A Versátil vai lançar um box do John Huston em dezembro e, dentre os títulos, o destaque é sem dúvida CIDADE DAS ILUSÕES, um dos melhores filmes do homem. Como sabem, Huston é diretor da era clássica de Hollywood, tinha mais trinta anos de carreira àquela altura. Mas aí veio a Nova Hollywood e suas liberdades, os velhos diretores acoados, e o sujeito me vem com essa PEDRADA que é CIDADE DAS ILUSÕES.
Foi uma espécie de filme redenção para Huston, cujos dois ou três trabalhos anteriores não foram muito bem. Baseado num romance de Leonard Gardner (que também escreveu o roteiro), o filme segue Stacy Keach como Billy Tully, um lutador de boxe que nunca viu o sucesso e vive na miséria. Quando Billy faz uma rara visita à academia, ele conhece Ernie (Jeff Bridges), a quem Billy vê algum potencial no boxe e sugere que vá ver seu antigo treinador, Ruben (Nicholas Colasanto). Ernie acaba indo e logo se vê trinando sob a batuta de Ruben, enquanto a vida de Billy se deteriora ainda mais. Especialmente quando começa um caso com uma alcoólatra chamada Oma (Susan Tyrell, indicada ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por este filme).
Ao mesmo tempo em que Ernie começa sua carreira de lutador, ele também enfrenta problemas quando engravida sua namorada e logo deixa para trás o mundo do boxe. Quando Ernie e Billy se reencontram numa jornada de trabalho pesado no campo, ambos se inspiram para voltar ao ringue. No entanto, para quem supõe que os personagens de Bridges e Keach conseguem superar as dificuldades e enxergam alguma esperança no horizonte através do esporte, num tipo de clímax vitorioso nos ringues de boxe, bom, a coisa não vai muito por esse caminho. Isso porque CIDADE DAS ILUSÕES não é lá um “filme de boxe” (apesar do próprio Huston ter sido boxeador na juventude). É um filme sobre pessoas fodidas na vida. É um retrato amargo sobre perdedores, que por mais que tenham sonhos e ambição, são fodidos demais para alcançar seja lá quais forem seus objetivos… Ao invés do sucesso, a frustração inevitável de indivíduos que povoam quartos sujos de hotéis baratos, bares decadentes e academias de ginásticas de periferia.
As coisas até parecem começar a dar certo para Billy no terceiro ato do filme, quando finalmente se livra da amante e vence sua luta de “retorno”. Mas logo depois se autodestrói, rastejando de volta à primeira garrafa que vê pela frente. Não há redenção em CIDADE DAS ILUSÕES. Billy termina o filme exatamente como havia iniciado e, embora não conheçamos o seu futuro, parece ser totalmente insignificante… Mas o filme também não fica fazendo julgamentos moralistas pra cima dos personagens. Huston os trata como seres humanos enquanto sua câmera documenta os destroços que são suas almas nessa vida de desolação.
Huston era um mestre de marca maior, um contador de histórias fenomenal. E aqui está no auge, mesmo num trabalho aparentemente mais discreto, “menor”, que estuda os pequenos detalhes, mas que é ao mesmo tempo uma obra poderosa e sensível, iluminada pela condução de Huston e pelas performances maravilhosas de Keach e Bridges. A fotografia magistral de Conrad Hall também é outro destaque. Prova que ele podia filmar bares e academias com tanta habilidade que quase dá para sentir o cheiro de cigarro, cerveja e suor.
Para John Huston, CIDADE DAS ILUSÕES foi um retorno bem-sucedido, um sucesso de crítica e financeiro. E o velho ainda tinha talento de sobra para gastar mesmo depois de todas as transformações que o cinema americano sofreu no período. Enfim, aqueles que esperam um filme esportivo inspirador podem ficar desapontados, mas pra quem curte estudos de personagens, CIDADE DAS ILUSÕES é uma pequena obra-prima. E só por esse título já tá valendo a caixa que a Versátil vai lançar.
Eu assisti esse filme quando foi exibido na TV Aberta ha alguns anos na Sessão Fim de Noite no SBT é um bom drama dirigido magistralmente por John Huston é um grande diretor que nunca fez um filme ruim na vida …. e ainda tem diretores dirigindo filmes ruins atualmente vendendo gato por lebre .. mas isso já é outra historia.