KERUAK – O EXTERMINADOR DE AÇO (Vendetta dal Futuro, aka Hands of Steel, 1986)

L4 HandsNão sei quantos de vocês tiveram esse privilégio, mas sou desses que pode se orgulhar de ter visto KERUAK – O EXTERMINADOR DE AÇO, de Sergio Martino, passando à tarde, no SBT, quando era moleque no início dos anos 90. Bons tempos. O filme é simplesmente um clássico da infância e quando os canais da televisão aberta ficaram caretas só me restou a lembrança, já que não consegui encontrar o filme em VHS na adolescência na região onde morava. Desde então não revi KERUAK, apesar da possibilidade que surgiu a partir da era dos torrents. Bem, resolvi matar a saudade agora e só posso dizer que valeu muito a pena. Foram 95 minutos com os olhos brilhando com o que há de mais divertido, bizarro e picareta no cinema B de ação italiano.

Uma das principais características desse cinema específico, especialmente nos anos 80, era a tentativa dos realizadores e roteiristas em tornar as produções rentáveis e populares atirando pra todo lado na quantidade de referências e gêneros possíveis acumuladas num mesmo filme, com a esperança de que algo funcionasse no meio da bagunça. Nesta onda surgiram verdadeiros clássicos do período, como I PREDATORI DI ATLANTIDE, de Ruggero Deodato, OS GUERREIROS DO BRONX, do Enzo G. Castellari, BLASTFIGHTER, do Lamberto Bava, e muitos outros.

oP8PXKERUAK, ainda que consiga ser um exemplar singular dentro do cinema italiano por diversos fatores, não é diferente nesse sentido. É uma mistura de vários subgêneros relacionados a ficção científica pós apocalíptica e, claro, ação. Além de fazer referência (leia-se copiar na cara dura) a alguns filmes mais abastados, de sucesso comercial, especialmente O EXTERMINADOR DO FUTURO, de James Cameron, e, em menor intensidade, MAD MAX, de George Miller, que acaba sempre tendo alguma influência. E a coisa funciona muito bem. Não chega a ser um exemplo a ser seguido de mise en scène ou coerência narrativa, nem tem a pretensão de ser, mas é o típico filme que não te deixa na mão na hora de entreter.

Num futuro sombrio em 1997, o mundo está à beira de um colapso por conta de fatores ambientais. Felizmente temos o reverendo Arthur Mosely, líder de uma seita ambientalista que guarda informações que podem contribuir para “consertar” o mundo. Por outro lado, Francis Turner (o grande John Saxon), chefe de uma corporação com más intenções, quer Mosely morto de qualquer jeito. Tanto que financia um projeto experimental que envolve a criação de cyborgs e envia uma dessas criações, Paco Queruak (e não “Keruak” como no título nacional), interpretado pelo fortão Daniel Green, realizar a missão de matar o reverendo.

66MFCO problema é que no ato, Paco sofre uma crise de consciência, fruto de seu lado humano remanescente, e acaba fazendo o serviço mal feito. O sujeito foge, então, para o Arizona e se esconde num motel no deserto onde ele dá uns pegas na dona do local (a belezinha Janet Agren), ocorrem torneios de queda de braço, que ele acaba vencendo facilmente porque… bem, ele é um cyborg, e não demora muito pra ter todo o tipo de mal encarado no seu encalço, como um assassino profissional contratado por Turner, outros cyborgs, caminhoneiros, a polícia local e até o FBI.

Um action movie pós-apocalíptico, que vira um filme de perseguição, seguido de um arco dramático com disputa de queda de braço, até desembocar numa meia hora final que é pura ação. Como podem notar, uma das coisas mais bizarras de KERUAK é justamente como o enredo passeia por diversos tons, cenários e gêneros que os roteiristas vão atirando à trama. Mas tudo ocorre de maneira orgânica, o espectador acaba nem percebendo. Só tem olhos para os detalhes que tornam esse tipo de filme em algo especial, um clássico: diálogos ridículos, especialmente os protagonizados pelos agentes do FBI; as cenas de pancadaria, com Paco demonstrando uns bizarros movimentos de karatê e tiroteios desenfreados; e nas péssimas atuações que dão um charme a mais no filme.

vlcsnap8470454Por falar em atuações, temos um elenco espetacular por aqui. Quem se destaca com bons desempenhos é John Saxon (a cena dele usando uma bazuca de raio lazer é um primor) e George Eastman, que vive o caminhoneiro Raul Morales, um dos personagens mais interessantes do filme e que pega no pé do herói após perder na queda de braço. Não dá pra exigir muito do restante dos atores, que tentam construir personagens, mas são constrangedores em termos de dramáticos, o que torna o filme ainda melhor. E é sempre bom ver um pessoal do calibre de Donald O’Brien, numa pequena participação.

Uma coisa que me chama a atenção em KERUAK é a maneira como Paco é retratado. Um cyborg que em algum momento era um ser humano comum e que teve a maior parte do corpo substituída, contra sua vontade, por metal e circuitos tecnológicos. E em determinado instante se vê dividido entre seu lado humano e sua persona robótica. O que me remete, claro, a ROBOCOP, de Paul Verhoeven, que não incluo como uma referência óbvia, porque só foi lançado um ano depois.

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Mas essas questões psicológicas de Paco são trabalhadas de forma superficial. E a performance de Greene também não ajuda muito. KERUAK, em sua essência, é um filme de ação, e é isso que importa na maior parte do tempo, principalmente na meia hora final. Algumas sequências são de encher os olhos, como o ataque ao Motel, que me lembrou Sam Peckinpah (e é curioso que um personagem é chamado de Dr. Peckinpah), com tiroteio bem elaborado e o confronto de Paco com um androide feminino. Logo a seguir começa uma perseguição envolvendo carro, caminhão, helicóptero, que é de tirar o fôlego. A ação não chega ao nível de um Enzo G. Castellari, mas ao menos me surpreendeu de forma positiva. Já as disputas de queda de braço até são interessantes, embora perca um pouco a graça porque já sabemos de antemão que é impossível Paco perder.

Mas quem sou pra reclamar? Na verdade, nesses anos todos que fiquei sem assistir KERUAK eram justamente as cenas de queda de braço que se mantinham vivas na minha memória. Também lembrava de outras ceninhas marcantes, como Paco mexendo nos circuitos de seu braço, uma cópia descarada de uma cena de O EXTERMINADOR DO FUTURO. E, obviamente, esse inesquecível cartaz abaixo que por si só já é uma
obra-prima.

Xv8po

21 pensamentos sobre “KERUAK – O EXTERMINADOR DE AÇO (Vendetta dal Futuro, aka Hands of Steel, 1986)

  1. Cara, assisti pela primeira vez agora em 2017. Gostou muito dessa tranqueira. Percebeu que eles usam trilha sonora de outros filmes? Entre elas, consegui identificar: Os Intocáveis (no começo do filme, quando ele vai matar o reverendo Arthur Mosely) e de Viver e Morrer em Los Angeles (essa é durante quase todo o filme). Valeu, Abs!

  2. Cara, assisti pela primeira vez agora em 2017. Gostou muito dessa tranqueira. Percebeu que eles usam trilha sonora de outros filmes? Entre elas, consegui identificar: Os Intocáveis (no começo do filme, quando ele vai matar o reverendo Arthur Mosely) e de Viver e Morrer em Los Angeles (essa é durante quase todo o filme). Valeu, Abs!

  3. Pingback: TODAS AS CORES DO MEDO (Tutti il colori del buio, 1972) | DEMENTIA¹³

  4. Cara, vi muito esse filme na Sessão das Dez no início dos anos 90! É nele que tem uma chuva ácida que castiga o corpo do Keruak?

  5. Filme carimbado exibido á exaustão na TVS-SBT nos anos 90 tanto nas noites de domingo na” Sessão das Dez ” como no começo das tardes no ” Cinema em Casa ” isso no tempo quando TV Brasileira não era cheio de frescura como é hoje ,ate hoje eu gosto do filme não só por ele ,mas como a sua trilha sonora que não sai da minha cabeça e John Saxon em um filme é sempre sensacional.Valeu por mais esta lembrança ,Ronald Perrone !

  6. Esse filme assistido com sua dublagem clássica é um primor!!! Boas lembranças me recordo de quando passava essa belezura na TV aberta!!! Ótima postagem Ronald!!!

  7. Clássico! Sobre a cena do protagonista mexendo nos circuitos, li em algum lugar que são restos de filmagem do próprio exterminador do futuro! As cenas não foram usadas, e os produtores compraram e enxertaram na podreira. Se é verdade…quem souber morre.

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