
Já tinha assistido a FORÇA DEMONÍACA (976-Evil) antes, já faz alguns bons anos, e queria ver a continuação, que é dirigido pelo Jim Wynorski. O que pra mim é obrigatório. Nem sei porque ainda não vi. Só que eu não lembrava de quase nada deste primeiro filme. Então, cá estou, resolvi compartilhar essa revisão com meus caros cinco leitores… “Mas que raios de filme é esse?” alguém deve estar se perguntando.
Escrito por Brian Helgeland e Rhet Topham, FORÇA DEMONÍACA deveria gerar algum interesse dos fãs de terror simplesmente porque é a estreia na direção de um certo Robert Englund. Sim, o próprio Freddy Krueger arranjou um tempinho entre as continuações de A HORA DO PESADELO e se meteu atrás das câmeras.


Aparentemente, Robert Englund dirigiu FORÇA DEMONÍACA simplesmente porque queria fazer, foi o filme que surgiu da sua mente. Não tem nenhuma ligação com produtores de A HORA DO PESADELO, não teve nenhum acordo do tipo “aparecer em mais um filme como Freddy Krueger e em troca poder dirigir um filme”… Nada. Englund conhecia os roteiristas, vomitou todas as ideias que tinha e assim foi surgindo FORÇA DEMONÍACA.
No entanto, como não poderia ser diferente, após alguns anos encarnando um dos maiores ícones pop do horror dos anos 80, sua estreia na direção acaba tendo uma dose de influência da série de filmes criada por Wes Craven… A inspiração em A HORA DO PESADELO é bem óbvia.

A história gira em torno de Hoax (Stephen Geoffreys), um tipo nerd, deslocado, que ainda dorme de pijama e não pode comer chocolate no sofá da sala, totalmente dominado por sua mãe fanática religiosa, vivida por Sandy Dennis – Oscar de melhor atriz coadjuvante em 1967 por QUEM TEM MEDO DE VIRGINIA WOOLF?. Além disso, o moleque é impiedosamente intimidado pelos bad boys do ensino médio da escola. A única luz na sua vida é seu primo rebelde Spike (Patrick O’Bryan), uma espécie de James Dean oitentista, que anda pela cidade numa Harley, aumentando suas dívidas nos círculos de poker underground.


Tudo que Hoax quer é ser como seu primo, ou pelo menos tê-lo sempre por perto, lhe protegendo… Depois de se humilhar na frente da namorada de Spike, Suzie (a maravilhosa Lezlie Deane), quando ela descobre que ele roubou suas roupas íntimas, Hoax recorre a uma linha telefônica de auto ajuda chamada Horrorscope, que utiliza o tal 976 do título para fazer as chamadas (nos anos oitenta esse tipo de prefixo “9 alguma coisa” era extremamente popular nos Estados Unidos), para obter algum consolo. Depois de seguir o conselho da misteriosa linha de apoio, o rapaz lentamente começa a se transformar em uma poderosa criatura demoníaca e assim começa sua busca por vingança.




Começando um pouco inseguro de si mesmo, meio sem saber definir o tom, o filme eventualmente se transforma num produto de terror bastante agradável, que se eleva acima do pequeno orçamento e diverte com esse conceito tão batido. Sim, o tema “nerd-on-revenge” já foi feito um milhão de vezes antes e Englund sabe disso, ele apenas quis requentar uma historinha que ainda pode render bons frutos, adicionando temas que até podem soar clichês e derivativos em alguns momentos, mas que possui personalidade, uma visão pessoal de Englund – agora como criador de imagens de horror – e um bocado de humor.
E ele se sai muito bem. De vez em quando dá uma derrapada no ritmo, algo normal para um estreante… Em termos visuais, o sujeito demonstra boa noção de composições, de como trabalhar a câmera, há aquele charme sombrio do horror oitentista marcado por neons que o sujeito explora de forma belíssima. Gosto bastante dos cenários, tudo tem uma qualidade exagerada. E embora não seja um filme muito sangrento, os efeitos especiais de maquiagem do mestre Kevin Yagher são ótimos. A sequência do massacre no cinema, com direito a um bocado de gore, e o final em que a casa de Hoax se transforma na porta de entrada para o inferno, são particularmente especiais.



Tirando esses momentos, não é um filme que há grandes cenas que permanecerão na memória. Como disse antes, eu já tinha apagado da mente 90% do filme… Mas revendo agora é interessante notar uma agradável atmosfera crescente de desconforto à medida que Hoax se torna mais atraído pelo tal serviço telefônico. Nunca é explicado de onde surgiu o número demoníaco, como Spike obteve o cartão, há apenas uma revelação no desfecho, mas que também não diz muita coisa. E em duas ocasiões mostra outras vítimas que acabam tendo um destino cruel por estarem envolvidas com o Horroscope… Há até a presença de um detetive que investiga essas mortes misteriosas ligadas ao serviço, que gera alguns momentos curiosos, mas o que importa mesmo é Hoax e sua jornada diabólica de vingança.

O paralelo com A HORA DO PESADELO torna tudo ainda mais interessante. FORÇA DIABÓLICA é quase um primo distante da franquia de Freddy Krueger, com sequências de terror e clima de pesadelo inspiradas e ambiciosas, cuja produção talvez não tivesse o orçamento suficiente para realizar de forma mais eficiente, mas que vale pelo esforço. Hoax até se transforma, no fim, num monstro brincalhão com unhas afiadas que é impossível não se lembrar de Freddy. Sem contar os temas em comum, sobretudo com A HORA DO PESADELO 2 – A VINGANÇA DE FREDDY, com subtexto gay e tudo, mas neste enredo de possessão satânica juvenil.
O elenco é um destaque à parte. Stephen Geoffreys tá muito bom como Hoax. Um bocado irritante no início, mas funciona. Outro papel famoso de Geoffreys é como o vampiro Evil Ed no clássico do horror oitentista A HORA DO ESPANTO. Depois disso, além de um ou outro trabalho mais conhecido, o sujeito trocou o viés do cinema que vinha fazendo e começou uma carreira longa e bem sucedida como ator de filme pornô gay, usando pseudônimos como Sam Ritter e Stephan Bordeaux. Nunca assisti nada dessa fase, mas fica a dica pra quem tiver interesse…

Sandy Dennis está bem divertida como a mãe de Hoax e rouba a cena quando aparece. Patrick O’Bryan não é lá muito expressivo, mas Englund consegue extrair o suficiente do rapaz. Lezlie Deane tem boa presença na tela; e há um pequeno papel para o grande Robert Picardo que é muito bem-vindo.
Certamente FORÇA DIABÓLICA não está no mesmo nível dos melhores exemplares do horror de baixo orçamento dos anos 80, mas é uma maneira agradável de passar o tempo e mostra que Robert Englund pode se sair quase tão bem atrás da câmera quanto na frente dela. Pena que além deste aqui, ele acabou fazendo só mais um filme, já nos anos 2000… FORÇA DIABÓLICA é um filme meio estranho, muito bobo em alguns momentos, mas não deixa de ser divertido na maior parte do tempo e que de alguma forma consegue ser mais notável e gratificante do que eu lembrava.
E agora sim, posso assistir sem peso na consciência a continuação, 976-EVIL II, lançada no Brasil como PERSEGUIÇÃO DEMONÍACA, de 1991, dirigido pelo grande Jim Wynorski… Até!