São raros agora, mas ainda bem que temos, atualmente, um James Gray fazendo filmes que nos despertam tanto prazer e encantamento por suas obras. Gray, Michael Mann, Johnnie To… Brisseau, Verhoeven, De Palma e Miller, quando conseguem filmar… David Lynch com essa nova temporada de TWIN PEAKS. Enfim, o número de diretores que ainda me causam um fascínio puro são poucos nos nossos dias. Poderia citar alguns outros, mas não me ocorre agora. Quero falar do Gray e seu novo trabalho, THE LOST CITY OF Z, que me arrebatou essa semana.
Gray faz filmes que são considerados regressões, clássicos, anacrônicos… Adjetivos que no fim das contas o torna um dos mais modernos diretores da atualidade. Mas é também parte da razão pela qual ele ainda não teve um verdadeiro sucesso com o grande público mesmo trabalhando com gêneros populares, como o crime movie, o policial e agora com aventura em THE LOST CITY OF Z.
O que é uma pena… A cada filme eu fico impressionado com a habilidade de Gray em contar histórias moralmente complexas com uma verdadeira sensação de beleza cinematográfica, e, ao lado de Mann, se tornou um dos meus cineastas favoritos nos últimos 20 anos em solo americano. Estreou com uma obra-prima, LITTLE ODESSA (94) e já emendou a porrada que é THE YARDS, tragicamente subestimado, e alguns anos mais tarde, o policial dos anos 80 WE OWN THE NIGHT, que é o meu favorito do homem e um dos melhores filmes da década passada (só perde pra MIAMI VICE e talvez pro MARCAS DA VIOLÊNCIA). Depois continuou no mesmo nível com os belíssimos AMANTES e A IMIGRANTE. Mas, com THE LOST CITY OF Z, Gray sai um bocado da sua zona de conforto, da sua Nova York, e cria uma história assombrosa de aventura, família e loucura potencial. Dificilmente eu vou assistir a um filme tão grandioso este ano…
Charlie Hunnam talvez não seja o melhor ator do momento, mas até que Gray extrai dele uma ótima presença. O sujeito vive Percy Fawcett, um oficial de artilharia britânica, do início dos anos 1900, que foi recrutado pela Royal Geographical Society para explorar a Amazônia, a fim de criar um mapa que estabelecesse a fronteira entre o Brasil e a Bolívia. Uma vez lá, o sujeito fica obcecado por encontrar uma cidade antiga que lhe foi descrita por tribos indígenas locais, que mais tarde seria conhecida como El Dorado. Com o interesse pessoal e o forte apoio de sua esposa, maravilhosamente desempenhada por Sienna Miller, Fawcett retornaria à selva em sete ocasiões distintas (o filme se condensa a três), e nunca mais voltaria para casa depois da última jornada.
Esses eventos foram relatados no livro The Lost City of Z pelo jornalista David Grann, e Gray, ao adaptar o material para a tela, recria uma aventura aos moldes dos antigos clássicos de aventura de um John huston, David Lean, mas com tons de Herzog de AGUIRRE e FITZCARRALDO. A fotografia é inegavelmente surpreendente. Filmado em 35mm, num widescreen 2,35: 1, pelo diretor de fotografia Darius Khondji, em nova perceria com Gray após A IMIGRANTE, LOST CITY OF Z possui uma gloriosa riqueza visual em cada imagem, cada frame que me deixou maravilhado em vários momentos. A luz natural da selva é capturada de forma graciosa e as sequências passadas na Europa é de uma exuberância sem igual, como por exemplo a cena da última despedida de Fawcett de sua família rumo a sua jornada final. Ninguém filma o céu como Gray no cinema atual.
O elenco de apoio inclui várias excelentes performances, como a de Robert Pattinson, Tom Holland (o novo Homem-Aranha), o grande Angus MacFadyen, que há muito tempo não era bem aproveitado, Ian McDiarmid, além da pequena participação de Franco Nero, que me fez sorrir por um bom tempo durante o filme.
LOST CITY OF Z tem duas horas e vinte minutos de projeção, mas se Gray quisesse alongar o filme por mais umas duas horas eu continuaria sem piscar, só admirando as suas imagens. É curioso pensar que, apesar da aparência de super-produção, o filme teve contribuição financeira através de vários investidores independentes, com a Amazon Studios fazendo um lançamento discreto nos cinemas no mês de abril. Num mundo justo, teria sido lançado em período de premiações e receberia várias indicações. O que não faria diferença alguma. O mundo sendo justo ou não, já temos o nosso melhor filme de 2017.
Estava com a expectativa nas alturas com esse filme por causa de Two Lovers, We Own the Night e principalmente por The Immigrant que é meu favorito de Gray e talvez um dos meus filmes favoritos de todos os tempos. Me decepcionei, estava esperando aquelas imprevisíveis e arrebatadoras redenções de personagens improváveis. Nesse sentido acho que o filme peca em não dar mais espaço para o personagem do Pattinson.
Mas forçando eu daria umas 3 estrelas.
Perrone, desses cineastas atuais ja conferiu alguma coisa do italiano Paolo Sorrentino?
Não sei se é diferente do que você assiste, mas é diferente daquilo que você geralmente comenta aqui no blog. Tenho dedicado meu tempo a filmografia do cara e recomendo fortemente.
Mas é curioso porque, tirando A Imigrante, não é muito comum os filmes do Gray o lance da redenção arrebatadora, e mesmo quando acontece já é tarde demais e não preenche o vazio de seus personagens, como o Phoenix de We Own The Night ou o Roth em Little Odessa… Mas entendo o quer dizer.
Sobre o Sorrentino eu curto algumas coisas, especialmente os primeiros filmes, mas não é um diretor que me encanta…
Little Odessa ainda não vi, mas em We Own The Night eu considero um final feliz ele se endireitar na vida e virar policial ao lado do irmão como o pai dele sempre quis, imagino/interpreto eu.
Sobre Sorrentino ainda só vi os mais recentes, mas verei os primeiros.
Mas nesse processo de se “endireitar” e virar policial, ele acabou perdendo o pai e a mulher, as duas pessoas que ele mais amava… Não consigo ver isso como final feliz…rs O plano final, com ele procurando a mulher na plateia, Jesus, aquilo ali é de cortar o coração. hehe
Assim como o final de The Immigrant é de partir MAIS AINDA o coração ele perdendo ela, se entregando a policia e o que é pior de tudo: sentindo o peso das coisas erradas que ele fez com ela. Mas essa virada que o personagem da é o que importa, é a Redenção necessária. O resto é bobagem.
Perrone, quando eu vi a segunda imagem do post, a da selva, eu pensei: “apesar de “nebulosa”, ficou tão boa quanto um 35mm”. Depois você escreve que foi filmado em 35mm, deu ainda mais vontade de ver o filme.
A imagem desse filme é impecável!