O SUPER-HOMEM ATÔMICO (1975)

Uma das bobagens mais divertidas que vi nos últimos dias foi esse O SUPER-HOMEM ATÔMICO (The Inframan ou The Super Inframan), uma prova de que nem só os japoneses sabiam fazer Tokusatsus autênticos. A tradição pode até ser dos japoneses, que em meados dos anos 70 estavam fazendo sucesso com esse tipo de material, filmes e seriados de ficção científica povoados por super-heróis, monstros e muitos efeitos especiais, mas os chineses tentaram demonstrar que um estúdio de Hong Kong – no caso deste aqui foi ninguém menos que a rapaziada da Shaw Brothers – também poderia se sair bem… E deu muito certo.

Na trama, a Terra foi invadida por uma variedade de monstros coloridos, liderados por uma tal princesa Elzebub. Essas criaturas podem ter vindo do espaço sideral, mas os cientistas acreditam na possibilidades de serem indivíduos que viveram aqui na Terra mesmo antes da última Idade do Gelo, vinte milhões de anos atrás. Mas isso pouco importa… O que vale mesmo é que os monstros causam o terror por aqui.

Felizmente a Terra não está sem esperança, pois um cientista tem trabalhado por um bom tempo num projeto chamado Inframan, que consiste numa espécie de homem biônico, que terá superpoderes incríveis e será páreo para qualquer monstro. Um dos assistentes do cientista, Rayma (Danny Lee, um dos protagonistas de THE KILLER, do John Woo), é o escolhido para se tornar o Inframan!

Os monstros tentam sabotar o laboratório de qualquer jeito. Sequestraram um dos assistentes do cientista e o transforma em uma espécie de zumbi. Isso dá aos monstros um aliado dentro do próprio laboratório secreto onde está o projeto Inframan. As coisas ficam ainda piores quando a filha do cientista também é sequestrada pelos monstros. E apenas Inframan pode salvá-los.

E aí, O SUPER-HOMEM ATÔMICO é ação praticamente ininterrupta e pancadaria até o fim. E, claro, com direito à muito kung fu, já que estamos num Tokusatsu made in Hong Kong. Há muitos lasers, explosões, perseguições, os monstros podem de repente ficar gigantescos, assim como o Inframan também pode, sem qualquer tipo de satisfação ao espectador. O tipo de filme que possui todos os elementos pra agradar o seu público. O visual dos monstros são bregas, com trajes de borracha, mas adoráveis. Os efeitos especiais são datados, mas são extremamente bem feitos para o período. E os vários cenários onde a trama e as batalhas se passam são perfeitos pro tipo de filme que temos aqui.

O diretor Shan Hua mantém o clima leve e a ação rolando solta. Não é o tipo de obra que faz grandes exigências aos atores, mas dá pra perceber que o elenco pegou o espírito da coisa. A atuação pode não ser sensacional, mas é enérgica. Destaque para um certo coadjuvante chamado Bruce Le (último frame acima), que é um dos principais nomes da Brucesploitation.

O resultado final de O SUPER-HOMEM ATÔMICO é uma mistura fascinante e divertida do espetáculo que a Shaw Brothers sabia proporcionar com a bobagem de filmes de monstros japoneses que fizeram a cabeça da molecada na TV dos anos 70 e 80. Vale uma conferida.

QUATRO FILMES DA SHAW BROS.

TEMPLO DA LOTUS VERMELHA
(Temple of the Red Lotus, 1965)
dir: Hung Hsu Teng

Sinopse: Jimmy Wang Yu interpreta um jovem espadachim que parte numa jornada de vingança, procurando os assassinos de seus pais, e também em busca de uma amiga de infância que foi prometida como sua noiva. Quando ele chega no local, descobre que a família da noiva pode ser um bando de bandidos e começa a investigar a história por trás da rivalidade que eles têm com os monges no Templo da Lótus Vermelha.

Primeiro filme wuxia em cores da Shaw Brothers, meio que inaugura uma era de ouro do cinema de kung fu da produtora, o que por essas razões históricas já seria recomendável pra quem realmente tem interesse a entrar de cabeça nesse cinema e perceber sua evolução.

Porque de resto TEMPLO DA LOTUS VERMELHA não é grandes coisas. O drama é fraco e pesado, tem pouca ação (e quando acontece é rápida, sem muita criatividade, acho que a coisa ainda viria a melhorar nos anos seguintes nesse departamento), a jornada do herói, vivido por Jimmy Wang Yu, soa um bocado enfadonha, sem graça – a longa sequência que ele tem que fugir do castelo com sua companheira, enfrentando irmã, tia, mãe e avó da moça, uma de cada vez, é bem ridícula e me fez soltar altos bocejos…

Mas não deixa de ser legal ver alguns rostos que viriam a fazer sucesso pela Shaw na década seguinte, como Lo Lieh e Tien Feng. Nos créditos ainda aparecem nomes como Liu Chia-Liang e Yuen Woo Ping.

O filme faz parte de uma trilogia, formada por ainda por AS ESPADAS GÊMEAS (65) e A ESPADA E O ALAÚDE (67) que em algum momento vou acabar assistindo. Todos dirigidos por Hung Hsu Teng, mas confesso que depois deste aqui fiquei com preguiça.

THE OATH OF DEATH (1971)
dir: Pao Hsueh-Li

Sinopse: Três heróis tornam-se irmãos de sangue para lutar contra a tirania dos invasores tártaros. Um deles decide se infiltrar entre os inimigos e acaba ganhando uma posição de destaque. Não demora muito, fica evidente que o sujeito gostou da posição de poder e está disposta a sacrificar qualquer coisa e qualquer pessoa para mantê-la, incluindo seus irmãos de sangue.

Um dos filmes mais curiosos que vi da Shaw Bros. Um exemplar de espadachim que se alterna entre uma trama melodramática levada muito a sério e um filme excêntrico de artes marciais, bem puxado para o exploitation, mostrando muito sangue e selvageria, mas também um bocado de sexo e nudez fornecida por Ling Ling uma das estrelas residentes da Shaw.

Pao Hsueh-Li pode até não ser um Chang Cheh – as lutas são filmadas muito de perto, editadas com desleixo em alguns momentos, sem muita preocupação com a coreografia – mas ele se dedica tanto a transformar essas sequências num banho de sangue que fica difícil não elogiar os esforços. E os contextos que as batalhas ocorrem, mais a variedade de armas utilizadas deixa tudo ainda mais divertido. Os trinta segundos finais, um duelo onde um dos personagens centrais tem uma perna decepada por um chicote (!!!) e continua lutando para enfiar o braço no peito adentro de seu adversário é um dos momentos mais insanos que já vi num filme da Shaw… Só não esperem uma abundância de lutas durante o filme, a parte dramática realmente toma um tempo grande de projeção, com situações do tipo “amigo roubando mulher de amigo” e etc… Mas se você entrar na história e chegar inteiro até os minutos finais, não vai se decepcionar.

No elenco, temos Lo Lieh fazendo papel de herói desta vez e o grande Tien Feng. Mas vale reparar na pequena participação de Bolo Yeung como um dos soldados malvados.

THE MAGIC BLADE (1976)
Dir: Chor Yuen

Sinopse: Dois espadachins rivais unem forças para evitar que uma lendária arma mortal, chamada Peacock Dart, caia nas mãos do mestre das artes marciais, Sr. Yu, e de seu malvado submundo do crime.

Esse aqui é daqueles filmes que beira a perfeição. Ti Lung com sua espada giratória é o fodão dos fodões. É o Clint Eastwood do Wuxia, numa jornada de sangue, honra, contra os ardis de uma sociedade secreta, na busca em trazer justiça ao mundo, sem qualquer recompensa de volta. É também uma jornada cheia de MacGuffin’s que o roteiro, um fiapo de história, faz brotar do nada só para fazer a ação continuar surgindo na tela. No caso, a busca pelo tal Peacock Dart, que não pode de jeito nenhum cair nas mãos do velho mestre das artes marciais que comanda uma sociedade de assassinos.

Estamos diante de um filme de espadachim da melhor qualidade possível. E a ação é maravilhosa, tem aos montes, a criatividade do diretor Chor Yuen parece não ter fim na elabroação dessas cenas e na relação que a ação estabelece com os espaços, os mais variados cenários, ambientes e locações, num belo trabalho de manipulação cênica. A sequência final é daquelas que parecem capazes de reproduzir o equilíbrio cósmico do universo!

Lo Lieh, e Lily Li estão no elenco, além de outras figuras… Enfim, pra quem entra na vibe de ver filmes de artes marciais da Shaw Bros. um atrás do outro, como eu tô fazendo neste início de ano, tudo o que pedimos é mais filmes como THE MAGIC BLADE, uma dessas experências raras de imaginação sublime e um senso de aventura fabuloso que já de cara se tornou um dos meus favoritos da Shaw.

EXECUTIONERS FROM SHAOLIN (1977)
Dir: Liu Chia-Liang

Sinopse: Chen Kuan Tai é o protagonista aqui, liderando os sobreviventes do massacre no Templo de Shaolin pelas mãos do sacerdote Pai Mei, encarnado pelo Lo Lieh. O grupo se disfarça numa trupe de artistas de ópera e entre suas viagens, Hung conhece Yung Chun (Lily Li). Os dois se casam e têm um filho, mas Hung acaba sendo morto depois de tentar se vingar do massacre no Templo encarando Pai Mei duas vezes ao longo dos anos. O filho deles, Wen Ding (Wong Yu), une então o kung-fu do Tigre de seu pai com o kung-fu da garça da mãe para enfrentar Pai Mei, que teve seu ponto fraco descoberto por Hung.

Como qualquer filme dirigido pelo grande Liu Chia-Liang, a pancadaria rola pra todo canto. Já começa com uma participação de Gordon Liu, que enfrenta uma vários soldados manchu para dar cobertura para o grupo de Hung. Mesmo cravado de flechas o sujeito dá trabalho. É curioso como tudo por aqui possui um controle sobrenatural das artes marciais: política, religião, família e até o sexo. Logo depois de se casarem, Chen Kuan Tai tem que se esforçar para abrir as pernas de Lily Li… E isso não é numa alegoria, ela literalmente usa técnicas de artes marcias para manter as pernas fechadas e só vai liberar se o marido conseguir “destravar” a moça! haha!

Um dos grandes destaques do filme é Pai Mei, um dos vilões mais desgraçados que Lo Lieh já viveu, com seu ponto fraco que possui relação temporal e muda de lugar no seu corpo à medida em que relógio avança. O cara é quase indestrutível… E ainda tem um lance bizarro dele esconder os testículos contraindo a barriga e prendendo o pé dos adversários entre as pernas! Sensacional! E sim, muita gente vai se lembrar de Pai Mei como o personagem que Quentin Tarantino colocou em Kill Bill para treinar Beatrix Kiddo. Mas quem já tá mais familiarizado com o cinema de kung fu sabe que o personagem existe faz teeempo…

Exibido nos cinemas nacionais como OS CARRASCOS DE SHAOLIN.