INCUBUS (1966)

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Pouco antes de tentar o papel de Capitão James T. Kirk no seriado STAR TREK, William Shatner fez um filme de horror, digamos, bizarro e pouco visto, chamado INCUBUS.

Foi pouco visto porque o negativo original do filme e quase todas as suas impressões foram misteriosamente perdidas ou destruídas pouco tempo após suas exibições iniciais em festivais de cinema. E Bizarro porque INCUBUS, embora filmado sob o sol da Califórnia, foi gravado em esperanto, que é o idioma artificial mais usado no mundo. Só para constar, o esperanto é uma linguagem criada no final do século XIX por L. L. Zamenof para estimular a paz e o entendimento entre os povos de diferentes nações.

INCUBUS foi escrito e dirigido por Leslie Stevens, um dos principais criadores da série de TV dos anos 60 THE OUTER LIMITS. No Brasil, conhecido como A QUINTA DIMENSÃO. Quando o programa foi cancelado, Stevens procurou uma maneira de se reerguer como diretor e, curiosamente, decidiu que um filme de terror artístico de baixo orçamento, falado num idioma que poucas pessoas entendiam, poderia ser a solução ideal.

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William Shatner, que é o protagonista de INCUBUS, lembra nos comentários do DVD quando se deparou com o roteiro de Stevens:

“(O roteiro) tinha uma dureza, uma simplicidade para tratar sobre o bem e o mal, era ao estilo grego na sua simplicidade e no modo como os acontecimentos caminhavam, no roteiro, para sua conclusão inevitável. Então eu li, liguei para ele (Stevens) rapidamente e disse: ‘Isso é maravilhoso, eu adoraria fazer”.

Neste ponto da carreira, Shatner já havia aparecido em vários papéis em seriados na televisão (incluindo o episódio de THE OUTER LIMITS “Cold Hands, Warm Heart“) e em papéis de secundários em algumas produções gabaritadas, como O JULGAMENTO DE NUREMBERG, de Stanley Kramer, e THE OUTRAGE, de Martin Ritt. Seus únicos trabalhos como protagonista até então fora THE EXPLOSIVE GENERATION, de Buzz Kulik, e o provocador THE INTRUDER, do mestre Roger Corman, que recebeu distribuição muito escassa.

Shatner também já declarou:

“Quando [INCUBUS] me foi apresentado, eu estava de certa forma no auge, pegando bons trabalhos e tendo demandas, e este era um filme pequeno, não era algo que você pode imaginar movimentando a minha carreira, mas era tão intrigante, e eu gostava muito de trabalhar com Leslie Stevens, que eu queria estar nele.”

A trama de INCUBUS se passa numa misteriosa ilha habitada por demônios. Um desses seres malignos, encarnado na figura de uma bela mulher, Kia (Allyson Ames), tenta seduzir Marc (Shatner), um soldado de coração puro e honesto. Inevitavelmente, o demônio apaixona-se por Marc e acaba sucumbindo por ir contra sua natureza, infectada pelo amor e pela bondade. Uma trama simples, mas realmente curiosa.

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Stevens queria “colocar seu filme em um lugar diferente”, então decidiu que os atores deveriam falar em esperanto. O diretor/roteirista imaginava que o idioma era estranho, exótico e arcaico o suficiente para criar um misterioso senso de surrealismo e alteridades, ou seja algo distinto de tudo que já havia sido feito.

Evidente que nem tudo saiu como desejado. INCUBUS estreou no Festival de Cinema de São Francisco em outubro de 1966 e um grupo de esperantistas gritava e rachava o bico em gargalhadas cada vez que os atores interpretavam mal a língua – especialmente Shatner, cujo esperanto foi prejudicado por seu sotaque francês (o sujeito passou grande parte da infância em Montreal).

Obviamente não é só a excentricidade do esperanto que torna o filme especial. INCUBUS é revolucionário em termos de estética e construção do horror, deliciosamente fotografado pelo gênio do preto e branco Conrad Hall e dirigido com maestria por Stevens. Imaginem um roteiro lisérgico de um Jess Franco ou Jean Rollin, mas filmado com o rigor e elegância de um Ingmar Bergman…

Apesar disso, o filme é marcado não apenas por seus valores artísticos, mas principalmente por causa dos estranhos incidentes associados a uma maldição supostamente colocada no filme.

Via IMDB:

Em seu comentário para o DVD, William Shatner lembrou um incidente que ocorreu quando o elenco e a equipe chegaram pela primeira vez em Big Sur, Califórnia. Ele se lembra de um hippie que se aproximou da equipe, indagando qualquer coisa. Shatner diz que o elenco e produção reagiram com certa hostilidade ao seu interesse, o que acabou irritando o sujeito, que em seguida, em voz alta, colocou uma maldição sobre a produção, que algumas pessoas acreditam realmente ter dado certo.

Essa tal de maldição teria sido responsável por uma série de incidentes que ocorreram no período de um ano após a produção do filme. Logo depois da sua versão inicial, limitada, o filme foi considerado perdido depois de ter sido destruído em um incêndio (acidentalmente em um laboratório de filmes francês, ou o próprio Stevens teria mandado destruir as cópias, enfim, nunca foi devidamente esclarecido); Um dos principais atores, Milos Milos, que interpretou o Incubus, matou sua amante, Carolyn Mitchell (curiosamente, a esposa de Mickey Rooney na época) e, em seguida, cometeu suicídio; Enquanto a atriz Ann Atmar, que interpretou a irmã de Shatner no filme também se suicidou.

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Enfim, acontecimentos trágicos à parte, INCUBUS foi recuperado após a morte de Stevens décadas mais tarde, em 1998, à partir de uma única cópia descoberta na França pelo produtor Anthony Taylor, e lançado em vídeo, em grande escala, pela Amazon. Hoje o filme já está remasterizado, tratado quadro a quadro e com legendas em inglês sobrepostas às francesas e disponível para quem quiser conferir.

E pra mostrar que eu sou um cara legal, basta apertar o play no video abaixo e desfrutar de um dos filmes de horror mais impressionantes de todos os tempos:

BIG BAD MAMA (1974)

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Uma daquelas pérolas que os anos 70 nos deu. Estamos no período da depressão americana, temos a Lei Seca, assalto à bancos, tiroteios à rodo com Tommy Gun’s cuspindo fogo e Angie Dickinson peladona! Precisa de mais alguma coisa para BIG BAD MAMA ficar melhor? Ah, claro, a presença hilária de Dick Miller numa produção do grande Roger Corman.

Naquele período, Corman começava a fazer dinheiro com pequenos gangster movies e resolveu apostar na anti-heroína Wilma McClatchie, a tal Big Bad Mama do título, vivida por Dickinson, e suas duas filhas espirituosas e sapecas, que embarcam numa jornada no mundo do crime, no qual estão sempre envolvidas em roubos, sequestros, perseguições, tiroteios, num road movie alucinante de ação e com vários personagens interessantes cruzando o caminho das três protagonistas. Como o ladrão de bancos encarnado por Tom Skerritt, o romântico jogador compulsivo na pele de William Shatner e o policial durão vivido por Miller, com suas expressões impagáveis, definitivamente uma das melhores coisas de BIG BAD MAMA. Sempre que está prestes a concluir sua missão de capturar Big Mama, algo dá errado e suas reações são, no mínimo, de rachar o bico! Não tem como não ser fã desse eterno coadjuvante…

A direção é de Steve Carver, que no ano seguinte fez outro filme ótimo do gênero para Corman: CAPONE, com Ben Gazzara no papel título. Dirigiu depois Chuck Norris pelo menos duas vezes, como o McQUADE – O LOBO SOLITÁTIO, que eu acho um filmaço! BIG BAD MAMA é o seu primeiro longa e já demonstra boa habilidade trabalhando muitas sequências de ação, um senso de humor bem equilibrado, mantendo as coisas num ritmo ágil e divertido… é claro que a pulsão sexual e a quantidade de nudez também ajudam, especialmente com as personagens das filhas (Susan Sennett e Robbie Lee) bem à vontade e Angie Dickinson, nos seus 43 anos, expondo seus atributos de deixar muita mulher de vinte com inveja.

BIG BAD MAMA recebeu o título A MULHER DA METRALHADORA aqui no Brasil e ganhou uma continuação nos anos 80, dirigido por outro pupilo de Corman, Jim Wynorski.