DELTA HEAT (1992)

DELTA HEAT era pra ser uma série de televisão que acabou não despertando muito interesse dos produtores. Nem quando ainda estava no papel. Então, o roteiro do piloto foi estendido pra ser se tornar este longa, totalmente esquecido atualmente, mas que vale uma descoberta. Até porque eu não resisto em indicar um filme que é basicamente um buddy cop movie estrelado pelo Anthony Edwards (MIRACLE MILE), com mullets e brinquinho pendurado no formato de algemas, e principalmente o Lance Henriksen (O ALVO), como um ex-policial badass, com um gancho no lugar de uma das mãos.

Situado nos pântanos da Louisiana, em DELTA HEAT temos Mike Bishop (Edwards), um policial de Los Angeles que viaja até o local para descobrir quem matou seu parceiro, também de LA, que estava na cola uns traficantes de drogas. A sequência inicial, que mostra o assassinato do policial é um primor de iluminação, cores, enquadramentos e estilização. E não é a toa. A direção do filme é de Michael Fischa. Falo mais dele a seguir…

O assassinato do policial, aparentemente, tem as características de um chefão do crime local chamado Antoine Forbes. No entanto, o que se sabe é que Forbes morreu em um tiroteio anos atrás. E o mistério paira no ar. E como o departamento de polícia local é pouco cooperativo, Bishop é forçado a pedir a ajuda do ex-policial Jackson Rivers (Henriksen), se ele quiser descobrir o que realmente aconteceu e os responsáveis pela morte de seu parceiro.

Digamos que, apesar da trama parecer simples e genérica, DELTA HEAT não é o filme pra quem se preocupa com a verossimilhança dos procedimentos de investigação e resolução de crimes. E acaba sendo prejudicado por complicar demais em vez de fazer o feijão com o arroz do cinema policial. Mas pra quem não se importa muito com isso, há um outro lado… Todo o trabalho de detetive aqui é apenas um pretexto para explorar essas figuras e esgotar ideias e situações de “peixe fora d’água” desse policial yuppie de LA vagando pelos pântanos da Louisiana, tendo que trocar seu terno limpinho toda vez que se suja nas mais diversas situações.

E nesse sentido, DELTA HEAT é até mais interessante do que um filme policial mais tradicional. Henriksen, em especial, deita e rola com seu personagem, um sujeito fascinante, uma espécie de capitão gancho (que perdeu a sua mão com a bocada de um crocodilo) e que possui traumas por também ter perdido seu parceiro quando era policial. E se a química entre ele e Edwards não chega aos pés de um Mel Gibson e Danny Glover, na maior parte do tempo é eficaz, gera situações divertidas, com um humor que se encaixa estranhamente bem.

O filme também tem seus momentos mais calientes… Betsy Russell, musa dos anos 80 em filmes como PRIVATE SCHOOL, protagoniza algumas ceninhas com um toque especial. Sua personagem é filha do chefão que está supostamente morto, e acaba sendo um elo da investigação de Bishop. Mas o policial acaba tendo outros interesses pela mocinha, se é que me entendem. A sequência que ela o seduz, fazendo uma dança sensual com pouquíssima roupa é um dos destaques. E a cena que ela sai da cama completamente nua e passa pelos detestáveis ​​policiais locais que resolveram invadir o quarto é um dos pontos altos do filme. E ela está maravilhosa!

Sobre o diretor, Michael Fischa é um sujeito que filma bem pra cacete e com parcos recursos. Seu CRACK HOUSE (1989), produzido pela Cannon, é obrigatório. Ele fez também o cult de horror DEATH SPA (1988) e a comédia de horror MINHA MÃE É UM LOBISOMEM (1989). O fato desses filmes e DELTA HEAT não terem conseguido mais sucesso é um tanto lamentável, mas valem para demonstrar o talento do homem, um diretor subestimado, que filmou pouco, mas que merecia ser mais lembrado.

Mas vamos deixar claro por aqui que DELTA HEAT não é um MÁQUINA MORTÍFERA ou 48 HORAS. É apenas um bom filme de ação policial, com boa dose de humor. Um buddy cop movie torto, mas assistível e divertido, uma brincadeira memorável graças, sobretudo, aos dois personagens principais, Edwards e Henriksen, uma relação que por si só faz com que DELTA HEAT mereça sua atenção e que supera o enredo policial bobo e falho para oferecer entretenimento o suficiente para se justificar.

No Brasil chegou a sair em VHS com o título A CAMINHO DO INFERNO.

MIRACLE MILE (1988)

Se você ainda não assistiu a MIRACLE MILE, de Steve De Jarnatt, é provável que tenha, quando for conferir, a mesma reação que eu tive há poucos dias quando assisti pela primeira vez: “por que, raios, eu nunca tinha visto isso antes?!?!“. Me senti a última pessoa do planeta a ter contato com a obra, sobretudo por se tratar de um filmaço, um petardo oitentista incrível, daqueles que não dá para acreditar que não seja mais comentado e celebrado, embora hoje não deixe de ter um certo status cult. Mas, enfim, os filmes estão aí para serem vistos e redescobertos, mesmo que se chegue beeeem atrasado para as atividades.

Desse diretor, Steve De Jarnatt, só conhecia seu filme anterior, CHERRY 2000, e que dedicou praticamente toda a carreira em séries de televisão. No meio disso, De Jarnatt escreveu essa maravilha em forma de pesadelo cinematográfico que pode ser definido como um romance que se desenrola na contagem regressiva para o apocalipse! Na trama, enquanto passeia por um museu em Los Angeles, Harry (Anthony Edwards) e Julie (Mare Winninghan) se cruzam várias vezes, começam a conversar e logo a atração mútua entre os dois corações solitários fica evidente. Tendo combinado um encontro após a meia-noite com Julie, quando termina seu turno de garçonete em um restaurante 24 horas em Miracle Mile, o bairro de Los Angeles, Harry decide tirar uma soneca até dar a hora de sair. Mas seu alarme não toca e ele está super atrasado. Julie já desistiu de esperar e foi para casa. Ele tenta ligar pra ela de uma cabine telefônica fora da lanchonete, mas não tem resposta. Enquanto ele se afasta, o telefone toca e ele volta para atender. Acreditando que Harry seja outra pessoa, a voz de um homem perturbado o informa que ele está em um silo na Dakota do Norte, de onde mísseis nucleares serão lançados em menos de uma hora e que a aniquilação mundial está por vir…

Após essa conversa telefônica, Harry adentra a lanchonete e conta o que acabou de ouvir para os clientes da madrugada e planta uma semente que rapidamente se transforma em um pesadelo. A partir daí, o senso de urgência cresce em MIRACLE MILE num ritmo cada vez maior conforme se desenrola a jornada de Harry contra o tempo para localizar e colocar Julie em segurança, numa sucessão de situações peculiares e personagens duvidosos à espreita nas ruas pela noite de Los Angeles.

Com a tensão crescente, impulsionada pela trilha sonora de Tangerine Dream, MIRACLE MILE é o tipo de filme consegue saltar livremente entre gêneros, explorando o romance, a comédia absurda típica de um John Landis e em especial o horror intrínseco em sua premissa, provavelmente porque nunca deixa de levar o apocalipse a sério e o desastre iminente nos parece muito intimista o tempo todo. Enquanto a maioria dos filmes que gira em torno da aniquilação nuclear parece mais épico e crítico em relação às políticas que permitem que tal possibilidade aconteça, na capacidade da humanidade para a destruição e estupidez em uma escala global, MIRACLE MILE acaba focando mais nas relações pessoais que dão sentido à vida.

Os personagens do filme estão constantemente afirmando a necessidade de encontrar, proteger ou pelo menos se reconciliar com seus entes queridos em face da catástrofe. A própria ideia central do filme é ver Harry arriscando sua vida repetidamente na esperança de se reunir com Julie e salvá-la. Mas se MIRACLE MILE é um filme com coração, também é marcado por explosões de violência e situações pesadas, do tipo que surge da urgência e do desespero. Há uma sequência perturbadora onde, após uma série de contratempos, dois personagens se abraçam e um pergunta ao outro: “este é o seu sangue ou o meu?”, com uma inocência estranha que apenas ressalta a natureza horrível da situação. Os mesmos personagens tentam subir uma escada rolante que está descendo, e essa imagem, a princípio um tanto cômica, é aterradora e parece uma metáfora apropriada para o que as pessoas em Miracle Mile estão fazendo – tentando inutilmente seguir numa direção sem ter a noção de que não vão a lugar algum. Dentro de instantes, tudo pode acabar…

Anthony Edwards e Mare Winningham estão perfeitos, cativantes, tem química na tela e o filme investe o tempo suficiente para estabelecer a trama romântica no início e fazer o espectador ser tomado pelo desejo de vê-los se saindo bem dessa situação, embora o destino conspire implacavelmente para separar os dois. Quase todos os outros personagens da história aparecem apenas brevemente, mas há momentos memoráveis com várias figuras legais que vão surgindo na trama e compondo um bela galeria, como Edward Bunker (o Mister Blue de CÃES DE ALUGUEL), Robert DoQui (o chefe de polícia de ROBOCOP), o veterano John Agar, Mykelti Williamson, que faz um vendedor de toca-fitas roubados que Harry faz amizade, e até o piloto de helicóptero gay vivido pelo grande Brian Thompson, que Harry recruta para levá-lo para fora da cidade, mas apenas com a condição de levar seu namorado junto.

Os momentos finais de MIRACLE MILE são de tirar o fôlego – reconfortantes e dolorosos ao mesmo tempo – e permanece único em sua capacidade de evocar totalmente o terror do apocalipse sem nunca zombar do poder do amor… Filmaço. Saiu em alguma das caixas de Cinema Sci-Fi da Versátil pra quem quiser conferir.

CEMITÉRIO MALDITO 2 (1992)

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Mesmo não tendo o mesmo nível de qualidade do seu antecessor, CEMITÉRIO MALDITO 2 é bem legal, tem muita coisa boa acontecendo para nos entreter. Edward Furlong, o eterno moleque de O EXTERMINADOR DO FUTURO 2, interpreta Jeff, o filho de uma atriz famosa que morre num acidente durante as filmagens de seu mais recente filme de terror. Para recomeçar uma vida nova, Jeff e seu pai, um veterinário vivido por Anthony Edwards, se mudam para a pequena cidade de Ludlow, no Maine, obviamente a mesma do primeiro filme. Não demora muito, Jeff já está interagindo com os habitantes da cidade, levando porrada dos bullies e se torna amigo de Drew, o enteado do xerife local, Gus Gilbert (Clancy Brown). Numa noite, Gus mata o cachorro de Drew e, claro, ele e Jeff vão para o cemitério de animais para enterrá-lo… E o inferno está de volta à cidade.

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Uma coisa que gosto em CEMITÉRIO MALDITO 2 é que não faz questão alguma de ser uma cópia do primeiro filme, que era mais reflexivo, atmosférico e tinha um cuidado a mais com os personagens. A construção de certos indivíduos aqui é unilateral, como o xerife malvado e completamente surtado de Clancy Brown. E as coisas vão acontecendo de forma atropelada, como a transformação do personagem de Furlong, que de uma hora pra outra fica obcecado pela sua mãe morta, sem muito desenvolvimento. Mas ao mesmo tempo, tudo aqui é mais exagerado e sangrento, bem ao estilo do horror noventista, o que garante uma certa dose de diversão ao mesmo tempo que expande de maneira imaginativa e direta a mitologia criada por Stephen King no livro que deu origem ao filme de 89.

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A violência é quase cartunesca, com uma boa dose de sangue sendo jorrada, com algumas perfurações, uma cabeça explodindo, e uma cena sensacional em que Clancy Brown usa o pneu de uma moto contra o rosto de um adolescente. Não dá pra ver muita coisa, mas a ideia e a forma como fazem é muito boa. A maioria das cenas mais sangrentas é de violência animal. Desde o ciclo de filmes canibais italianos que não vejo tanto animal morto na tela… Tudo falso, claro, efeitos especiais de primeira qualidade, mas ainda assim causa uma certa impressão.

A direção é da mesma Mary Lambert que realizou o primeiro filme. Em uma entrevista, ela comenta que resolveu voltar ao universo de CEMITÉRIO MALDITO para entender o que se passa na cabeça de um adolescente, porque eles fazem coisas estúpidas… Louis Creed, no filme anterior, enterra seu filho por causa de um desejo intenso, um sentimento de culpa pela morte do filho, mas e os adolescentes estúpidos de CEMITÉRIO MALDITO 2? O que levam a enterrar uma pessoa no cemitério amaldiçoado sabendo que ela vai voltar à vida?

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Gosto bastante do trabalho de Lambert no primeiro filme, mas não sei se ela conseguiu desenvolver bem suas ideias aqui e a coisa ficou mais puxado no “estilo” do que no “conteúdo”. Mas como disse, é o tipo de filme exagerado que acaba bem sucedido em propiciar uma experiência de terror sem se preocupar com a psicologia das coisas. E que compreende com inteligência o que torna o horror desse universo de Stephen King tão inquietante. Ou, pelo menos é o tipo de produto que não me deixa entediado em momento algum. E temos um elenco muito sólido, Furlong está fazendo o que ele faz de melhor, Jason McGuire é excelente como Drew e Clancy Brown como vilão é definitivamente a melhor coisa do filme… Enfim, é uma continuação sem grandes pretensões mas que de alguma forma consegue me divertir facilmente.