
Só tinha assistido AVATAR uma única vez nos cinemas na época do lançamento, no final de 2009. Então, agora que finalmente vamos ter a tão aguardada continuação resolvi rever. Naquela época não saí do cinema com a mesma empolgação de algumas pessoas. Tinha curtido, mas considerei o filme o “menos bom” do Cameron. Como eu adoro tudo que o cara fez, obviamente não queria dizer que eu não tivesse gostado. Ao contrário. Inclusive cheguei a elogiar bem o filme aqui no blog na época (quando ainda atualizava no blogspot e o blog se chamava Dementia 13). Depois da revisão de agora, continuo com a opinião de que se trata do mais “fraco” do diretor (aliás, eu cheguei a revisitar toda a filmografia do Cameron este ano), mas essa revisão de AVATAR só confirma a minha admiração pelo filme. Muito mais que a primeira vez que vi.
Não vou entrar muito na questão técnica “revolucionária” do filme. Quero falar da experiência de rever a obra. Até porquê esse ponto já foi tratado à exaustão na época do lançamento, em como Cameron sempre se propõe a profundas alterações no aspecto técnico da sétima arte, e trabalha quase como um engenheiro desenvolvendo novas tecnologias para poder filmar (motivo pelo qual o segundo filme demorou tanto para ser produzido). Utilizou, portanto, tecnologia de ponta para renderizar esse universo, personagens e imagens num 3D que realmente encheu os olhos lá em 2009… Passado mais de uma década, o legado de AVATAR está aí, para o bem e para o mal, nos efeitos especiais, sobretudo no cinema blockbuster americano. A coisa ficou tão saturada que ver AVATAR pela primeira vez hoje talvez nem tenha tanto impacto de caráter de surpresa e inovação.
No entanto, e mais importante, o filme ainda deve ter impacto de caráter poético visual. Porque, afinal, o mundo criado por Cameron continua um negócio simplesmente espetacular, de uma exuberância quase subversiva. Nesse sentido AVATAR funciona muito até hoje.


Tá tudo tão intacto que até mesmo as ressalvas de 2009 as tenho em alguma medida: os diálogos piegas, o enredo pouco sutil, tudo é mastigadinho e vários personagens são o cúmulo do arquétipo e estereótipo que remete a uma porção de filmes, obras literárias, quadrinhos na qual o protagonista se bandeia para o lado do “selvagem”. Reciclar obras alheias e fazer essa mistura de referências nem é um problema pra mim, mas discorrer tudo isso numa longa e desnecessária duração que não traz nenhuma novidade narrativa também me leva a considerar AVATAR um nível abaixo do restante da filmografia de Cameron…
E, no entanto, tudo isso fica ofuscado pelas qualidades do filme. Foi uma experiência fascinante estar envolvido novamente pela exuberância de AVATAR; em como num nível mais superficial continua sendo uma ótima aventura de ficção realmente empolgante, com momentos de tirar o fôlego; e como ainda fico maravilhado com um cineasta que dirige bem, que tem total domínio do espetáculo, e deposita tanta paixão e energia para a criar esse universo, com esse esplendor visual imponente, para contar essa história com tanto amor… Cameron pode não ser o mais original dos diretores, mas sabe como elaborar um grande evento cinematográfico autoral que não sacrifica o prazer do entretenimento. Vamos torcer para que Cameron não tenha perdido isso…


Alguns momentos continuam notáveis. A batalha final, por exemplo, eu nunca me esqueci, com aquele plano do cavalo em chamas, ou o clímax que rola o confronto entre o coronel Miles Quaritch (Stephen Lang) e Jake (o protagonista do filme, vivido por Sam Worthington). Mas não lembrava como a sequência da destruição da Árvores das Almas é tão poderosa. Um espetáculo visual sem precedentes, com o coronel comandando a destruição em uma das naves, tomando uma caneca de café quentinho, assistindo a gigantesca árvore indo abaixo e uma raça inteira alienígena, os Na’vi, fugindo desesperada. Stephen Lang, aliás, é uma das melhores coisas do filme. Apesar do clichê de militar truculento, é um vilão fantástico, entregando algumas pérolas na sua performance, genuinamente ameaçador.

Sobre alguns temas, a abordagem política do filme é sentida de forma palpável, sem muita sutileza: o retrato sombrio da ganância corporativa; preocupação com a natureza; mostra-nos o homem que procura alargar o seu campo de ação e riqueza, e as catástrofes que daí advêm, já que é incapaz de respeitar os ambientes que o acolhem. Tudo bem óbvio, mas que funciona. Há também uma boa reflexão sobre gameficação. E embora haja um exotismo na representação dos Na’vi que permanece até hoje, acredito que eles possuem mais texturas, com uma cultura e uma ideia real sobre as coisas, que eu já não lembrava. O que deixa tudo mais interessante.
E é um bom presságio para as sequências de AVATAR. Uma expansão de mundo com um senso de detalhes não apenas de quem são os Na’vi, mas de como todo esse ecossistema funciona, sua flora e fauna e a curiosa ciência que governa o planeta Pandora. A obsessão do diretor serve bem à AVATAR; ele tenta expandir tanto esse universo, criando desde um pequeno inseto até o seu aparelho respiratório, que dá até pra ignorar a fórmula genérica e clichê de sua narrativa. Quero dizer, eu consegui ignorar, por isso achei o filme tão fascinante nessa revisão. Mas não tenho dúvidas de que muitas pessoas vão acabar achando AVATAR tão ruim quanto naquela época, ou até pior, numa revisão.


Enfim, essa foi uma maneira – mais longa do que eu tinha planejado – de dizer que estou bastante animado com a sequência, em retornar ao universo tão vívido criado por Cameron, agora em AVATAR: O CAMINHO DA ÁGUA. Recomendo uma revisão deste aqui, caso estejam interessados em ver a continuação e também estavam na mesma situação que eu, que só havia assistido na época do lançamento. Reafirmo que sempre gostei de AVATAR, mas acabei descobrindo um filme bem melhor do que lembrava nessa revisão. Ainda que esteja no final da fila da filmografia do diretor. Tudo bem, o sujeito até hoje não errou e tem várias obras-primas no currículo. Talvez AVATAR: O CAMINHO DA ÁGUA também seja. Vamos descobrir em breve.
Muito bem preciso quanto ao fato de ressaltar que vendo hoje o filme já não causa impacto, tamanha saturação que o trabalho de cgi e captura de movimento se tornou “rotineiro” em Hollywood. Avatar foi um filme de momento, um marco tecnológico apenas, mas não um marco na cultura pop (Cameron precisa aceitar isso). Ninguém lembra de Jake Sully como se lembra de John Wick ou Furiosa.
Entretanto, também não me lembro qual foi a última vez que me impressionei com a textura de pele de algum personagem digital, são tantos que saem todo ano, já não é novidade… a última vez que isso aconteceu foi justamente com os na’vi, quando comprei o filme em blu-ray. E rever o filme nos cinemas em outubro desse ano, em 4k, só reforça isso. E a continuação deve causar esse impacto novamente, espero.
De qualquer forma, verei a sequência no cinema.
Como diz o ditado: “Nunca duvide de James Cameron”.