THE CAREY TREATMENT (1972)

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Blake Edwards é mais conhecido por suas comédias inventivas dos anos 60 estreladas pelo Peter Sellers, como A PANTERA COR DE ROSA, por exemplo. Portanto, foi uma boa descoberta este filme fora do habitual do diretor, que recebeu o título bizarro no brasil de RECEITA: VIOLÊNCIA. Relevemos e vamos tratá-lo pelo original, THE CAREY TREATMENT. Trata-se de um filme que assume uma relevância social interessante quando visto hoje, usando o tema do aborto como ponto de partida para um thriller, num contexto em que os EUA debatia muito a questão e que hoje ainda é assunto no “Fla x Flu” político brasileiro, como sabemos. O filme retrata a situação da gravidez indesejada que resulta em garotas e mulheres desesperadas subornando pessoas não qualificadas para realizarem abortos clandestinos, como até hoje acontece, e faz ecoar um certo lado sombrio de uma América apodrecida, por mais que as aparências demonstrem o contrário, e evoca memórias perturbadoras de um período particularmente controverso na consciência moral americana.

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James Coburn tem aqui um de seus melhores papéis como o Dr. Peter Carey, um patologista de atitude rebelde, mas estimado profissionalmente, que se muda de LA para Boston para ocupar uma posição de destaque num hospital conceituado da cidade. Carey, esbanjando carisma, não perde tempo em fazer amigos, especialmente com a graciosa nutricionista chefe, interpretada por Jennifer O’Neill. No entanto, o sujeito logo se vê envolvido em uma investigação intrincada quando um colega cirurgião (James Hong) é preso por assassinato após realizar um aborto ilegal na filha de 15 anos do administrador do hospital, vivido por Dan O’Herlihy.

Carey acredita piamente na inocência de seu amigo e decide começar sua própria investigação. O caso logo revela a sordidez que algumas pessoas proeminentes e respeitadas da cidade prefeririam manter escondidas sob as aparências. E Carey se vê correndo certos riscos quando se aproxima mais da verdade por trás da morte da jovem.

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Não há nada particularmente excepcional sobre o roteiro e o andamento da coisa em THE CAREY TREATMENT, exceto o tema espinhoso como pano de fundo. No entanto, tudo funciona tão bem dentro dos moldes de um thriller setentista, tão bem conduzido por Edwards, que vale a pena a conferida. E ainda temos Coburn num momento inspirando com seu personagem fascinante, sempre expressivo, sorridente e cativante por fora, mas internamente nutrindo um constante desprezo e desconfiança por figuras de autoridade. Além de ter uma veia badass: uma simpatia de pessoa, mas caso haja a necessidade, no instante seguinte troca socos com quem estiver em seu caminho.

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De vez em quando o filme exagera um bocado na dose e se esforça para deixar as coisas mais movimentadas sem muita necessidade, já que essencialmente a trama de mistério metódica bastaria. A sequência em que Carey praticamente sequestra uma jovem em seu carro e pisa fundo desafiando a morte para induzi-la a revelar informações, é um desses exemplos. Mas é tudo tão bem concebido que esses exageros nem chegam a ser um problema. THE CAREY TREATMENT continua envolvente e Coburn se beneficia de sua química com a galeria de coadjuvantes interessantes que aparecem por aqui, incluindo O’Herlihy, Pat Hingle e James Hong. Há também a excelente trilha sonora do grande compositor Roy Budd que vale a pena destacar.