THE MATRIX (1999)

Escrevi esse textinho no início do ano passado, em 2019, exatamente vinte anos após o lançamento de THE MATRIX, para o extinto Action News. A minha intenção era rever toda a trilogia, como podem perceber no final do post… Como na época acabei revendo apenas este primeiro, vou republicar aqui no blog pra ver se animo finalmente revisitar os outros dois. Até porque um quarto filme vem aí…

Primeiro, é preciso ter consciência de que já se passaram vinte anos que THE MATRIX foi lançado e se tornou um fenômeno pop cultural, celebrado como um filme inovador em vários aspectos – revolucionário em termos de efeitos especiais e ação, e carregado de filosofia pós-moderna cibernética e blá, blá, blá. Mas e hoje? Como é ver THE MATRIX hoje? Muita coisa mudou de lá pra cá. O mundo vivia às vésperas da virada do milênio, a era da informática se iniciava, tudo o que apresentava em termos de comunicação e internet parecia tão distante da realidade; eu era um adolescente que peguei o VHS numa locadora e assisti, no mínimo, nove vezes antes de devolver rebobinado… Até as diretoras do filme, as irmãs Wachowski, ainda eram chamadas de irmãos Wachowski naquela altura… Sim, muita coisa mudou.

Resolvi encarar o filme de novo. Hoje. E se tem algo que NÃO muda é o fato de THE MATRIX ainda manter sua força em certos quesitos: alguns conceitos premonitórios, o visual cyberpunk que parece uma novela de William Gibson ganhando vida, e o fato de ser um cânone do cinema de ação na virada do século. Não dá pra conversar sobre cinema de ação do período sem que alguém cite Neo (Keanu Reeves) desviando de balas, com a câmera girando em slow motion, que ficou conhecido como “bullet time”, um tipo de cena que foi abusada à exaustão nos anos seguintes, mas que aqui ainda impressionava, era novidade; ou Neo encarando o agente Smith (Hugo Weaving) num metrô abandonado; Salvando Trinity (Carrie-Ann Moss) de um helicóptero em queda; ou enfrentando Morpheus (Laurence Fishburne) num treinamento de Kung Fu (cujo coreografo das cenas de luta foi o lendário Yuen Woo-ping)…

Lembro que na época era um filme considerado difícil de entender entre a molecada que tentava encarar a jornada do hacker Neo com mais prudência, prestando atenção no seu conceito filosófico. E toda a trama que envolve um mundo real e outro virtual, questões de livre arbítrio e identidade do indivíduo, e até um elemento religioso, com a concepção do “escolhido”, que volta para salvar o mundo, bagunçava mesmo a cabeça de um mancebo no final dos anos noventa que mal tinha entrado na internet na vida e só queria ver uns tiros, porrada e bomba. A trama nem era tão original assim, e depois foram se revelando vários filmes anteriores que tinham premissas similares.

É aquilo, THE MATRIX é a definição perfeita do que Hollywood costuma promover como algo “novo”, mas que acaba sempre sendo mais do mesmo… só que diferente.  Quem já tinha assistido na época filmes como EXISTENZ, do Cronenberg, DARK CITY, do Proyas, e O 13º ANDAR não deve ter visto nenhuma novidade por aqui, exceto a ação eletrizante, numa intensidade de encher os olhos, e que realmente tinha uma proposta inventiva. Mas era o tipo de filme que, de certa forma, nos levava a refletir, a fazer as perguntas sobre questões da vida sem conseguir obter respostas muito concretas.

Mas o que realmente encantava e, curiosamente, ainda encanta nessa revisão, é como THE MATRIX é divertido pra cacete! Quero dizer, se tu não tá a fim de ficar esquentando os miolos com os elementos filosóficos, ao menos temos aqui uma história cheia de momentos que te prendem na cadeira sem tirar os olhos da tela. Ou, basicamente, temos Keanu Reeves lutando, correndo, pulando, atirando, etc, por duas horas. “Eu sei kung-fu.” Esse tipo de coisa nunca envelhece. E obviamente é sempre importante destacar os efeitos especiais seminais, que realmente surpreendiam na época. Mesmo que em alguns momentos tenham ficado datados, mas faz parte. Tudo somado, THE MATRIX é um filme de ação sci-fi inteligente, com uma filosofia de boteco que tem seu charme. É frenético, bem dirigido, com momentos e personagens icônicos que ainda fascinam, um visual interessante, enfim, continua incrível.

Depois de THE MATRIX, as Wachowski criaram muito barulho com a expansão do universo do filme. Vieram as animações compiladas em ANIMATRIX e terminou numa das trilogias mais célebres da primeira metade dos anos 2000’s. Para alguns. Extremamente decepcionante para outros… Eu incluso. Até tenho boas memórias de RELOAD. No entanto, REVOLUTIONS era simplesmente intragável. O legal é que quase tudo desse período revelou-se bons filmes em revisões recentes. E é gratificante quando isso acontece, adoro mudar de opinião e descobrir maravilhas de coisas que eu detestava. Por isso vou rever o restante da trilogia. Volto pra falar se melhoraram com o tempo ou se ainda são as porcarias que tenho na memória…

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E termino esse post com essa imagem maravilhosa das filmagens de THE MATRIX 4, que poderiamos ver mais cedo, mas graças à pandemia só será lançado em 2022. A Lana Wachowski parece feliz em dirigir mais um capítulo dessa saga…

IN THE LINE OF DUTY 4 (1989) & TIGER CAGE 2 (1990)

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por GABRIEL LISBOA

Quando me propus a escrever sobre TIGER CAGE 2, imaginei que já havia visto o filme há bastante tempo, que seria bom revê-lo e de quebra ver o primeiro. Como o Luiz Alexandre disse em sua crítica, o segundo talvez seja mais lembrado mesmo entre os fãs do estilo e eu achei que era o que havia gravado com o Nero num DVD há uma década atrás. Mas quando começo a ver o primeiro TIGER CAGE percebo que não era este o filme que conhecia e fiquei perdido. Uma grata surpresa até. O que descobri depois é que Yuen Woo Ping, Donnie Yen e Michael Woods (o diretor e os dois únicos atores recorrentes) realizaram uma espécie de trilogia sem nenhuma relação entre os filmes nos anos de 88, 89 e 90 com TIGER CAGE, IN THE LINE OF DUTY 4 e TIGER CAGE 2 (que do primeiro só leva o nome para a distribuição internacional e tem o título literal de “DIRTY MONEY LAUNDERING). As três histórias, filmadas no auge da era de ouro dos filmes ação de Hong Kong, se situam no mundo caótico da virada dos anos 80 para os 90 de policiais corruptos, lavagem de dinheiro e contrabando de pessoas e drogas, mas o tom dos filmes é bem diferente um do outro.

O primeiro é um filme mais próximo do heroic bloodshed consagrado por John Woo, estilo de tiroteios elaborados, câmera lenta, amizade romantizada, códigos de honra e redenção pelo sangue. É o mais ácido dos três filmes, com um final de encher o coração de raiva até o momento de ver o vilão, interpretado por Simon Yan, levando uma chave de metal de guardar bicicletas no peito e na cara. O filme é bem brutal e até os policiais abusam da violência para conseguir resolver a confusão de traição e corrupção instalada dentro do departamento de narcóticos. Até quando Carol Cheng luta numa fábrica com uma capanga gwailo (expressão para os personagens gringos nos filmes de HK), a cena termina com Carol enforcando a vilã loira com arame enfarpado. Minha cena favorita é com Jacky Cheung e Michael Woods tapando o nariz enquanto lutam para não respirar o gás de cozinha que toma o apartamento de um dos policiais corruptos. Um pouco mais exagerada e cômica que o resto do filme, pode ser vista como um ponto fraco para quem não está acostumado com a mistura de gêneros dos filmes de ação comum no estilo da época e que se acentua bastante nos dois filmes seguintes. Outro coisa interessante é o tema recorrente da fuga de Hong Kong, um desejo dos policiais, bandidos e até do trabalhador Luk de IN THE LINE OF DUTY 4, que tem como bem mais precioso seu visto americano.

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Pelo que eu li no livro de Hammond e Wilkins, Sex and Zen & A Bullet in the Head, isto fato se deve ao medo que muitos tinham da indexação do território de Hong Kong à China Continental, sob regime comunista, marcada para o ano de 1997. Hong Kong era uma ilha de domínio inglês desde o fim da Guerra do Ópio em 1842, com um pacto de controle de 99 anos sobre o território em 1898. Hong Kong depois se expandiu para algumas ilhas vizinhas e um pedaço peninsular se transformando numa das cidades mais importantes para o comércio do Pacífico, sempre a sombra do gigante comunista ao seu lado. Mesmo o acordo firmado em 1984 entre Reino Unido e a República Popular da China, garantindo que Hong Kong se tornaria uma região administrativa especial, mantendo o sistema capitalista, não foi suficiente para que muitos artistas, como produtores e diretores, se acalmassem com a mudança de domínio, ainda mas com o massacre na Praça da Paz Celestial em 1989. Tudo isso acrescentava à temática de tensão e caos presente em alguns filmes de crime do período. Parece pra mim que “contribuição” estrangeira era vista com desconfiança, como se a região estivesse sendo entregue de bandeja para o regime comunista depois de anos de exploração por americanos e ingleses (vide o corpo sobre a bandeira americana no fim de ITLOD 4).

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Voltando aos filmes de Yuen Woo Ping, que dirigiu em 1989 IN THE LINE OF DUTY 4 com parte da equipe do trabalho anterior e que não segue uma narrativa contínua com outros filmes que ganharam o mesmo nome. Os dois primeiros filmes da série na verdade são YES, MADAM e ROYAL WARRIORS, estrelados por Michelle Yeoh. O nome IN THE LINE OF DUTY começa já do número 3 quando o papel que une os filmes, o de uma policial durona passou para Cynthia Khan (a nova aposta da produtora D&B depois que Michelle se casou e abandonou o cinema até seu divórcio e retorno triunfante com SUPERCOP de 93). Na trama do filme Luk (interpretado por Yuen Yat-Choh que lembra o Ken Jeong de SE BEBER NÃO CASE) é um trabalhador nas docas de Seattle e testemunha um crime envolvendo agentes da CIA com tráfico de drogas. Um dos policiais da equipe de Cynthia Khan, trabalhando com os americanos, entrega ao estivador os negativos de fotografias que podem incriminar os envolvidos, mas no meio da confusão Luk acaba perdendo a evidencia. Ele fica então num fogo cruzado entre a polícia, que acha que ele está envolvido no esquema e os bandidos que querem recuperar os negativos. Até a metade do filme é bem interessante acompanhar o personagem de Luk, mas depois ele acaba sumindo e foco fica divido entre Donnie Yen e Cynthia Khan tentando desbaratinar toda a confusão gerada pelo negativo desaparecido e tentando descobrir quem é o agente duplo que está frustrando os planos dos dois para prender os traficantes.

O engraçado é que fica difícil entender qual é o método de procedimento policial que eles usam porque sempre sabem onde os bandidos estão (e vice-versa) e resolvem tudo na porrada. Não que isso seja um defeito é claro é só que eu realmente estava interessado no personagem de Luk, que dava um bom equilíbrio para Donnie e Cynthia, os durões. Eu gosto das situações particulares dos filmes de Hong Kong em que é colocada uma situação dramática ou engraçada, exagerada ou pouco plausível dentro do contexto de um filme teoricamente mais sério de crime. Há uma cena em que Luk pede para que possa ver sua mãe antes de ser extraditado à Inspetora Madam Yeung (Cynthia Khan). Ela aceita o pedido mas chegando ao apartamento da senhora, Donnie (sempre o “babacão” impulsivo nos três filmes) algema Luk à Madam Yeung e os dois têm que fingir que são namorados para não deixar que a mãe saiba que o filho estava sendo preso. Eu leio algumas críticas onde o pessoal fala que esse tipo de cena é besta e que quebra com ritmo de ação frenético dos filmes. Eu mesmo quando mais novo poderia até achar isso também, mas o mais divertido de ver um filme oriental, seja chinês ou japonês é ter contato com uma outra maneira de se contar uma história, ver como outro cinema vê as relações entre os personagens. Mesmo que seja mais sentimentalista. E eu consigo me envolver e abrir um sorriso sincero, talvez por esses momentos serem puros e ingênuos.

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ITLOD 4 é o filme mais redondinho dos três. É um filme de ação mais voltado para as lutas, mas com um tiroteio e um momento cômico aqui e ali. Um filme mais previsível e talvez seja por isso que foi o que eu menos gostei. Mas é o filme que pode facilmente agradar qualquer fã de Jackie Chan já de cara, alguém menos propenso a entrar nos exageros de outros filmes (como GOD OF GAMBLERS, o campeão da mistura de gêneros para mim até hoje). As lutas são muito boas com destaque para a luta de Cynthia Khan e Fairlie Ruth Kordick (atriz gwalio que nem aparece nos créditos) numa escada de concreto e depois num poço de elevador, sempre com o risco de cair e se esborrachar no chão. Para entrar numa lista de melhores confrontos femininos de todos os tempos. Já a luta de Donnie Yen contra Michael Woods neste filme é a mais demorada dentre os três filmes, mas não chegar a ser excelente. Engraçado como me chamou a atenção alguns contornos homoeróticos, com Woods segurando a mão de Yen com seu peitoral ou admirando o bíceps do adversário enquanto este lhe dá um mata-leão. É comum um certo despir de roupas em cenas de lutas em filmes de ação. O protagonista muitas vezes acaba sem camisa, com seu próprio adversário por lhe arrancar a roupa. Algo recorrente mas pouco explorado em termos de erotismo mais óbvio como acontece com beldades de seios fartos. Talvez o ator que mais use isso a seu favor seja o Van Damme que adora aparecer de bunda de fora em seus filmes.

O filme tem um final satisfatório mas o interessante é que uma legenda conta o epilogo da história depois que a luta final termina, um jeito de amarrar as pontas soltas deixadas pelo filme. Algo que o filme seguinte não se preocupa muito. Se IN THE LINE OF DUTY 4 era mais voltado para a correria e pouco desenvolvimento da história, TIGER CAGE 2 volta a centrar mais nos personagens, mas dessa vez sem “maldade” do primeiro, num tom bem cômico e por isso a trama fica em segundo plano. Saem os policiais corruptos mas continua o mote de alguém-certo-na-hora-errada para se livrar tanto da polícia quanto da triade. No filme Rosamund Kwan e Donnie Yen presenciam um confronto entre duas gangues com a tentativa de roubo de uma maleta cheia de dinheiro e depois ainda são suspeitos de um assassinato. O interessante é que a personagem de Kwan, Mandy, é advogada responsável pelo recente divórcio de Donnie, agora um ex-policial mas que mais uma vez interpreta um redimable asshole (aquele personagem ignorante que vai dando valor as pessoas a sua volta até o fim do filme). É de se esperar então que os dois comecem se odiando para depois se apaixonar. Mas no meio dos dois aparece David Wu para transformar a relação num triângulo amoroso. David era responsável pela segurança da maleta e no começa tenta tirar a informação dos dois, que não sabem onde está o dinheiro, para depois se tornar um amigo e se sacrificar pelo casal.

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A cena em que os três estão bêbados e apaixonados num karaokê é de uma breguice sem tamanho mas que para mim funciona. Talvez porque tenho o coração mole para esse tipo de coisa, mas também tenho que dizer que essa relação dos personagens é muito melhor do que qualquer filme do Jackie Chan, que nunca convence numa cena romântica (em Gorgeous talvez?). Não só esses três personagens são bacanas mas ainda temos Cynthia Khan voltando com a Inspetora Yeung em duas pontas breves (eufemismo para personagem aleatório na trama), Gary Chow como o amigo coringa de Donnie e a galeria de vilões composta por Robin “Mortal Kombat” Shou, John Salvitti (voltando também de ITLOD 4) e Michael Woods, todos bem caricatos. Como já havia dito é o mais cômico dos três mas isso não significa pouca pancadaria e violência. Detalhe para a tortura envolvendo uma bicicleta ergométrica raspando o peito de Donnie (a tortura do enforcamento na pedra de gelo de ITLOD 4 também era bem criativa).

As cenas de ação no geral são boas mas a cena de luta mais memorável do filme (e talvez de toda a trilogia) seja a luta de espadas gigantes na fábrica-de-vapor-abandonada entre Donnie e John Salvitti. Não que seja tecnicamente incrível ou muito criativa, mas tem algo em toda aquela fotografia berrante, fumaça, arames, grades e um ventilador aleatório que criam uma áurea mágica de filme de pancadaria de início dos anos 90. Posso dizer que, particularmente, até prefiro o confronto final na fábrica-de-caixas-empilhadas, que começa com Donnie e Tak saindo do maleiro de um ônibus, os dois com uma pistola em cada mão alvejando capangas, até o confronto final de Donnie e Shou. Mais uma vez a luta de Donnie e Michael Woods, que acontece no ínterim dessas duas cenas que comentei agora, mais uma vez não é nada espetacular e me desculpem os fãs, agora posso afirmar que é um ator tão ruim ao ponto de isso atrapalhar a luta em si! Mas Donnie e Michael eram bons amigos e ainda lutaram mais duas vezes no cinema e amizade é o que importa. Como os três filmes são tão diferentes entre si é difícil até fazer um balanço da evolução de Donnie e Yuen Woo Ping no gênero de ação mista de tiros e socos. No fim fica a sensação de como foi mágica essa época de filmes repletos de ação física, trabalhos de dublês impressionantes. Deveria ter visto mais destes filmes em vez de inventar moda e querer alugar O PACIENTE INGLÊS com 15 anos de idade…

Gabriel Lisboa, além de eventualmente colaborar por aqui, edita o excelente blog Cine Bigode.

TIGER CAGE (Dak ging to lung, 1988)

tiger cage Johnny Wang

por LUIZ ALEXANDRE

Yuen Woo Ping é um diretor e coreógrafo de ação com uma carreira de mais de 40 anos. Após ser convidado pelos irmãos Wachoswki para coreografar MATRIX, e embasbacar o mundo com cenas de ação tão elaboradas e criativas (além de fazer o Keanu Reeves parecer o Jet Li), teve sua obra revisitada e introduzida a uma nova geração de cinéfilos. Yuen, que começou a dirigir ainda nos anos 70, trabalhou em muitos clássicos de kung fu old school, tais quais DRUNKEN MASTER (1978), com Jackie Chan, e MAGNIFICENT BUTCHER (1979), com Sammo Hung. Aliando coreografias energéticas, misturando acrobacias e técnicas da ópera chinesa ao kung fu, além de muito bom humor, é de chamar a atenção que TIGER CAGE tenha surgido em sua filmografia, e mais ainda que seja tão pouco comentado*.

tiger cage festa

Na trama, um grupo de policiais (formado pelo astro pop Jackie Cheung, Carol Do Do Cheng, Leung Ka Yan, Ng Man Tat, Simon Yam e um jovem Donnie Yen) está tentando prender um perigoso tríade (Johnny Wang Lung-Wei, vilão clássico da Shaw Bros.), que escapa após uma intensa perseguição. Após a fuga, ele arquiteta sua vingança contra um dos policiais, matando-o. Na busca por capturar o criminoso, um dos membros descobre que alguém de sua equipe está envolvido com tráfico de heroína, o que causará um fatídico racha na relação quase familiar entre eles.

Como dito antes, Yuen ficou conhecido pelas intrincadas coreografias em tramas lúdicas. Entretanto, o que vemos aqui é bem diferente do que ele havia produzido até então. Em vez do humor e leveza, temos uma história policial trágica e sangrenta; em vez de armas improvisadas ou técnicas mágicas, temos revólveres e punhos. Os tiroteios não são estilizados como nos filmes de John Woo, mas são todos muito bem encenados e editados. As cenas de luta são em sua maioria mais secas e sujas que o habitual, mas vale destacar a peleja entre Donnie Yen contra o dublê e amigo Michael Woods, que já nasceu clássica.

tiger cage yen vs woods

Como é um filme com muitos personagens, algo comum no cinema local, o protagonismo do filme fica dividido, mas vale ressaltar o destaque dado a personagem de Do Do Cheng. Em um cinema tão focado em homens, é interessante que Yuen tenha dado a atriz um dos papeis mais importantes e bem desenvolvidos da trama. Ela mesma participa de alguma das perigosas cenas de ação que HK eventualmente colocava seus elencos ao longo daquele período. Ng Man Tat, ator mais conhecido pelas parcerias com o comediante Stephen Chow, mostra aqui um lado mais contido e sério. Jackie Cheung, que ficou mais famoso no ocidente por sua participação no clássico BALA NA CABEÇA (John Woo, 1990), não é nenhum lutador, mas compensa com uma performance intensa tanto no drama quanto nas cenas de ação.

tiger cage dodo e jackie

Com um ritmo acelerado, cenas de ação muito bem encenadas, personagens majoritariamente bem construídos e uma tensão atípica dentro de sua filmografia, é um crime que TIGER CAGE não seja mais lembrado. Definitivamente é um dos melhores filmes policiais chineses produzidos em um período marcado por tantos clássicos.

*Dois anos depois, Yuen lançaria TIGER CAGE 2, uma continuação em nome apenas,
protagonizada por Donnie Yen. Por ser um filme de ação mais direto, focado em boa
parte no virtuosismo físico de Yen, este acaba por ser bem mais lembrado entre os fãs do cinema de ação chinês.