Vi outro Raoul Walsh por esses dias, HIGH SIERRA, um filmaço com elementos noir e estrelado pelo Humphrey Bogart, talvez o maior ator que o gênero já teve. Cínico como sempre, mas fazendo um anti-herói, um habilidoso ladrão ao invés do habitual detetive que o consagrou em filmes como O FALCÃO MALTÊS e À BEIRA DO ABISMO, impressiona muito seu desempenho por aqui, na pele de Roy “Mad Dog” Earle. E, convenhamos, companhar um Bogart inspirado torna qualquer filme uma experiência única.
A trama de HIGH SIERRA começa quando Earle sai da cadeia e já tenta emendar um novo golpe: um assalto a um hotel cheio de milionários. Contando com a ajuda de dois cúmplices inexperientes e uma dançarina que se apaixona por ele (Ida Lupino), Earle aguarda instruções em uma cabana nas montanhas, planejando se endireitar após este último assalto. É interessante olhar para Earle, perceber a sua complexidade e peculiaridades. Apesar da “profissão”, o sujeito não é um mal intencionado – embora utilize violência quando precisa. O passado sugere que Earle seja vítima do sistema e por isso se vê obrigado a ajudar uma família que passa necessidades, após perder tudo e tentar a sorte na cidade grande. Um reflexo da própria vida do protagonista, uma maneira de se reconectar com o que realmente gostaria de ser. O filme é sobre Earle tentando aceitar sua identidade, aceitar o fato de que é um bandido e tentar mudar isso é impossível.
E HIGH SIERRA é todo Bogart, num desempenho do mais alto nível do ator. Curioso foi descobrir que o filme não foi pensado pra ele. Paul Muni, o Scarface original, era a primeira escolha, mas na época vinha perdendo interesse em fazer filmes de gangster e acabou rejeitando o papel. Enquanto isso, Bogart ficava mandando telegramas à Jack Warner implorando para fazer o personagem central de HIGH SIERRA. O que à principio não adiantou muito. A segunda alternativa era George Raft, que estava em alta na época, mas também não ficou muito empolgado e recusou participar. Bogart acabou ganhando o papel contanto que parasse de encher o saco. Viva os telegramas!
Roy “Mad Dog” Earle é claramente inspirado em John Dillinger, mas o Código de Produção do período proibia exaltar uma figura criminosa real, como o famoso gangster. O roteiro, escrito por John Huston, foi, portanto, devolvido à Warner pelos censores com várias referências censuráveis. Jack Warner, que queria proteger o “espírito” da história, resolveu ignorar. No entanto, o Código foi firme pelo menos sobre o final. Bandidos, não importa o quão simpático que possam parecer, como é o caso de Earle, deveriam pagar por suas transgressões morais na tela. Melhor, pois obrigou a Walsh filmar o desfecho espetacular em que Bogart se encurrala numa montanha rochosa cheia de policiais lhe esperando, vira alvo do rifle de um atirador, enquanto Ida Lupino implora para que se entregue… Que final! Que belo filme esse do Walsh!
É conhecido no Brasil como SEU ÚLTIMO REFÚGIO.
Curti demais essa sinopse, vou conferir.