
Esse era o único filme do dinamarquês Nicholas Winding Refn que me faltava. Resolvi essa questão, assisti finalmente MEDO X (Fear X), primeiro filme de língua inglesa do diretor, um trabalho menos reverenciado do cara, menos até que seus filmes realizados na Dinamarca, PUSHER (96) e BLEEDER (99), mas que, na verdade, trata-se de uma experiência atmosférica e sensorial forte. A gênese do tom e estilo que Refn faz atualmente em filmes como ONLY GOD FORGIVES (13), THE NEON DEMON (16) e na série TOO OLD TO DIE YOUNG (19), com sua câmera onipresente, ritmo moroso, estética carregada e que possui uma performance grandiosa de John Turturro, coisas que transformam isso aqui em algo fascinante.

Ainda não tão hiperestilizado quanto os novos Refn’s, substituindo as paletas de cores vibrantes por corredores sujos e paisagens infernais e sombrias, Refn mal move a câmera em MEDO X, a mantém estática, muitas vezes em ressonância com a imobidlidade de Harry (Turturro), enquanto ele se senta em silêncio avançando pelas fitas VHS de segurança na esperança de encontrar pistas sobre o assassinato de sua esposa.
Uma vez que Turturro se aprofunda no coração do mistério, fazendo check-in em um hotel avermelhado que parece saído de um filme de David Lynch, o clima vai ficando mais pesado, a atmosfera dos quartos e corredores apertados se tornam as paredes da mente de Turturro, onde frequentemente o filme adentra e revela uma bolha vermelha com um rosto protuberante desesperado para escapar, além de manchas e imagens abstratas… Já disse que o filme lembra muito Lynch? O significado desse tipo de coisa eu não sei, mas em conversa com meu amigo Osvaldo Neto, do Cine Poeira, a conclusão é que a intenção é foder com a nossa mente mesmo… E consegue.
É uma pena que na metade de MEDO X o roteiro resolva sugerir algumas exposições. Preferia ficar mais tempo no escuro com o mistério. A primeira metade, onde as coisas não estão muito claras nem para o personagem do Turturro em sua busca, é absolutamente brilhante. Tantas perguntas, tantas cenas arrepiantes sem respostas. O filme não fica ruim, mas assim que a trama deixa a busca de Harry e nos apresenta ao personagem de James Remar, que está ótimo, dá uma quebrada no andamento e ficamos sabendo demais, estamos um passo à frente de Harry e o mistério dá uma diluida.

O filme entra no eixo novamente para um “gran finale“. Mas, claro, ao estilo do Refn, anti-clímax, quebrando qualquer expectativa. Do tipo que te prepara para algo espetacular e te joga um balde de água fria. Para quem já está familiarizado com o cinema de Refn, a coisa pode funcionar melhor. Mas esse final realmente é um ponto bastante discutível entre os detratores do filme. Eu, particularmente, adoro o desfecho e em como isso acentua a lógica do filme ser mais sobre a obsessão do protagonista por resposta do que a resposta em si.
E não vou dizer que MEDO X foi uma bela surpresa, porque eu sempre espero algo de alto nível do diretor, que é dos meus favoritos em atividade. Mesmo num trabalho de início de carreira. E o cara evoluiu bastante de lá pra cá, mas este aqui não deixa de ser um experimento admirável e muito imersivo, um interessante thriller psicológico. Infelizmente, foi um fracasso e levou a produtora de Refn à falência. O sujeito só foi recuperar a grana com o sucesso das duas continuações de PUSHER, que são outras pérolas da filmografia do dinamarquês.