OPERAÇÃO YAKUZA (1974)

O roteiro original de OPERAÇÃO YAKUZA (The Yakuza), de Sydney Pollack, foi escrito por Leonard e Paul Schrader em uma tentativa desesperada de vender algo comercial. Eles estavam falidos e escreveram o roteiro em poucas semanas. Por sua vez, o agente deles conseguiu vender o roteiro, brilhantemente apresentado como uma mistura de O PODEROSO CHEFÃO com Bruce Lee, e os Schraders levaram para casa 300 mil dólares – um recorde de venda de roteiro na época. Robert Towne foi trazido depois só para dar aquela refinada, aquela reescrita marota eficaz com sua voz mais sensível, mas a essência pertence à psique dos Schraders, com um debruce sobre honra errática e disciplina rígida. E que não tem nada a ver nem com O PODEROSO CHEFÃO, muito menos com Bruce Lee…

A trama é centrada, na maior parte do tempo, em Harry Kilmer, interpretado pelo maior de todos, Robert Mitchum, enquanto ele retorna ao Japão para ajudar um velho amigo, George Tanner (Brian Keith), a resgatar sua filha das garras da Yakuza. Eu disse retornar porque Kilmer já tem um histórico no Japão de longa data e muitas pontas soltas para atar… Como, por exemplo, reencontrar a japonesa Eiko Tanaka (Keishi Keiko), que foi o seu grande amor, e encarar seu irmão, Ken Tanaka (o lendário Ken Takakura), que o odeia. Isso leva a uma complexa trama de conflitos internos do personagem de Mitchum, que acrescenta um ingrediente a mais dentro da jornada de violência pelo submundo de Tóquio na qual ele tem que percorrer.

Vários diretores foram cogitados para dirigir OPERAÇÃO YAKUZA e acabaram sendo preteridos ou pulando fora do barco (Frankenheimer, Aldrich, Scorsese), até parar nas mãos de Sydney Pollack, que na época era um dos mais interessantes do cinema americano. Mesmo que pareça uma escolha estranha para este tipo de material, que é um autêntico noir yakuza, um petardo badass, sobretudo depois do sucesso do romance NOSSO AMOR DE ONTEM (1973), com Robert Redford e Barbra Streisand, que o diretor havia lançado um ano antes. Mas Pollack provou que podia transitar perfeitamente entre gêneros e, olhando em retrospecto, é notável como ele contribuiu para definir o modelo de thriller dos anos 70 com filmes como OS TRÊS DIAS DO CONDOR ( 1975). E OPERAÇÃO YAKUZA é um prólogo perfeito para suas habilidades. No entanto, Pollack dizia que não queria fazer um filme de “gênero” do jeito que Schrader imaginou. Por isso a presença de Towne no roteiro, para alinhar as coisas com a visão dramática de Pollack.

E, obviamente, o talento de Pollack para dirigir grandes atores é um diferencial e faz do elenco de OPERAÇÃO YAKUZA um dos destaques. Posso dizer com toda segurança que é uma das grandes atuações de Robert Mitchum. A vulnerabilidade de seu personagem, que tenta posar de durão, raramente foi tão complexa, tão fascinante. Nesse sentido, só deve ficar abaixo de seu desempenho em OS AMIGOS DE EDDIE COYLE, de Peter Yates. Gosto bastante do persoangem de Richard Jordan, um desses rostos frequentes do cinema dos anos 70 que acabou esquecido. Aqui ele faz Dusty, um jovem guarda-costas sensível impressionado pelos códigos de honra japoneses.

Depois há Ken Takakura, uma dos maiores astros do Japão e que mantém sua aura cool intacta durante o filme todo. Não é um personagem que fala muito, mas seu rosto taciturno, de poucas expressões, diz muito mais que palavras. E o homem sabe como manusear uma katana. Juntos, Mitchum e Ken têm uma química que surge do improvável e ganha contornos de tragédia com algumas revelações ao longo da trama. A oferta de Mitchum para o sujeito nos minutos finais do filme é digna de antologia nas carreiras desses dois gigantes do cinema.

Lindamente fotografado por dois diretores de fotografia, Duke Callaghan (nas poucas sequências que se passam nos EUA) e Kozo Okazaki (no restante do filme), OPERAÇÃO YAKUZA também recria fielmente as composições widescreen habituais do cinema japonês. E Pollack aproveita bem tudo que compõe, nos mínimos detalhes, a construção desse universo, seja à nível estético dos ambientes, das ruas, da arquitetura, seja à nível cultural e filosófico. O sujeito tava inspirado por aqui, provavelmente OPERAÇÃO YAKUZA é a melhor produção americana a fazer a ponte EUA-Japão.

Pollack se destaca até mesmo na ação. Temos várias sequências de lutas, tiros, filmadas de forma classuda. A violência é ao mesmo tempo estilizada, mas com um peso dramático realista. Quando alguém é perfurado por uma espada, tremem e murmuram enquanto morrem; conforme membros são cortados, os personagens mostram náusea e repulsa; enquanto as balas voam no caos que é um tiroteio, as pessoas gritam e tropeçam desajeitadamente (é bem provável que Pollack tenha assistido a algum filme de Kinji Fukasaku do período). O confronto final em uma base da yakuza é puro cinema, são quase dez minutos de tensão, com a katana de Takakura fazendo um estrago, enquanto Mitchum distribui bala pra todo lado. Uma das grandes sequências de ação dos anos 70.

Fiquei feliz de saber que o DVD nacional, que foi por onde revi esse filmaço, vem com comentários de Sydney Pollack. Ele demonstra bastante orgulho de OPERAÇÃO YAKUZA e o considera um de seus melhores filmes. Eu não tenho como discordar. É disparado o meu filme favorito do homem.

MAIS FORTE QUE A VINGANÇA (Jeremiah Johnson, 1972)

E continua a onda de westerns de aventura setentistas por aqui. No último post, esqueci de citar o belo MAIS FORTE QUE A VINGANÇA. Então republico aqui o que escrevi há uns três anos no blog antigo.

O que dizem os escritos sobre o verdeiro Jeremiah Johnson, um sujeito que decidiu abdicar-se do mundo civilizado para descobrir os mistérios da vida na natureza, caçando animais e enfrentando índios, frio e solidão, é que acabou se tornando um bárbaro assassino comedor de fígados de peles-vermelhas… Lenda ou não, daria um bom exploitation que explorasse essa característica. Ou, nas mãos de um poeta da violência como Peckinpah, poderia render uma obra, digamos, diferenciada. E, de fato, o diretor de STRAW DOGS realmente foi cotado para dirigir MAIS FORTE QUE A VINGANÇA, cujo roteiro é do grande John Milius e teria Clint Eastwood no papel de Johnson.

Provavelmente por conta do álcool e outros entorpecentes, Bloody Sam acabou de lado – como vários outros projetos que o mestre não conseguiu se firmar – e Sydney Pollack ocupou a cadeira de diretor. Robert Redford, no fim das contas, foi quem encarnou o personagem do título original. O roteiro de Milius se manteve, mas aposto que o filme acabou suavizado… Não que isso seja um problema. MAIS FORTE QUE A VINGANÇA segue outra linha. É uma aventura contemplativa e reflexiva, um belíssimo western histórico que conta com um personagem magnífico, cuja vida retratada aqui, independente do grau de violência mostrada na tela, é simplesmente fascinante.

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Nunca sabemos os motivos que levaram Johnson a abandonar tudo. Sabemos apenas que foi soldado e há indícios de desilusões com o ser humano, mas seu passado é misterioso. Acompanhamos o protagonista a partir do momento que decide encarar a hostilidade da natureza. Mas seus primeiros passos como homem das montanhas não é fácil e é interessante vê-lo passando maus bocados em situações que dialogam com os clássicos embates “homem vs natureza”, na qual diretores como Werner Herzog transformariam em temas fundamentais. Continuar lendo