Revisão do primeiro trabalho do maestro italiano do horror, Dario Argento, como diretor. É também seu primeiro giallo, sub-gênero que o consagrou. Claro, Argento não inventou o giallo, mas é um dos maiores responsáveis, junto com Mario Bava e Sergio Martino, pela sua sofisticação estética e fundamentação de seus conceitos. Mas O PÁSSARO DE PLUMAS DE CRISTAL ainda é o começo de tudo para Argento, sem o abuso de suas composições simétricas, cenários estilizados e exuberância de cores, mas fica evidente que o sujeito já sabia muito bem o que fazer com os elementos estéticos do gênero e com formulações importantes dos gialli, como a ideia do “investigador casual”, geralmente alguém ligado às artes ou um jornalista, que pode ou não ter testemunhado os crimes cometidos pelo assassino da trama, e passa a investigar o caso. Na verdade, para quem conhece alguma coisa do Argento, é legal perceber como ele já mantinha algumas obsessões atrás das câmeras, a começar pelo assassinato brutal de mulheres, indo por detalhes da cena do crime vistos pelo olho humano, mas enganados pela memória, os traumas do passado reverberando no presente, a busca obsessiva e, consequentemente, a falsa revelação da verdade…
Em O PÁSSARO DE PLUMAS DE CRISTAL, Sam (Tony Musante) é um escritor americano que vive em Roma. Certa noite, a caminho de casa depois de socializar com um amigo, e completamente por acaso, acaba testemunhando uma tentativa de homicídio envolvendo a bela esposa de um dono de uma galeria de arte.
Sam não consegue entrar no local para salvá-la, pois fica preso entre um conjunto de portas de vidro. Tudo o que o sujeito consegue é observar a mulher em agonia com o bucho perfurado por uma faca e esperar que alguém chame a polícia a tempo de salvá-la. A sequência é uma das mais inspiradas do filme, um trabalho de tensão e suspensão temporal – segundos que parecem horas – realizado com maestria.
Depois, Sam descobre que a mulher sobreviveu, e a polícia lhe diz que ela é apenas mais uma das poucas vítimas recentes de um serial killer que está operando na área. O assassino, um homem vestido com uma capa de chuva preta e, claro, um par de luvas de couro preto, sempre consegue escapulir antes que os policiais possam ser chamados e, para desgosto de Sam, continua à solta.
A força policial de Roma, liderada pelo inspetor Morosini (Enrico Maria Salerno), tem boas intenções, mas não consegue apresentar pistas sólidas sobre o caso. Isso inspira Sam, que teve seu passaporte confiscado pela polícia até que estejam cem por cento positivos de que ele não tem nada a ver com os assassinatos, a fazer um pequeno trabalho de detetive por conta própria. Ele espera poder limpar seu nome e levar o assassino à justiça, matando dois coelhos com uma cajadada só.
O protagonista logo começa uma busca pela verdade. E é por isso que o um dos principais conceitos do giallo é essa lógica do “investigador casual”. Esqueçam um bocado os elementos estéticos, que obviamente estão lá (as luvas pretas e as facas reluzentes), mas que as pessoas geralmente usam como definição do gênero. Lembremos que para Argento a genialidade do giallo está exatamente nesse ponto: na ambiguidade que surge nessa quebra de uma tradição cinematográfica no qual a figura do policial faz apenas seu trabalho, enquanto a “testemunha casual”, geralmente um artista, se sente mais compelido a ir atrás da verdade, que no fim das contas é a função do artista, seja lá por qual meio artístico ele se expresse, que é investigar verdades que sirva para si e para o seu público. É o que faz o artista no giallo desbravar e arriscar, tentando resolver o mistério.
Enquanto alguns de seus filmes posteriores são peças sublimes do horror surreal e bizarro, O PÁSSARO DE PLUMAS DE CRISTAL é um mistério de assassinato mais direto e, digamos, “realista”, que faz um bom ponto de partida para aqueles que não estão familiarizados com o trabalho de Argento ou até mesmo com o gênero. E fiquei impressionado até como o filme é bem mais intenso do que eu lembrava, com um estado de suspense que se mantem quase durante toda a narrativa. O filme ainda não possui muito do visual extravagante, como já disse antes, a exemplo de outros trabalhos de Argento, como SUSPIRIA e INFERNO, mas a cinematografia daqui é do grande Vittorio Storaro e tem muito estilo, o filme todo é lindamente fotografado, com muitos movimentos de câmera fluidos, então não deixa de ter momentos de deslumbre estético, que no fim das contas também faz parte da essência do giallo.
Há uma cena incrível, e particularmente sádica, em que a câmera assume o ponto de vista de uma das vítimas, acompanhando seu olhar, seus gestos, para revelar a figura do assassino imponente na porta de um quarto pronto para fazer mais um estrago. Não há aqui nenhuma grandiosa cenas de morte, como depois viriam as sequências operísticas de PROFONDO ROSSO, SUSPIRIA e TENEBRE, entre tantos mais. Ainda assim, o suspense é muito bem desenvolvido, a música de Ennio Morricone pontua com precisão, e soluções visuais discretas como essa citada são desses pequenos momentos de inventividade que Argento andava a experimentar e aqui já é digno de nota.
O filme é a primeira parte de uma espécie de “trilogia dos animais” que marcou o início de carreira de Argento, formado ainda por O GATO DE NOVE CAUDAS e 4 MOSCAS NO VELUDO CINZA, que já comentei por aqui há alguns bons anos. Adoro os três filmes, mas fica claro pra mim o critério de, não sei se “aprendizado” seria a palavra ideal, mas funcionam bem como rascunhos das obras geniais que Argento viria a fazer alguns anos depois e que já citei durante o texto. Mas é o belo início de carreira de um dos maiores nomes do cinema mundial.
Esse filme é muito bom quando Dario Argento realmente era mestre do terror ,hoje em dia já não mais seus filmes são fracos comparados com esse e outros que ele viria á realizar ,eu tinha essa filme em VHS pela Poletel ,mas infelizmente perdi ele por aí em alguma arrumação aqui em minha residencia ,acho que esse filme saiu em DVD pela Continental Home Vídeo em Box -Dvd como os três filmes.