ESCALADO PARA MORRER (1975)

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Não sei o que rolou na concepção do roteiro de ESCALADO PARA MORRER (The Eiger Sanction), quarto filme dirigido pelo Clint Eastwood, mas a impressão que dá é que pegaram três histórias diferentes, não conseguiram resolver nenhuma delas, e decidiram transformar tudo em um filme só, colando cada pedaço com fita adesiva… O resultado é uma bagunça, uma salada maluca que mistura ação, espionagem e aventura de alpinismo, com cenários, ritmos e tons completamente diferentes entre si. Se me dissessem que se trata de um roteiro abortado pra um 007 do Roger Moore, eu acreditava… Embora eu saiba que se trata de uma adaptação de uma novela de Rod Whitaker, que também ajudou a escrever o roteiro.

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Não quer dizer também que o filme seja um desastre completo. No meio da bagunça há muita coisa boa em ESCALADO PARA MORRER, um dos filmes mais físicos de Clint, que oferece a si mesmo um papel não muito simpático de um assassino profissional alpinista. Dá a Clint a oportunidade de se colocar em algumas impressionantes sequências de escalada, que são a principal razão do filme existir, é o que une os três blocos que formam a narrativa e que se destacam por sua diversidade e diferentes abordagens estéticas.

Na trama, Clint se passa por um professor de arte chamado Jack Hemlock, viciado em colecionar obras pintadas por grandes mestres da história da arte, mas logo se vê retornando para sua verdadeira vocação de assassino da CIA, hoje aposentado, quando é convencido pelo seu ex-chefe, o Sr. Dragon (Thayer David), um albino que não pode suportar a menor exposição à luz solar e precisa de cuidados médicos diários (típico personagem de um Bond Movie). A missão de Hemlock é matar dois sujeitos que estiveram envolvidos no assassinato de um agente americano, grande amigo de Hemlock, que lhe salvou a vida em uma ocasião. E sua participação na missão é essencial por envolver escaladas de montanhas, algo que o protagonista costumava ser muito hábil. O maior problema, no entanto, é justamente a tal montanha na qual ele deve escalar: a Eiger, de 3.970 metros de altitude, na Suíça, e que Hemlock já havia tentado escalar duas vezes e fracassado em ambas, quase perdendo a vida. Dureza.

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A primeira parte de ESCALADO PARA MORRER adota um visual típico de filme de espionagem (um pouco como em FIREFOX, outro filme que tem elementos do gênero, que Eastwood viria a dirigir nos anos 80). O personagem de Clint vai parar na Europa onde precisa exterminar seu primeiro alvo, um espião do serviço secreto russo. A imagem desse primeiro bloco é fria, acinzentada, bem diferente do cenário do bloco central do filme: Clint vai para o calor do espetacular Monument Valley para entrar em forma e treinar alpinismo ao lado de seu velho amigo George Kennedy (e de uma bela nativa que incentiva o personagem de Clint a continuar seu treinamento de maneira bastante entusiasmante…). E é onde também encara um de seus nêmesis, Miles Mellough, vivido brilhantemente por Jack Cassidy.

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Esse esforço todo é para a missão que acontece no último bloco, quando Clint precisa escalar a perigosa Eiger, nos Alpes suíços, com três outros companheiros, sendo que um deles é o seu alvo. Só que ele não sabe quem deve matar, a informação deverá chegar a qualquer momento durante a subida. Portanto, eles escalam a montanha…

Só que a intriga rapidamente entra em segundo plano. Eastwood parece mais interessado em filmar seus personagens o mais próximo possível dos cenários impressionantes e reais durante o ato de escalar. O próprio Clint não utiliza dublê em boa parte das sequências e podemos ver o sujeito em grandes alturas pendurado por algumas cordas… Funciona. No meio de toda patuscada que é o roteiro, temos um espetáculo de imagens dos Alpes e vários momentos que são verdadeiras aulas de tensão. A cinematografia é ótima, especialmente durante essas sequências climáticas de escalada, que acaba sendo o destaque definitivo do filme. E temos ainda um John Williams arrebentando na trilha sonora, o que deixa tudo ainda mais divertido.

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No geral, o filme não é muito memorável, mas é interessante observar como Clint resolve visualmente essa aventura, mesmo trabalhando com um roteiro tão capenga. As sequências de escalada são certamente algumas das melhores coisas que o suejeito já filmou na vida. Impressionantes para a época e ainda funcionam lindamente hoje. Obviamente as pessoas mais sensíveis às tendências atuais de problematizar qualquer coisa fora do lugar não vão deixar de reclamar de certas posturas machistas do personagem de Clint. Fruto de sua época… Até existe uma certa vulgaridade e cinismo em Hemlock, que é tipo de coisa que deixa tudo mais engraçado… Mas não vou ficar entrando nesse mérito. Realmente não me interessa.

VIAGEM RADIOATIVA (Radioactive Dreams, 1985), de Albert Pyun

Para um diretor considerado um dos piores no ramo da sua geração, até que Albert Pyun se sai muito bem neste seu segundo filme. Pelo menos eu adorei, principalmente pelo tom nostálgico que eu acabo vivenciando quando assisto a essas produções que fizeram um relativo sucesso na era do VHS – embora eu fosse pequeno, com meus sete, oito anos naquela época e teimava em locar as mesmas fitas (A HISTÓRIA SEM FIM e LABIRINTO eram meus recordes de locação), meu pai sempre variava um pouco mais do que eu, por isso eu pude assistir a bastante coisa boa que eu nem me lembro, mas aos poucos vou resgatando.

Não é o caso deste aqui. Só fui assistir pela primeira vez a RADIOACTIVE DREAMS há pouco tempo, mas muita coisa realmente me agradou no filme, exceto, óbvio, a direção de Pyun, que é bem fraquinha. Mas vamos dar um desconto ao rapaz porque o roteiro foi ele quem escreveu a partir de uma idéia extraída de sua própria cabeça e a estória é ótima! Além disso, foi ele quem realizou o meu filme preferido do Van Damme, CYBORG – O DRAGÃO DO FUTURO, isso mesmo, aquele que os personagens têm nomes de marcas de guitarra…

Assim como no filme do Van Damme, RADIOACTIVE DREAMS se passa num período pós-apocalíptico, fruto da Terceira Guerra Mundial. Antes das bombas nucleares começarem a explodir, entretanto, dois garotos são colocados em um abrigo subterrâneo onde passam o tempo lendo livros policiais dos anos 30 e 40. Pyun, já treinando sua astúcia na criação de nomes para personagens, coloca Phillip Chandler (John Stockwell) para um e Marlowe Hammer (Michael Dudikoff!!!) para o outro. Quem conhece o mínimo de novelas policiais dos anos 40, deve ter percebido a esperteza do diretor/roteirista em homenagear os verdadeiros criadores do estilo noir. Após 15 anos vivendo no local, os garotos, agora um pouco mais velhos, conseguem sair do abrigo e se deparam com o mundo em um estado bem interessante…

Cyberpunks antropófagos, motoqueiros, roqueiros, mutantes e um rato monstro gigante, todos bastante hostis, são alguns exemplos de seres que estavam lá fora para receber os dois ingênuos rapazes que praticamente passaram a vida inteira olhando um para cara do outro dentro do abrigo subterrâneo e agora pensam que são dois detetives tentando resolver um caso. E o pior é que acabam entrando numa intriga envolvendo um par de chaves que aciona um míssil poderosíssimo, capaz de devastar toda a raça humana, e todo o tipo de figura estranha pretende colocar as mãos nas tais chaves, não me pergunte o motivo, mas acho que, como dizia o ex-presidente americano George W. Bush, uma única palavra resume a responsabilidade de qualquer governante, e essa palavra é “estar preparado”…

No campo das atuações, temos um Michael Dudikoff irreconhecível, bem diferente dos papeis sérios que encarnou nos filmes de ação que fazia a alegria da moçada. Aqui, o seu Marlowe é um sujeito afetado, age o tempo inteiro como se fosse uma bicha louca em “quarto escuro” de boate gay (não, nunca entrei num lugar assim e nem pretendo, antes que comecem a pensar gracinhas). Seu trabalho seguinte foi exatamente aquele que mudou o rumo de sua carreira: AMERICAN NINJA, grande clássico que também marcou minha infância. Já John Stockwell faz o tipo caladão e mais sóbrio da dupla. Stockwell já tinha um rosto um tanto famoso pela participação em CHRISTINE, do John Carpenter. Voltou a trabalhar com o Pyun em DANGEROUSLY CLOSE, antes de ser escalado em TOP GUN, de Tony Scott. Saiu debaixo dos holofotes, fez algumas pontas e dirigiu algumas coisas, foi ele quem realizou aquela tosqueira filmada aqui no Brasil e causou um rebuliço besta: TURISTAS. Ainda no elenco de RADIOACTIVE DREAMS temos os veteranos George Kennedy e Don Murray.

O roteiro louco que mistura ficção cientifica pós-apocalíptica, elementos do film noir e muita aventura no estilo MAD MAX II e er… BLADE RUNNER, só poderia gerar bons momentos de diversão para toda a família; e até mesmo a direção porca, sem qualquer noção de espaço, a fotografia péssima e a edição ridícula dão ao filme um charme singular, isso sem falar que a trilha sonora é sensacional, escolhida a dedo com várias canções bem datadas dos anos oitenta. Demais! Recomendo ao pessoal de bom gosto que sabe apreciar uma boa e velha tralha!

OBS: Um bom exemplo desse tipo de gente e que adora este filme é o meu amigo Osvaldo Neto, que está de volta, depois de alguns meses parados, ao Vá e Veja, um dos melhores blogs nacionais sobre “cinema de qualidade”! Grande retorno!