Já tinha visto QUANDO VOAM AS CEGONHAS no DVD que a Continental lançou na década passada. Não lembro direito da qualidade dessa versão – como sabemos qualidade nunca foi o forte dessa pífia distribuidora – mesmo assim, lembro de ficar extremamente impressionado com as imagens que o diretor Mikhail Kalatozov e o seu fotógrafo, Sergey Urusevsky, conceberam. Um deslumbrante exercício estético em preto e branco de encher os olhos. Toda essa impressão se confirmou agora com a revisão do filme lançado em DVD, com imagem restaurada, pela CPC UMES FILMES, na sua incrível série Cinema Soviético.
QUANDO VOAM AS CEGONHAS foi a coroação do cinema soviético no período e um dos melhores filmes anti-guerra já feitos. Trata-se de uma experiência emocionalmente devastadora, contando a história de amor envolvendo o jovem Boris, que se une ao exército soviético num rompante de patriotismo, deixando para trás a sua bela namorada Veronika. O filme detalha minuciosamente a maneira como a guerra separa os dois pombinhos, tornando-se um dos primeiros filmes soviéticos a realmente lidar com os efeitos negativos da Segunda Guerra Mundial.
Dois pontos chamam a atenção em QUANDO VOAM AS CEGONHAS. Primeiro, o coração do filme é Tatiana Samoylova, que dá vida à Veronika, numa atuação hipnotizante e emocionalmente forte. Uma das grandes performances do período. Sobrinha-neta do famoso e influente ator e professor de teatro Constantin Stanislavski, cujo método de atuação inspirou dezenas de grandes atores como Marlon Brando, Jack Nicholson, Paul Newman e muitos outros, é bem provável que Samoylova tenha usado seus ensinamentos. Demonstrando grande talento e uma beleza ímpar, foi convidada para trabalhar em Hollywood e em outros lugares fora da União Soviética depois de QUANDO VOAM AS CEGONHAS, mas foi forçada a recusar essas ofertas por conta da situação política daquele contexto. Infelizmente, seu único outro grande papel foi na aclamada adaptação soviética de 1967 de Anna Karenina.
Outro ponto marcante de QUANDO VOAM AS CEGONHAS é o visual impactante, que já mencionei, o deslumbre das imagens, um trabalho extremamente ousado e inventivo em termos de direção e cinematografia, com uso de câmeras na mão, composições viscerais e utilização dos espaços e profundidade de campo. É dessas obras reveladoras sobre como as possibilidades ilimitadas no manuseio de uma câmera, da edição, da luz e sombras, essa matéria prima que chamamos de CINEMA, têm a capacidade de transcender a própria natureza do filme…
Não existe um plano sequer em QUANDO VOAM AS CEGONHAS que seja imperfeito ou desnecessário. Há uma sequência, no entanto, que é uma das minhas favoritas, quando Veronika corre em direção à uma estação de trem e Kalatosov faz desse simples ato um dos momentos mais imaginativos do filme, com uma câmera chacoalhando, um trabalho de câmera genial que cria um efeito ofegante, permitindo que nos sintamos exatamente como Veronika se sente. É simplesmente absurdo.
Não é toa que digo que foi a coroação do cinema soviético. QUANDO VOAM AS CEGONHAS recebeu a Palma de Ouro no festiva de Cannes, em 1958, desbancando filmes como MEU TIO, de Jacques Tati, e NO LIMIAR DA VIDA, de Ingmar Bergman. E apesar de não ter vencido como melhor atriz, Samoylova recebeu uma menção especial por sua atuação.
Kalatosov também é conhecido por outra obra deslumbrante chamada EU SOU CUBA, um filme todo encadeado com alguns dos mais belos planos da história do cinema. Também foi lançado aqui no Brasil numa edição vagabunda pela Continental. Nada que a CPC UMES FILMES não possa consertar com uma edição caprichada, da mesma forma que temos agora esta de QUANDO VOAM AS CEGONHAS, uma obra-prima do cinema soviético indispensável a qualquer indivíduo interessado por cinema de verdade.
O filme pode ser encontrando na loja virtual da distribuidora e em várias lojas do gênero e livrarias. E não deixe de curtir a página da CPC UMES FILMES no Facebook para ficar sabendo das novidades, especialmente do cinema soviético, e os seus próximos lançamentos em DVD e no cinema.
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Eu assisti esse filme na sessão de filmes legendados da TV Globo “Cine Clube” nos anos 80 ,tambem passou outro clássico soviético “A Balada do Soldado ” gosto tanto desse filme que aluguei ele e assisti em VHS pela Globo Vídeo e depois comprei o DVD dele lançado pela á famigerada Continental ,alias ! eu tenho alguns filmes desse empresa duvidosa e á maioria nem gira no meu aparelho de DVD.. voltando ao filme ,eu recentemente comprei esse lançamento da CPC Filmes na Livraria Cultura e vou assisti-lo em breve ,á fotografia dele e muito boa ,enredo te prende do começo ao fim .. o que mais dizer você já o detalhou muito bem e espero que á CPC Filmes lance mais filmes da Mosfilm . Um abraço de Anselmo Luiz.