sujo.

Isso aí foi o que o famoso crítico Roger Ebert escreveu sobre MANDINGO à época do lançamento. O sujeito não entendeu NADA. E se um filme faz um crítico respeitado como o Ebert escrever algo assim, só pode ser coisa boa. Mas realmente não é um filme fácil de se ver, o tratamento de Fleischer sobre o assunto é barra pesada, deixa o público desconfortável, é bem direto em confrontar a brutalidade da escravidão, e não apenas os males óbvios, mas o efeito moral corrosivo sobre todos os envolvidos, tanto vítima quanto opressor. O filme não faz concessão alguma em explorar as degradações diárias quase inimagináveis que são parte integrante de uma sociedade que trata as pessoas de pele negra como inferiores, como animais sem alma.

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O grande James Mason é Warren Maxwell, o dono de uma fazenda no século XIX que mantém seus escravos ignorantes em leitura, escrita e religião. Seu filho coxo, Hammond (Perry King) evita as afeições de mulheres brancas e prefere se deitar com escravas, até se apaixonar por uma delas. Seu pai fica cansado das suas relações inter-raciais e insiste em que ele se case com sua prima Blanche (Susan George) para manter as aparências e, mais importante, lhe arrumar um herdeiro. Certo dia, no mercado de escravos, Hammond compra um imponente mandingo chamado Mede (Ken Norton). Forte como um touro, o sujeito vai servir para a procriação, mas também como ficha de aposta em lutas entre mandingos. Blanche fica chateada que Hammond a despreza, sempre ocupado seduzindo sua escrava favorita, então ela resolve convidar Mede à sua cama. Fica grávida. Quando dá à luz ao tão aguardado herdeiro, adivinhem a cor do bebê…

MANDINGO lida com o tema das relações inter-raciais com bastante sensibilidade, praticamente como um melodrama sentimental. Mas o filme segue em um ritmo sinuoso e chega até a sofrer uma crise de personalidade em alguns trechos. Às vezes Fleischer parece que ele está tentando fazer um …E O VENTO LEVOU 2, outras vezes ele age como se estivesse filmando um exploitation sensacionalista de Gualtiero Jacopetti. Portanto, ao mesmo tempo em que MANDINGO se demonstra crítico e sério ao tratar de um assunto relevante como o racismo, há uma quantidade enorme de situações irreverentes para manter o público a um certo nível de entretenimento. Cenas de nudez e sexo gratuitos temos aos montes; Mason drenando constantemente seus pés reumáticos em meninos escravos; um escravo sendo pendurados de cabeça para baixo e espancados até que o traseiro fique ensanguentado; um líder rebelde de mentalidade moderna pouco antes de ser enforcado, solta uma máxima clássica da era blaxploitation: “Kiss my black ass!“… E por aí vai.

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A direção de Fleischer reflete bastante essa dualidade, é classuda na maior parte do tempo, com planos e enquadramentos bonitos e bem pensados. A fotografia é um deslumbre. Mas aí vem uma cena como a luta organizada entre os Mandingos e o diretor perde a compostura, filma com uma câmera nervosa como se fosse um filme B produzido pelo Roger Corman. A coisa é realmente brutal e está entre os muitos destaques de MANDINGO. O filme fica nesse contraste, que acaba sendo bem-vindo: Na superfície, um autêntico exploitation, mas que revela em suas camadas uma abordagem reflexiva e crítica sobre racismo.

As performances são um pouco desequilibradas, mas funcionam na maior parte do tempo. Mason faz um desempenho magistral, obviamente. É desses atores que dá gosto de ver em cena. Perry King é fraco, mas consegue dar conta, mesmo seu personagem sendo tão complexo, numa ambiguidade interessante em relação aos escravos. Susan George tá canastrona, exagerada e histérica além do necessário. Como disse o amigo Edu Aguilar, só o Peckinpah pra fazê-la atuar… Mas parece ao menos estar se divertindo como a esposa ignorada empunhando um chicote, com os olhos selvagens, espancando uma escrava grávida. Ken Norton também faz uma impressão considerável como Mede.

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Os entusiastas de blues também ficarão satisfeitos quando ouvirem a ótima música tema de Muddy Waters que abre o filme. MANDINGO teve uma continuação no ano seguinte, DRUM, que se passa quinze anos após os acontecimentos deste aqui. Também foi produzido por Dino De Laurentiis e dirigido Burt Kennedy, que teve problemas com o produtor e acabou sendo substituído por Steve Carver, que o finalizou. No elenco, Warren Oates. Uma tentativa discreta de firmar o sub-sub-gênero Slavesploitation no cinema de exploração do período…

CANNIBAL APOCALYPSE (1980)

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Apesar do título, é no mínimo questionável classificar CANNIBAL APOCALYPSE dentro do subgênero cannibal, tão comum no final dos anos 70 e início dos 80 no cinema popular de exploração italiano. Caso seja classificado, que seja então como um representante bastante alternativo, não compartilha virtualmente quase nada em comum com os outros filmes do subgênero. Não é uma aventura na selva, com exploradores se metendo com tribos canibais, por exemplo. E, embora eu não tenha do que reclamar da brutalidade por aqui, o nível de violência não chega nem perto dos excessos de um CANNIBAL HOLOCAUSTO, CANNIBAL FEROX e outros similares. Mas há comedores de carne no filme, obviamente, só que eles são habitantes “civilizados” da cidade de Atlanta, infectados por um vírus que lhe despertam desejo de carne humana.

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No entanto, CANNIBAL APOCALYPSE inicia realmente nas selvas, só que do Vietnã, durante a guerra, quando o oficial das Forças Especiais do Exército dos EUA, Norman Hopper (John Saxon), lidera um pelotão de soldados em uma missão de busca num complexo de cavernas Vietcong onde são mantidos prisioneiros de guerra. Depois de eliminar o inimigo num espetáculo de tiros e explosões, eles descobrem um buraco onde estão dois americanos capturados, Charlie Bukowski (sim, podem acreditar que esse é o nome do personagem vivido por Giovanni Lombardo Radice) e Tommy (Tony King).

Hopper fica feliz de vê-los ainda com vida – até porque conhece os sujeitos, ambos são de sua cidade natal – mas ao mesmo tempo, acaba tendo a visão aterradora deles devorando avidamente a carne de uma guerrilheira inimiga que havia caído lá dentro. Então, num rosnado selvagem, Tommy salta e dá uma mordida no braço estendido de Hopper.

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Nesse ponto, Hopper acorda de um pesadelo febril, na cama com sua esposa Jane (Elizabeth Turner) em Atlanta, anos depois da guerra. A sequência de abertura do filme foi um flashback/sonho de Hopper no Vietnã revelando um incidente que realmente aconteceu. Hopper está preocupado com o sonho; ultimamente ele desenvolveu uma estranha atração pela carne crua. Lutar contra esse desejo torna-se cada vez mais difícil, colocando uma pressão até sobre o seu casamento (isso sem falar na vizinha adolescente que lhe “atormenta” a vida com visitas inusitadas…).

Enquanto isso, Bukowski é libertado de uma ala psiquiátrica local, onde está encarcerado desde o fim da guerra. Supostamente curado, em seu primeiro dia de liberdade ele entra em conflito com uma gangue de motoqueiros, ataca uma mulher em um cinema (morde um pedaço sangrento do pescoço), depois mata duas pessoas em um mercado e fica encurralado enquanto os policiais cercam o prédio. Fiquei com a impressão que o sujeito não estava tão curado assim…

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Daqui pra frente, CANNIBAL APOCALYPSE se transforma num festival de mordidas violentas! Ao saber da situação de Bukowski, Hopper aparece no local e consegue convencê-lo a se entregar. Mas Charlie morde um policial no momento de ser colocado pra dentro do camburão. Em vez da prisão, Bukowski é transportado de volta para o hospital psiquiátrico, onde ele se reúne novamente com seu companheiro de guerra, Tommy. Este, acaba mordendo a perna de uma enfermeira, que o deixa amarrado a uma maca ao lado de Charlie, na ala de alta segurança.

Os médicos determinam que ambos são portadores de um vírus misterioso que de alguma forma os transforma em canibais. Mais tarde Hopper aparece no hospital e resolve libertar Charlie e Tommy e fugir com eles sabe-se lá pra onde… A enfermeira infectada por Tommy se junta a eles depois de morder a língua de um médico excitado. O inusitado quarteto rouba uma ambulância e parte para a noite deixando algumas vítimas no caminho, enquanto a polícia, liderada pelo Capitão McCoy (Wallace Wilkenson), se engaja em uma caçada frenética para deter os canibais antes que eles possam espalhar ainda mais o suposto vírus.

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Pois é, CANNIBAL APOCALYPSE é essa loucura absurda, mas interessante e divertido exemplar que se beneficia bastante da direção imaginativa e segura de Margheriti, que eleva o filme um ou dois níveis acima do habitual do cinema de exploração, além das performances sólidas do elenco, com destaque para Saxon e Radici. O conceito de um vírus canibal também é certamente uma das melhores ideias do filme, a de um fenômeno social representado no canibalismo como uma doença contagiosa, que é algo bem mais, digamos, reflexivo do que as filmagens de mortes de animais reais usadas nos cannibal movies tradicionais.

Eu sei, os efeitos especiais de CANNIBAL APOCALYPSE são de Giannetto De Rossi, que possui no currículo obras contendo algumas das mais extremas imagens do cinema italiano de gênero. Portanto, não é que não existam cenas de extrema violência gratuita e muitos efeitos sanguinolentos por aqui, só acho que não é somente nisso que Margheriti estava interessado… Mas os fanáticos por tais elementos mais impactantes não precisam se preocupar e vão se esbaldar, especialmente na cena de morte do personagem de Radice, filmado em toda a sua glória visceral. Não é a toa, portanto, que CANNIBAL APOCALYPSE tenha sido marcado por um histórico de censura e cortes em lançamentos pelo mundo. No Reino Unido, por exemplo, até 2005 o filme estava banido, assim como em outros países. No Brasil, foi exibido sem cortes em 1981 sob o título OS CANIBAIS DO HOLOCAUSTO. 

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TONIGHT FOR SURE (1962)

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Se você cavucar o início de carreira de algumas figuras consagradas do cinema, pode ser que encontre alguns esqueletos enterrados. O diretor Francis Ford Coppola é um desses casos e, pouca gente sabe, mas muito antes de se tornar um dos principais autores do cinema americano pós-anos 70, com obras-primas grandiosas como O PODEROSO CHEFÃO e APOCALIPSE NOW, o sujeito já tinha uma filmografia cheia de produções questionáveis do cinema exploitation, B-Movies esquecidos e hoje pouco comentados, trabalhou até como pupilo de Roger Corman (inclusive o filme que dá nome ao blog, o horror DEMENTIA 13, é um trabalho pouco lembrado de Coppola). Mas nada que o diretor tenha que se envergonhar também, TONIGHT FOR SURE por exemplo, é bem melhor que um YOUTH WITHOUT YOUTH ou JACK, trabalhos que Coppola realizou já tendo seu nome celebrado.

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TONIGHT FOR SURE é um típico “Nudie“, gênero do sexploitation que surgiu no fim dos anos 50 no cinema americano e cuja principal função era explorar corpos femininos em completa nudez. É evidente que na época devia fazer alguns marmanjos correrem atrás desse tipo de material, mas vistos hoje, são filmes bem ingênuos, a maioria filmadas em campo de nudismo ou boates de striptease, sem erotizar muito as situações. Pepecas e manjubas nunca eram mostradas e o que se via era predominantemente seios e bundas balançados em jogos de vôlei, à beira de piscinas ou em apresentações burlescas de striptease… Curioso que um dos principais representantes na direção do gênero era uma mulher, Doris Wishman, que realizou um bom número de exemplares, como NUDE ON THE MOON. E, pois é, pode acreditar, é esse o tipo de filme que o Coppola fez por aqui.

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A trama é sobre dois sujeitos moralistas que se encontram e decidem lutar contra a crescente onda de luxúria no mundo. Um deles é um caipira que entra na cidade em um burro atrapalhando o trânsito, o outro é um dândi engomadinho da cidade grande. Com a intenção de algum tipo de desordem que repercuta na pouca-vergonha que o mundo se encontra, eles entram num Club de striptease antes do show começar e, na surdina, prendem algo na caixa de rede elétrica, programada para detonar à meia-noite.

Enquanto esperam pela detonação, eles se sentam na boate e trocam histórias sobre os males do pecado e das mulheres lascivas (e claro, enquanto estão tagarelando, garotas burlescas estão se exibindo no palco atrás deles e gradativamente eles vão se aproximando, sentando em mesas mais perto das mulheres que se apresentam). O caubói relata como um amigo passou a ter ilusões “terríveis” em que todas as mulheres ao seu redor estavam nuas. O outro conta sua história, se revelando um devasso que prega a moralidade como uma desculpa para bancar de voyeur num estúdio de fotografia Pin-Up.

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Com apenas uma hora de projeção, TONIGHT FOR SURE não possui nenhuma sutileza, os homens são caricatos e idiotas e as mulheres são carne. A única pretensão de Coppola aqui é criar situações para mostrar alguns peitos de fora. Só isso. A direção de Coppola, então com pouco mais de vinte anos, é pesada, com um lampejo ou outro de criatividade num ângulo ousado ou movimento de câmera (a fotografia é do grande Jack Hill, futuro mestre do exploitation americano e que na época era colega de classe de Coppola na UCLA), mas ninguém poderia prever que o mesmo sujeito fosse virar referência de autorismo dez anos depois, que ganharia o Oscar de melhor diretor, que venceria Cannes!

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Os atores são horríveis, o humor do filme é pastelão da pior qualidade e a produção é bem pobre, mas até que dá pra tirar um sarro e se divertir um bocadinho. E mais um detalhe positivo, Coppola pelo menos encontrou alguns mulheres bem mais apetitosas que as habituais habitantes que povoam os Nudies.

Mas no fim das contas, TONIGHT FOR SURE é só mais um exemplar mediano do gênero que eu nunca teria sequer contato caso não fosse dirigido pelo Coppola. Vale pela curiosidade para conhecer as raízes capengas de um grande mestre.

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RACE WITH THE DEVIL (1975)

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Os prazeres da descoberta cinéfila são sempre renovadores, especialmente quando se trata de bons exemplares do exploitation americano setentista que hoje quase todo mundo não dá a mínima, como é o caso de RACE WITH THE DEVIL, de Jack Starrett. Um híbrido de ação com horror que é um filmaço. Na verdade, a “descoberta” deste filme específico vai ser de quem ainda não conferiu, porque eu pessoalmente já tive esse prazer há alguns bons anos, mas desde então me pego revendo essa pérola. Então para começar bem o fim de semana, a dica é RACE WITH THE DEVIL, que saiu aqui no Brasil como CORRIDA COM O DIABO.

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Na trama, os bons amigos Roger (Peter Fonda) e Frank (Warren Oates) planejam as melhores férias de suas vidas. Acompanhados pelas suas respectivas mulheres, Kelly (Lara Parker do seriado DARK SHADOWS) e Alice (Loretta Swit, “Hot Lips” do seriado MASH), os dois casais enchem o luxuoso trailer de Frank de cerveja e outros mantimentos e caem na estrada para uma viagem até o Colorado. Num trecho rural do Texas, eles acham um ponto para estacionar e descansar durante a noite. Sob a lua cheia os dois amigos vão à beira de um riacho, jogam conversa fora enquanto enchem o bucho de álcool, quando veem uma enorme fogueira sendo acesa do outro lado do rio.

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Observando a cena de forma, digamos, clandestina, Frank e Roger a princípio pensam que estão testemunhando uma boa e velha putaria de hippies libertinos; várias mulheres peladonas brincando em volta do fogo fazem com que os dois disputem jovialmente os binóculos. Só que a diversão se transforma em horror quando uma moça é esfaqueada por uma figura com uma máscara bizarra em algum tipo de sacrifício humano ritualístico. Os dois sujeitos borram nas calças, metaforicamente falando, e decidem tirar o trailer de lá antes que sejam vistos. Mas é tarde demais – um bando de adoradores do Diabo já está se espalhando pelo rio, correndo direto na direção da dupla.

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Depois da fuga, os casais vão até a delegacia de polícia mais próxima para relatar o que aconteceu. O amável Sheriff Taylor (veterano ator R.G. Armstrong) investiga devidamente o local, mas Frank começa a suspeitar de algo. A força policial local parece tranquila demais, até irreverente eu diria, sobre um possível assassinato de uma jovem numa floresta no meio da noite. O xerife sugere que hippies “fumaram umas cocaina”, estavam de brincadeira e que os dois amigos deve ter se confundido com alguma encenação… Mas aos poucos, vários sinais misteriosos vão sendo deixados aos casais protagonistas, que parecem indicar exatamente o contrário do que a polícia pensa. Não exatamente certo em que acreditar, o quarteto continua suas férias, deixando para trás a horrível experiência daquela noite. Mas parece que nem todo mundo quer “virar essa página”…

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RACE WITH THE DEVIL é uma miscelânea de temas e gêneros muito bem combinados. Temos uma pitada de horror rural do início dos anos 70, como DELIVERANCE, do John Boorman, ingredientes do horror satanista e um bocado de thriller/ação para dar um tempero mais excitante. Na verdade, é curioso pensar que toda a ideia do culto satânico poderia ser facilmente substituído por algum outro tipo de atividade nefasta – contrabando de drogas, escravidão humana, enfim, qualquer coisa – e pouco da trama precisaria ser alterado. Mas o toque de horror dessa mistura de gêneros vem com um gostinho especial, são vários momentos em que as convenções do terror deixam as coisas mais tensas de acompanhar…

A cena do ritual, por exemplo, é bem macabra e os figurantes eram compostos por membros reais de seitas, conforme afirma o diretor Jack Starrett em entrevistas. Se é verdade, eu não sei, só garanto que a coisa toda é uma experiência angustiante. Até porque, em vez de pegar em cheio na jugular, RACE WITH THE DEVIL toma o seu tempo em estabelecer o cenário, em construir os personagens e em aumentar gradualmente o suspense e a tensão.

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A ação mais direta, mais  deflagradora mesmo, não entra em cena até os 15 minutos finais, em uma sequência de perseguição de tirar o fôlego, colocando o trailer dos protagonistas contra um bando de carros e caminhões dirigidos pelos membros da seita. Numa época em que nem se sonhavam nas possibilidades dos efeitos especiais de CGI, é revigorante ver os dublês se arriscando perigosamente ou pirotecnias geradas com explosivos reais em vez de pixels movidos à photoshop. Os carros trombando em alta velocidade no clímax é de encher os olhos e lembram muito o que George Miller faria no seu maravilhoso MAD MAX II, oito anos depois. Não ficaria surpreso se houvesse algum tipo de influência deste aqui sobre a obra do australiano.

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RACE WITH THE DEVIL era inicialmente para ser dirigido por Lee Frost, especialista em filmes baratos daquele período, mas acabou substituído pelo Starrett, que era outra figura que contribuiu bastante com o cinema exploitation. Frost chegou a receber crédito como roteirista, ao lado de Wes Bishop, mas todas as cenas que rodou foram refilmadas por Starrett. O sujeito tinha um estilo eficiente e direto de filmar, sem muita frescura, não se vê virtuosismo e beleza estética nos filmes do Starrett, embora ele consiga extrair sempre algo interessante do seu material. E RACE WITH THE DEVIL é um de seus momentos mais inspirados, sem duvida.

Para quem não sabe, o Starrett também era ator, participou de muita produção de baixo orçamento, mas é mais conhecido por ter vivido o policial sádico que acerta umas pancadas em John Rambo em RAMBO – PROGRAMADO PARA MATAR. O mesmo que cai do helicóptero, que balança quando Rambo acerta uma pedrada… Enfim, só uma curiosidade.

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Por último, vale destacar a presença de dois dos mais significativos nomes do cinema setentista encabeçando o elenco, Fonda e Oates, que estão excelentes como os amigos tranquilos, bem de vida, que só querem um pouco de paz e diversão em família e acabam metidos numa confusão macabra em que precisam chegar aos extremos, pegar em armas e atirar para matar. Já o lado feminino infelizmente acaba não tendo muito destaque, o que é estranho considerando que o movimento feminista estava em plena atividade na metade dos anos setenta; as esposas de Roger e Frank não passam de mulherzinhas completamente indefesas que se põem a gritar e a chorar a qualquer circunstância misteriosa.

Tirando isso, filmaço! RACE OF THE DEVIL Foi lançado em DVD por aqui, mas se não encontrar, procure nos torrents, foda-se, encontre alguma maneira de conhecer este clássico do cinema grindhouse.

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THE CUT-THROATS (1969)

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Mais um trabalho do diretor John Hayes, aquele de SWEET TRASH, que postei aqui logo no início do ano. O sujeito é simplesmente um mestre esquecido do exploitation americano. THE CUT THROATS é o filme da vez, um thriller fuleiro, mas muito divertido, de II Guerra Mundial. O plot básico, a princípio, se passa nos últimos dias da guerra numa versão de OS DOZE CONDENADOS da putaria: Um grupo de soldados americanos é reunido para uma missão suicida numa base nazista para roubar os planos de guerra do alemães.

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O filme não enrola muito pra começar, embora logo no início tenha uma sequência totalmente gratuita de um alemão estuprando uma moça que vaga pelo campo, que de tão desnecessária já torna a situação, no mínimo, curiosa. Até porque o “campo” parece mais algum fundo de estúdio na Califórnia… E até onde eu entendo de história, os nazistas não chegaram tão longe… Haha! Mas o planejamento e a execução da missão acontece bem cedo. Os soldados americanos atacam a base e fazem a limpa, eliminam praticamente todos os nazistas no local. Fácil. Só que estamos num exploitation do Hayes, então a missão ou os tais planos de guerra são as coisas que menos importa.

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O fato é que a base também é ocupada por um grupo de moças sapecas que fazem a alegria da moçada. E a narrativa acaba se construindo em blocos de situações dos soldados e seus envolvimentos sexuais com as mulheres, desde um show burlesco até as mais variadas possibilidades dentro de aposentos, numa noite bem agitada.

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Outra coisa que faz THE CUT THROATS andar é que o plano do líder do grupo americano não é exatamente o que ele contou a seu time. Planos de guerra? Porra nenhuma! o sujeito está realmente atrás é de uma fortuna em jóias roubadas e ouro que os nazistas acumularam durante a guerra. E ele não está muito interessado em compartilhar seus ganhos com qualquer um, nem mesmo com seus companheiros de guerra. Continuar lendo

SWEET TRASH (1970)

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Ando vendo alguns exploitation bem legais dos anos 60 e 70. Coisas realmente obscuras, bizarras e divertidas das quais nunca ouvi falar, mas que de vez em quando revelam descobertas raras e preciosas. Então para começar as atividades em 2018, um pouco de cinema de exploração por aqui, cinema underground, subversão, violência gráfica e peitos de fora para animar as coisas e espantar o politicamente correto que reinou no ano passado.

Uma das principais descobertas que fiz nesses últimos dias foi SWEET TRASH – uma mistura absurdamente maluca de gangster movie, sexploitation e sci-fi. E também o trabalho de seu diretor, John Hayes. O cara é simplesmente um mestre esquecido do exploitation americano, cuja carreira começa no início da década de 60 e vai até meados dos anos 80, trabalhado tanto na frente quanto atrás das câmeras, escrevendo, montando e dirigindo produções que variam do terror, como o infame GRAVE OF THE VAMPIRE (1972), à filmes sexo explícito.

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O primeiro dele que vi foi este SWEET TRASH, que eu não fazia a menor ideia do que se tratava e me deparei por acaso. Mas valeu a pena. O filme começa mostrando as docas de New York, depois as ruas, o trânsito, pessoas e finalmente um apartamento de carpete vermelho por onde a câmera passeia lentamente numa fluidez que me chamou a atenção… Num único plano a câmera percorre um corredor, adentra um quarto e revela um casal fazendo sexo até enquadrá-los no centro da tela. Geralmente, nessas produções grindhouse independentes um diretor já partiria, com perdão do meu francês, pra putaria, enquanto Hayes resolve dar uma de diretor e trabalha movimentos de câmera, enquadramento, com noção de paleta de cores… como dizia Charles Bukowski, “Nem tudo são garrafas vazias… Há a arte“. Continuar lendo

THE BIG DOLL HOUSE (1971)

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A ideia de realizar THE BIG DOLL HOUSE chegou até o diretor Jack Hill como uma tentativa de fazer um spinoff de 99 WOMEN (69), do espanhol Jess Franco, um dos primeiros filmes do subgênero Women in Prison. Hill achava que poderia haver um público para este tipo de produto, então, reuniu uma pequena equipe, escalou um grupo de belas atrizes, recebeu a benção do mentor Roger Corman e partiu para as Filipinas, berço de produções exploitations naquele período. Como bom pupilo de Corman, o diretor filmou com tanta economia que acabou saindo de lá com dois WIPs debaixo do braço: Tanto este THE BIG DOLL HOUSE quanto THE BIG BIRD CAGE (72).

Boa parte da carreira de Hill é dedicada ao universo feminino, destacando a força da mulher em situações que deixariam machões no chinelo. Portanto, o subgênero WIP é o típico prato cheio para que o roteiro explorasse ao máximo esse tipo de situação. O roteiro, aliás, não precisava nem ser exigente demais em tentar criar enredos intrincados e verossímeis, bastava colocar as personagens nuas em chuveiros coletivos ou brigando na lama para surtir reflexões filosóficas e garantir a dose de emoção necessária que o espectador precisava.

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THE BIG DOLL HOUSE preenche com facilidade todos os requisitos, até porque é aqui que Jack Hill define vários princípios que ficaram enraizados ao gênero. O filme começa com a bela ruiva Collier (Judy Brown) sendo transportada para uma prisão de mulheres nas selvas Filipinas. Passa por uma inspeção médica, com os seios à mostra, para variar, e logo, na sua cela, é apresentada a um elenco feminino cheio de beldades, incluindo a musa negra, Pam Grier, que estrelaria dois clássicos blaxploitation comandado por Hill, COFFY (73) e FOXY BROWN (74). A partir daí, o filme continua misturando todos os ingredientes que fazem um típico WIP funcionar.

Portanto, temos os planos de fugas, cenas de torturas praticadas pela carcereira chefe, lesbianismo, uma luta na lama entre Grier e Roberta Collins, corrida de baratas, muitos tiros e explosões num final cheio de ação. Um dos grandes destaques de THE BIG DOLL HOUSE é a presença do ator Sid Haig, roubando todas as cenas em que aparece, em especial quando contracena com Pam Grier. Haig se especializou em fazer tipos estranhos em fitas de exploração e também já havia trabalhado com Hill, no clássico SPIDER BABY (68) e até mesmo no seu curta-metragem de estreia THE HOST (63).

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THE BIG DOLL HOUSE é um desses exemplares essenciais para os apreciadores dos subgêneros obscuros que o cinema tem para oferecer. E Jack Hill é nome fundamental nesse sentido. Faz aqui um trabalho excepcional, com um orçamento baixíssimo, mas muita criatividade e boa vontade, criando um autêntico clássico da era grindhouse.

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HONEY BRITCHES, aka DEMENTED DEATH FARM MASSACRE… THE MOVIE (1971/1986)

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Filme totalmente deslocado na carreira do prolífico Fred Olen Ray, HONEY BRITCHES foi produzido no início da década de setenta quando o sujeito não tinha completado nem vinte anos de idade e, mesmo assim, é muitas vezes confundido como o seu primeiro trabalho como diretor. Mas calma lá que vou explicar, até porque se trata apenas de uma picaretagem usual desses diretores de filme B.

HONEY BRITCHES realmente foi filmado no início da década de 70, mas por um tal Donn Davidson, e foi muito mal lançado comercialmente pela Something Weird. Fred Olen Ray só entra na parada em meados dos anos 80, quando descobre a existência do filme e decide comprá-lo. O sujeito reeditou a porra toda, filmou e acrescentou algumas cenas do bom e velho John Carradine como o contador da história, dizendo-se o “Juiz do Inferno”, falando qualquer baboseira só pra ter um apelo comercial, colocou seu nome nos créditos como diretor e vendeu essa “nova obra” para a famigerada Troma, que o relançou com o tal título DEMENTED DEATH FARM MASSACRE… THE MOVIE.

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John Carradine com expressão de felicidade por estar participando desta maravilha

E se não fosse por tudo isso, talvez nunca assitiriamos a esta tralha. Até porque HONEY BRITCHES é uma porcaria de qualquer forma, então só mesmo o nome do Ray e Carradine nos créditos pra me fazer parar e conferir.

A trama é sobre quatro ladrões de jóias da cidade grande, dois casais que acabaram de cometer um roubo e tentam fugir pelas zonas rurais enquanto estão sendo procurados pela polícia local. O carro deles fica sem gasolina, decidem procurar abrigo para se esconder e acabam indo parar na cabana de um velho fazendeiro e sua jovem esposa sexy. Quando um dos ladrões começa a dar em cima da tal esposa, todo o plano para não serem descobertos começa a ruir, acarretando numa onda de violência e morte.

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Um dos grandes problemas que eu tive de cara com HONEY BRITCHES é com o ritmo. O filme é chato e lento pra cacete, apesar da curta duração que não chega a 90 minutos. Logo no início do filme é preciso ter paciência para acompanhar as loooongas e intermináveis cenas dos ladrões de joias andando por florestas… Faz sentido se é o Tarkovski filmando uma de suas obras de arte, mas por aqui… Não sei o que esse Donn Davidson tinha na cabeça. E não acontece muita coisa, afinal, ao longo do filme, mas se você for paciente vai ver uma moça sendo morta à pancadas na cabeça com um jarro, um tridente na garganta de um sujeito e um tiro na testa de outro já perto do fim… Tudo filmado ao melhor estilo Herschell Gordon Lewis: exagerado e com muita tinha vermelha, que parece tudo, menos sangue.

O elenco também não ajuda muito. Um dos ladrões, que tem todo o ar de intelectual, possui um sotaque britânico que é extremamente irritante. Mas é engraçado ver o velho Carradine, quase próximo à morte, sendo a voz incosciênte da narrativa num cenário totalmente fora do contexto do filme. A coisa é tão deslacada que suas cenas parecem filmadas no quintal da casa de Ray. E temos pelo menos Ashley Brookes, que faz a esposa sexy. Não é boa atriz, mas se esforça, além de ser a única que mostra seus atributos numa rápida ceninha.

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Enfim, HONEY BRITCHES é uma picaretagem indicada para fãs hardcore de exploitations setentistas de orçamento risível, apreciadores de Fred Olen Ray e pessoas que possuem um gosto duvidoso, como é o meu caso. Não que eu tenha curtido, mas que tem sua graça justamente por ser tão bagaceiro, ah isso tem…

Outros filmes do Fred comentados aqui no blog:
BIOHAZARD
RESPOSTA ARMADA
HOLLYWOOD CHAINSAW HOOKERS

HOLLYWOOD CHAINSAW HOOKERS (1988)

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Começando as atividades de 2017 com um dos filmes que me fez apaixonar pelo cinema B de uns caras como Jim Wynorski, Fred Olen Ray, Charles Band e outras figuras dessa mesma laia: HOLLYWOOD CHAINSAW HOOKERS, de Fred Olen Ray! Um clássico do cinema exploitation oitentista divertidíssimo, curto e cheio de mulher pelada, filmado em cinco dias com um orçamento abaixo dos 50 mil dólares.

O filme já começa de forma sensacional, com esse aviso:

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Depois, temos a majestosa Michelle Bauer fazendo um strip tease e, totalmente nua, destroça um sujeito com uma motosserra! Os efeitos gore, se é que podemos chamar assim, são tão ridiculamente baratos que não podem ser levados a sério… Aliás, o filme inteiro não deve ser levado assim.

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Na trama, temos Jack Chandler (Jay Richardson), um detetive obviamente inspirado em Raymond Chandler, com direito a narração de Film Noir, cansado do mundo, sem dinheiro, fodido trabalha na procura de uma moça desaparecida, Samantha (a lindeza Linnea Quigley), nos arredores de Los Angeles.

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Enquanto ele segue as pistas da moça, a polícia local vem investigando uma bizarra série de assassinatos cujas vítimas são feitas picadinho por motosserras, como é mostrado na cena de abertura… Entre uma investigação e outra, Jack encontra um paralelo entre os assassinatos com a sua garota desaparecida, o que o leva a Mercedes, a prostituta interpretada por Bauer. Jack arranja um encontro com Mercedes num bar de strip tease e ao mesmo tempo em que investe na prostituta ele vê Samantha girando no palco. Pouco depois desta revelação Jack cai inconsciente por causa de uma droga que Mercedes colocou em sua bebida.

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Jack desperta para encontrar-se numa situação bem bizarra, amarrado e na presença de Mercedes, Samantha e um terceiro sujeito chamado de “The Master” numa espécie de seita misteriosa. E o filme vai ficando cada vez melhor. “The Master” (que é encarnado pelo próprio Leatherface do original O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA, Gunnar Hansen) explica um bocado sobre a as propriedades sagradas da motosserra. WTF!!!

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O lance é que Samantha foi parar nesse culto da motosserra formado por prostitutas e stripers. O tal Mestre explica que a motosserra é a ligação cósmica que une todas as coisas no universo, num culto secreto que se originou há muito tempo no antigo Egito… Naturalmente! haha! Prestes a ser sacrificado e virar picadinho, Jack consegue escapar quando uma das serras fica sem gasolina e foge com Samantha.

De volta a seu escritório, os dois arranjam tempo para um pequeno romance, que serve também para preencher o tempo do filme, que já é breve demais. Logo, Samantha e Jack descobrem a localização secreta do templo cerimonial do culto de motosserra (ajuda muito que haja um cartaz de papelão apontando o caminho) e antes que você perceba, terá testemunhado um duelo de motosserras e o espetáculo cultural que é A Dança Virgem das Serras Elétricas Duplas!!!

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Dá pra perceber que o diretor e roteirista Fred Olen Ray não tem absolutamente nenhuma pretensão com HOLLYWOOD CHAINSAW HOOKERS, a não ser nos divertir com essa historinha besta, uma boa dose de humor pastelão e de um elenco feminino lascivo que não tem receio de mostrar alguns pares de peitos, que é o grande e verdadeiro atrativo do filme. Os fãs das rainhas do VHS, como Michelle Bauer e Linnea Quigley, vão desfrutar bastante disso aqui. Principalmente quando estão com pouca roupa empunhando motosserras… Um fetiche estranho, mas que o filme entrega com perfeição.